Em Marabá e Itupiranga, matadores de botos no Rio Tocantins arrancam olhos para vender como amuletos do amor

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Por Ulisses Pompeu – de Marabá

Boto morto no rio Tocantins (2)Nos últimos meses ambientalistas têm flagrado botos boiando no rio ou encalhados em alguma praia entre Marabá e Itupiranga, vítimas de uma matança desenfreada desses animais sem que haja uma ação enérgica por parte das autoridades. O assunto ganhou repercussão nacional e incomodou até mesmo a Procuradoria Geral da União, que designou o MPF (Ministério Público Federal) para investigar, assim como a Polícia Federal.

No último domingo, dia 2, na Praia do Meio, César Peres, da ONG Mepa (Movimento Educacional para Preservação da Amazônia) encontrou mais um boto assassinado e, estranhamente, com os olhos retirados. Segundo ele, este fato está ficando cada vez mais comum ao longo do rio, mas prefere não apontar culpados, uma vez que precisa manter uma relação de confiança com pescadores e ribeirinhos.

Segundo uma lenda amazônica, à noite o boto sai das águas e se transforma em um rapaz elegante e cordial, irresistível a qualquer senhorita. O mito é tão presente no imaginário popular que, há décadas, os predicados do boto viraram oportunidade de negócio.

Em alguns mercados da Região Norte, vendem-se pequenos vidros com pedaços dos órgãos sexuais do animal ou os olhos imersos no óleo ou no perfume, como amuletos do amor. São ampolas de vidro cujo rótulo anuncia o poder de sedução do boto. Prometem ajudar a amarrar para sempre o amado ou a amada. Mas são ilegais: vender pedaços de bichos da fauna brasileira é crime ambiental.

Eles são vendidos por um preço irrisório. É só um extra para os pescadores, que retiram os órgãos que interessam (olhos e genitálias) para a confecção dos amuletos. A carne dos animais não interessa e o corpo fica em praias ou a carcaça vai para a água. Sem as provas do crime, ninguém corre o risco de ser flagrado pela fiscalização em terra firme. A “sorte” para os amantes se transforma em puro azar para os botos, que acabam sendo vítimas de uma lenda que acaba nada ecológica. Outra versão para a morte dos botos na região de Marabá, levantada pela Reportagem do blog junto aos ribeirinhos, é que estes são concorrentes e inimigos dos pescadores, pois cortam redes, comem os peixes e irritam quem passa horas nos rios.

Pesquisa
Uma equipe de pesquisadores do Museu Emílio Goeldi, em Belém, esteve em Marabá recentemente para entender as razões da grande quantidade desses animais que têm aparecido mortos e com requintes de crueldade. E os estudiosos não precisaram de muito tempo para se depararem com o problema.

Bento Melo Mascarenhas, doutor do Goeldi, reconhece que os botos estão morrendo no Rio Tocantins e avalia que a situação é preocupante. “Encontramos uma fêmea jovem que foi morta, provavelmente por pescadores, tiraram alguns órgãos, como olhos, usados como amuletos do amor e em rituais de magia negra”, explica.

O pesquisador alerta que o boto é importante para o ecossistema, uma vez que ajuda a controlar a população de peixes que não são comestíveis para o homem. “Estudos mostram que na Amazônia não há competição entre os dois, mas percebemos que nesta região do Tocantins há casos de peixes que o homem come e que o boto também está comendo”, reconhece Bento Mascarenhas. Outro pesquisador do Goeldi, biólogo Jorge Soares, do projeto Bicho D’água, identificou que a espécie que aparece na foto desta reportagem é Iniageoffrensis, da família cetácea.

Xô barulho!
Há ainda o temor que a movimentação de balsas de grande porte afugente ou mate os botos que vivem nesta região. Esses animais têm audição muito sensível e podem estourar os tímpanos em caso de grande barulho. Ainda não há estudo que aponte os tipos de boto que há nesta área e nem o impacto que vêm sofrendo nos últimos anos. A Vale, que deverá desenvolver o projeto Alpa, já sinaliza para a necessidade de acompanhar a população local desses animais.

É uma boa notícia.

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