“A Amazônia está queimando porque o mundo consome muita carne.” Esta foi a manchete sensacionalista da CNN do dia 23 de agosto, que influenciou fortemente a opinião pública internacional. Os dados, no entanto, revelam outra realidade.
Veja-se a situação da produção de carne bovina no mundo. Três grandes centros respondem por 48% de tudo o que se produz no planeta. Estados Unidos lideram com 20%, seguidos do Brasil (16%) e da União Europeia (12%). Entre 2014 e 2018, a produção norte-americana subiu 11% (contra 2% do Brasil e 6% da União Europeia). A fonte é o Departamento de Agricultura dos EUA.
Segundo a mesma fonte, cinco países respondem por 71% das exportações mundiais, sendo que o Brasil ocupa o primeiro lugar do ranking, com uma participação de 19%. Isso incomoda os países produtores da União Europeia. Primeiro, porque os preços brasileiros são altamente competitivos; segundo, porque o nosso país é o único com potencial e capacidade para atender à expansão projetada da demanda para os próximos anos.
Em 2017, o rebanho bovino e bubalino brasileiro era de 219 milhões de cabeças. Desse total, apenas 19% estavam na região Norte, onde o Pará liderava, com 48% do total.
Ao contrário do que se pensa, o Brasil, além de ter solo e clima favoráveis, reúne todas as condições de elevar substancialmente a produção de carnes. O país utiliza novas e inovadoras tecnologias, ditadas por sistemas de produção sustentável, sem a necessidade de novas áreas de pastagens. É o caso da integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Esse processo recupera áreas degradadas e propicia melhoria acentuada dos índices de produtividade do rebanho.
O conceito de “Carne Carbono Neutro (CCN)”, desenvolvido pela Embrapa Gado de Corte, em Campo Grande (MS), é um exemplo notável, posto que com reflorestamento integrado às pastagens torna-se possível “armazenar” carbono e neutralizar o metano entérico exalado pelos animais. É a chamada pecuária sustentável e ecológica.
Mas não é só. A produtividade média do rebanho brasileiro, apesar dos avanços enormes nos últimos 30 anos, ainda é baixa se comparada com os principais concorrentes.
A taxa de natalidade do rebanho é de 60%, e a taxa de desfrute (quantidade de cabeças abatidas em relação ao rebanho total) é de apenas 19%. Na Austrália, gira em torno de 28%.
Para se ter uma ideia do avanço da produtividade da pecuária no Brasil, entre 1990 e 2018, enquanto a área de pastagens caiu 15% (para 162 milhões de hectares), a produção de carne bovina aumentou 139% —ou 9,8 milhões de toneladas.
O expressivo resultado foi obtido graças à melhoria genética do rebanho, à introdução de inovadoras técnicas de manejo de pastagens, à suplementação mineral, ao confinamento de bovinos e à bem-vinda integração agricultura e pecuária, com a preservação de florestas.
Esse conjunto de boas práticas, além de outras em andamento, vai propiciar novos e contínuos aumentos de produtividade, como a elevação de 1,5 para 4 cabeças por hectare por ano. Isso já se observa em várias regiões do país.
Com tais ajustes, isolando-se integralmente a região amazônica, teremos um aumento de quase 55% na produção de carnes nos próximos dez anos. Um feito notável, que produzirá considerável vantagem para o Brasil.
Ironias e ofensas a governos aliados criam apenas um desnecessário antagonismo político, que causa enormes perdas. Ao menos 18 marcas famosas, por exemplo, acabam de suspender a compra de couro brasileiro por questões ambientais. Precisamos focar na adoção de várias ações emergenciais e coibir com rigor as queimadas criminosas na região amazônica.
Temos de trabalhar intensamente para estimular a produção agropecuária em bases ecologicamente sustentáveis. Isso deveria ser parte do programa de um governo preocupado com a retomada do crescimento econômico e social. Por derradeiro, que se assuma um novo lema de preservação ambiental e que se deixe a Amazônia em paz.
Sylvio Lazzarini
Empresário do setor de serviços e ex-dirigente do CNPC (Conselho Nacional da Pecuária de Corte)