Audiência do STF marca “velório” de emendas do orçamento secreto

Executivo e Legislativo terão 30 dias de prazo para informar ao tribunal, todos os dados referentes às famigeradas emendas com rubrica RP-9
O ministro do STF Flávio Dino preside audiência com autoridades do Executivo e Legislativo nesta quinta-feira (1/8)

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Codificadas como RP-9, rubrica de um tipo de emendas parlamentares caracterizadas pela falta de transparência e, por isso, apelidadas de emendas do orçamento secreto, serão definitivamente “enterradas”. O “velório” foi nesta quinta-feira (1º ), em audiência presidida pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF).

O ministro determinou que congressista só pode destinar emenda a seu Estado, estabelecendo o prazo de 30 dias para que Executivo e Legislativo complementem informações sobre a transparência das RP-9.

Depois de audiência convocada para pôr fim ao “orçamento secreto”, Flávio Dino determinou que a indicação de qualquer tipo de emendas por congressistas deve ter “absoluta vinculação federativa”. Ou seja, só podem ser destinadas para os Estados (e municípios integrantes) que o elegeram. A única exceção aberta é para projetos de âmbito nacional cuja execução ultrapassem os limites do Estado.

Dino também estabeleceu que, a partir de agora, a execução das RP-8 e dos “restos a pagar” das emendas RP-9 (que ficaram conhecidas como “orçamento secreto”) sejam pagas somente pelo Executivo mediante “prévia e total transparência e rastreabilidade”.

O chamado “orçamento secreto” é como ficaram conhecidas as emendas de relator, ou RP-9, que permitiam a congressistas destinar recursos da União, mas que não eram detalhadas no sistema de controle de execução orçamentária – uma porta aberta para a corrupção.

Outro ponto estabelecido pelo ministro foi a fixação do prazo de 30 dias para que Executivo e Legislativo complementem informações sobre a transparência de verbas pagas de 2020 a 2022 – como a disponibilização dos nomes dos congressistas que indicaram as emendas RP-9 e daqueles que se beneficiaram delas, e se os “restos a pagar” das emendas de relator estão sendo pagos com transparência.

Dino também quer que seja esclarecido se houve crescimento das emendas de comissão (RP-8) de 2022 a 2024 e, caso afirmativo, sob quais critérios.

As determinações vêm depois de uma audiência convocada pelo magistrado para esclarecer alegações de entidades de transparência sobre a manutenção velada do “orçamento secreto” por meio da inclusão de novas despesas públicas ou programações no projeto de lei orçamentário anual da União, quase uma depois do Pleno do próprio STF ter sentenciado que as emendas de relator são inconstitucionais.

Dino é relator da ADPF 854, que trata sobre o tema. Em 2022, o colegiado da Corte julgou o dispositivo inconstitucional e fixou um prazo para que houvesse a plena publicidade dos recursos executados sob a classificação das emendas RP-9.

Segundo Dino, o encontro desta quinta-feira serviu para acabar “efetivamente” com o “orçamento secreto”, que permitiam a congressistas destinar recursos da União, mas que não eram detalhadas no sistema de controle de execução orçamentária.

Com relação a emendas parlamentares cujas executoras são ONGs e demais entidades do terceiro setor, há a necessidade de que sejam respeitados “procedimento objetivos de contratação” e seja observado os “deveres de transparência e rastreabilidade”.

Esclarecimentos

No início da audiência de conciliação, que foi aberta para acompanhamento da imprensa, o ministro Flávio Dino explicou a decisão tomada pelo STF no âmbito da ADPF 854, quando a relatora do caso ainda era a ministra Rosa Weber, antecessora de Dino.

O ministro informou ainda que, segundo a Transparência Brasil e a Transparência Internacional, o entendimento da Corte não estaria sendo cumprido em relação à transparência da execução das emendas e que teriam sido criadas novas modalidades de orçamento secreto.

O relator, então, enfatizou que três pontos seriam abordados na audiência: 1- se houve o cumprimento da decisão do Supremo a respeito da publicização e transparência das emendas executadas entre 2020 e 2022; 2- se os restos a pagar de 2023 e 2024 atendem o comando da decisão do STF; 3- se o formato inadequado das emendas do relator RP9 migraram para as emendas de comissão RP8. Conforme o ministro, a transparência deve existir em qualquer tipo de emenda, conforme a decisão colegiada da Suprema Corte.

“O Supremo não declarou inconstitucional a falta de transparência na RP9. O que o Supremo entendeu, a ratio decidendi, a razão de decidir do Supremo, é que qualquer modalidade de orçamento secreto fica banida. E é o fenômeno, assentado na jurisprudência do Supremo, da chamada continuidade normativa. Ou seja, dizendo de outro modo, não basta mudar o número para mudar a essência”, explicou o ministro.

O relator afirmou ainda que o objetivo da audiência é assegurar a transparência na execução do orçamento da União. “Pretendemos que haja deliberações concretas de procedimentos, prazos, medidas, para que essa questão, essa controvérsia, seja elucidada e nós tenhamos efetivamente o fim do orçamento secreto do Brasil. Esse é o objetivo dessa audiência”, declarou o ministro Flávio Dino.

Participação

Participaram da audiência o ministro Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU); o ministro Vínicius Marques de Carvalho, da CGU; Flavio José Roman, advogado-geral da União adjunto; Luiz Augusto Santos Lima, subprocurador-Geral da República; Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, advogado-geral da Câmara dos Deputados; e Gabrielle Tatith Pereira, advogada-geral do Senado Federal, além de representantes de entidades e órgãos envolvidos na temática.

Confira a íntegra da decisão tomada após a audiência.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.