Um leitor pede algumas considerações e informações genéricas sobre o que realmente seja o novo Acordo Ortográfico. Sem pretender esgotar o assunto, é de se dizer, em termos históricos, que, de longa data, busca-se, nesse campo, algum tipo de unificação entre os países que falam o português:
I) em 1945, houve proposta, que acabou sendo inaceitável para os brasileiros, pois se conservavam consoantes mudas e não articuladas, já abolidas em nosso país, além de haver radicalismo na questão da acentuação de paroxítonas – como acadêmico, ânimo, cômodo, econômico, efêmero, fenômeno, gênero, pânico, tônico – sobre as quais os portugueses queriam pôr acento agudo, e não circunflexo;
II) em 1986, houve um encontro no Rio de Janeiro, em que se fizerem presentes seis dos oito países lusófonos (Guiné-Bissau não veio, e o Timor Leste ainda não era independente), mas a tentativa de acordo foi abandonada, porque as propostas foram tidas como drásticas (em um dos itens, pretendia-se suprimir o acento em todas as palavras paroxítonas e proparoxítonas);
III) em 1990, o encontro foi em Lisboa, e, por ser menos radical que o anterior, acabou sendo frutífero e, por ele:
a) os signatários deveriam torná-lo lei em seus respectivos países, e
b) a Academia de Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras seriam as responsáveis pela publicação de um vocabulário ortográfico comum;
IV) 1994 era a data prevista para se ultimarem as providências e entrarem em vigor as novas regras;
V) em 2004, o encontro se deu em São Tomé, e lá estavam representados os oito países lusófonos:
a) previa-se a entrada do acordo em vigor “com o terceiro depósito de instrumento de ratificação junto da República Portuguesa”;
b) abriu-se a possibilidade de adesão do Timor Leste;
c) pactuou-se data para entrar em vigor o acordo: “no primeiro dia do mês seguinte à data em que três Estados membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) tenham depositado, junto da República Portuguesa, os respectivos instrumentos de ratificação ou documentos equivalentes que os vinculem ao Protocolo)”.
Muito embora seu texto original e sua assinatura datem de 1990, optamos por chamá-lo de Acordo Ortográfico de 2008, porque:
I) foi nesse ano que se promulgou o acordo em nosso país, por via do Decreto 6.583, de 29/9/2008, para ser “executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém”;
II) também nesse ano se promulgou o Protocolo Modificativo do acordo, firmado em 1998, o que se deu por meio do Decreto 6.584, de 29/9/2008;
III) ainda em tal ano se editou o Decreto 6.585, de 29/9/2008, a dispor sobre a execução do Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico, assinado em 25/7/04.
Quanto ao início de sua vigência, a previsão legal era para o acordo produzir efeitos a partir de 1/1/2009 (cf. Decreto 6.583/08, art. 2º). Também se previa que a implementação do Acordo obedeceria ao período de transição de 1/1/2009 a 31/12/2012, durante o qual coexistiriam a norma ortográfica então em vigor e a nova norma estabelecida (cf. Decreto 6.583/2008, art. 2º, parágrafo único).
Desse modo, sem maiores dificuldades de exegese, vê-se que se faculta ao usuário do idioma, entre 1/1/2009 e 31/12/2012, seguir pelas normas antigas ou pelas novas, sem incorrer em erro algum, ainda cumpra parcialmente uma e outra. Ou seja, somente a contar de 1/1/2013, haverá obrigatoriedade de seguir com exclusividade pelas novas regras do Acordo Ortográfico. Até 31/12/2012, quem optar por seguir pelas regras antigas estará escrevendo corretamente, e quem, até lá, escrever pelas regras novas também não poderá ser condenado. E quem resolver seguir parcialmente ambas também estará acertando.
Algumas características e aspectos importantes:
I) tenta-se simplificação (basta ver a eliminação do hífen em “dia a dia” e “à toa”, expressões essas que em certos casos tinham hífen, e em outros, não);
II) busca-se uma compactação maior do idioma entre os usuários em todo o mundo, na tentativa de preservar-lhe a unidade e defendê-lo de processos de desagregação, o que é altamente louvável;
III) o Acordo fixa e restringe as diferenças de escrita entre os falantes;
IV) sedimenta, além disso, uma unidade de grupo linguístico significativo e possibilita seu prestígio junto a organismos internacionais;
V) por não impor soluções radicais e necessariamente únicas nas divergências entre os lusófonos, evita o malogro dos acordos anteriores, inclusive o de 1945, que procuravam impor uma unificação ortográfica absoluta.
De maneira mais prática, pelo Acordo Ortográfico de 2008:
a) foram introduzidos k, w e y em nosso alfabeto, que passou de 23 para 26 letras;
b) houve mudanças na acentuação;
c) aboliu-se, como regra, o emprego do trema;
d) buscou-se a simplificação no uso do hífen.
Por fim, aos que lançam a pecha de lei imperfeita às regras que norteiam o padrão culto, por não preverem sanção específica aos que as contrariam, importa realçar que aos seus transgressores, sobretudo numa esfera em que a comunicação se há de fazer sem barreiras e de maneira limpa e plena, como é o campo jurídico, aplica-se a pena prevista por Teotônio Negrão em momentosa palestra a acadêmicos de Direito: “o operador do direito que não consegue ter linguagem correta não consegue expressar adequadamente seu pensamento” E, a um operador do Direito, expressar o pensamento de modo equivocado ou inadequado é tão grave como tomar-lhe as armas de luta ou confiscar-lhe as ferramentas de trabalho.
1 comentário em “Acordo Ortográfico de 2008 ─ Informações importantes”
Zé, houve equívoco relativo ao item ” I “. Os vocábulos ACADÊMICO…, são Proparoxítonos, e não paroxítonos.