É mais grave do que parece a situação de cerca de 30 mil moradores dos bairros São Félix I e II, em Marabá. A área pertencia ao proprietário de terras Aurélio Anastácio de Oliveira, já falecido, e era objeto de litígio na Justiça desde 1986, uma vez que, segundo o processo, começou a ser invadida nessa época. Recentemente, após 33 anos, o Judiciário deu a causa como ganha aos herdeiros de Aurélio.
O juiz Aidison Campos Sousa, da 1ª Vara Cível e Empresarial de Marabá, determinou a reintegração de posse, a contar do prazo de 30 dias do momento em que os primeiros 179 ocupantes forem notificados. Os demais ocupantes dos 7.664 lotes devem, ainda segundo a determinação da Justiça, procurar os herdeiros para negociar o pagamento dos terrenos. Do contrário, também serão despejados.
O caso chegou à Secretaria Regional de Governo do Sul e Sudeste do Pará por meio da advogada Eternar Rodrigues da Silva, moradora do São Félix, e da deputada estadual Heloísa Guimarães (DEM), que abraçou imediatamente a causa, e provocou extrema preocupação ao secretário Regional João Chamon Neto.
Na última terça-feira (12), Chamon se reportou ao governador do Estado, Helder Barbalho, que também demonstrou preocupação e solicitou ao secretário que acompanhe a situação de perto, determinando à PGE (Procuradoria Geral do Estado) que também faça o acompanhamento, o que já está sendo feito pelo coordenador regional da PGE, Jobson Pereira.
A área reivindicada pelos herdeiros de Aurélio Anastácio de Oliveira tem 450,8641 hectares de extensão, o que equivale a 450 campos de futebol. Vai das imediações de um antigo viveiro de mudas, após a ponte rodoferroviária, do lado esquerdo de quem sai da Nova Marabá, segue em linha reta e abrange parte da Vila Espírito Santo.
De acordo com o que levantou a advogada Eternar Rodrigues da Silva, que está atuando voluntariamente na defesa dos interesses dos moradores dos dois bairros, durante esses 33 anos de tramitação da causa na Justiça, em determinado momento houve uma solicitação para que o município se tornasse litisconsorte, mas a Justiça descartou.
Por certo tempo a Defensoria Pública amparou alguns moradores, mas, depois eles ficaram privados de defesa. Tantos outros nem sequer sabiam da ação na Justiça. Logo, não houve recurso e o processo transitou em julgado, dando aos herdeiros o direito de ter as terras de volta.
João Chamon lembra que se trata de uma questão privada, mas afirma que a situação agora se transformou numa causa social, que já está causando grande comoção. Ele apela pela união de todos os poderes em favor dos cerca de 30 mil moradores: “Precisamos evitar que isso aconteça. É preciso a união da Prefeitura de Marabá, Câmara Municipal, Governo do Estado, Ministério Público e apoio dos órgãos de Defesa da Pessoa Humana estejam aliados nessa causa porque envolve pessoas”, conclama Chamon.
Eternar Rodrigues da Silva, a advogada, explica que imóvel originário reivindicado, em verdade, não mais existe. Destaca que o bairro hoje, no lugar do terreno antes objeto da causa, tem vida própria e é dotado de infraestrutura urbana, onde serviços são prestados.
“O cumprimento da ordem judicial de reintegração de posse, com satisfação do interesse dos autores, será à custa de graves danos à esfera privada de muitas famílias. Ou melhor, mais de 30 mil pessoas que há 33 anos construíram suas vidas nessa localidade, fazendo dela uma comunidade, irmanada por idêntica herança cultural e histórica, razão pela qual não é adequada a ordem de reintegração e fere o Princípio Constitucional da Dignidade da pessoa humana”, argumenta ela.
“Temos a convicção de que retirar os moradores é impossível”, afirma Chamon, cuja opinião é compartilhada pela deputada Heloísa Guimarães, que já se colocou à disposição a fim de ajudar no que for possível para reverter a grave situação e, quem sabe, chegar aos meios para declarara a área de interesse social.
A primeira preocupação do secretário Regional é com as 179 pessoas ameaçadas de despejo, as quais se supõe tenham sido as primeiras a ocupar lotes na área. Todas estão nominadas na ação e têm 30 dias, a partir da notificação, para desocuparem os lotes. Depois desse prazo serão alvo de força policial que deve garantir a demolição de suas casas. “Isso nos deixa extremamente preocupados. Não podemos deixar que chegue a esse momento”, lamenta ele.
Aurélio Anastácio era também proprietário de outras grandes áreas, estas no Núcleo Cidade Nova, como os terrenos em que hoje estão plantados os bairros Belo Horizonte, Novo Horizonte e São Miguel da Conquista.
Por Eleuterio Gomes – de Marabá