Banco Central mantém taxa de juros em 10,50%

Comitê de Política Monetária interrompeu ciclo de cortes iniciado em agosto de 2023. Ata será publicada na próxima terça-feira (25)
Na foto, diretores do Banco Central, membros do Copom

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Reunidos desde terça-feira (18), os diretores do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) interromperam, na noite desta quarta-feira (19), em decisão unânime, o ciclo de cortes iniciado em agosto de 2023. No período, a taxa básica de juros passou de 13,75% para 10,50%. Fatores internos e externos pesaram na decisão.

Na terça-feira, enquanto os diretores iniciavam a apresentação e debatiam os relatórios técnicos, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), xingava, em entrevista ao vivo à Rádio CBN, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). A pressão não surtiu efeito, embora quatro dos diretores do colegiado tenham sido indicados pelo petista.

No comunicado sobre decisão, o Comitê informou que “optou por interromper o ciclo de queda de juros, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, demandam maior cautela”.

O colegiado sinalizou, ainda, que a política monetária deve se manter contracionista “por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”.

O Copom afirma, ainda, que se manterá “vigilante”. “Eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”, diz o documento.

O comunicado cita fatores que demandam “serenidade e moderação na condução da política monetária”: um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador.

O Comitê apontou ainda que o BC monitora “com atenção” a maneira que os “desenvolvimentos recentes” da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros.

O colegiado repetiu nesse comunicado a afirmação que fez no anterior, de maio, de que uma “política fiscal crível” e com comprometimento com a sustentabilidade da dívida ajuda na ancoragem das expectativas de inflação e redução de prêmios de risco dos ativos financeiros “consequentemente impactando a política monetária”.

Na avaliação sobre o cenário doméstico, o Copom fez poucas alterações no que comunicou no documento da reunião de maio. Dessa forma, o colegiado avalia que o conjunto de indicadores de atividade e mercado de trabalho “segue apresentando dinamismo maior do que o esperado”. No comunicado de maio, constava que a atividade e o mercado de trabalho “têm apresentado maior dinamismo do que o esperado”.

O colegiado avaliou que o cenário externo “mantém-se adverso” por conta da incerteza “elevada e persistente” sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e sobre velocidade da queda da inflação “de forma sustentada” em diversos países.

A avaliação é parecida com a exposta pelo comunicado de maio, quando o Copom reduziu a Selic para 10,50% ao ano. Assim como naquela oportunidade, o colegiado também ressaltou que os bancos centrais das principais economias “permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho”.

Nessa conjuntura, a avaliação do comitê é que “o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes”.

O Copom manteve praticamente intacto o seu balanço de riscos para a inflação, com equilíbrio entre fatores baixistas e altistas para as projeções para o índice de preços.

De um lado, nos riscos altistas, volta a mencionar uma maior persistência das pressões inflacionárias globais e uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado.

Já do lado dos riscos de baixa, cita uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada e os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.

Houve uma pequena alteração no seguinte trecho: “O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional seguem mais incertas, exigindo maior cautela na condução da política monetária”. No comunicado de maio, dizia “devem se manter mais incertas” em vez de “seguem mais incertas”.

A decisão desta quarta-feira veio em linha com o esperado pela maior parte das instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor. De 132, apenas nove casas viam espaço para um corte de 0,25 ponto percentual (p.p). O restante projetava a manutenção do patamar dos juros.

Na última reunião do Copom, a decisão de reduzir a Selic de 10,75% para 10,50% dividiu o comitê. O presidente do BC, Roberto Campos Neto e quatro diretores votaram pela redução de 0,25 p.p. enquanto outros quatro diretores defenderam a redução de 0,50 p.p.

No entanto, a ata da reunião mostrou que havia uma avaliação unânime dos membros do comitê sobre a conjuntura econômica. Segundo o documento, o cenário global incerto e o cenário doméstico com resiliência na atividade e expectativas de inflação desancoradas demandariam “maior cautela”.

Diferente de reuniões anteriores, em maio o Copom decidiu não sinalizar os próximos passos da política monetária. Na ocasião, o comitê reforçou “com especial ênfase, que a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”.

A ata do Copom será divulgada na próxima terça-feira às 8h. O Copom se reúne novamente em 30 e 31 de julho.

Confira a íntegra do comunicado do Copom

O ambiente externo mantém-se adverso, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo maior do que o esperado. A inflação cheia ao consumidor tem apresentado trajetória de desinflação, enquanto medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,0% e 3,8%, respectivamente.

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* situam-se em 4,0% em 2024 e 3,4% em 2025. As projeções para a inflação de preços administrados são de 4,4% em 2024 e 4,0% em 2025. Em cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante, as projeções de inflação situam-se em 4,0% para 2024 e 3,1% para 2025.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado. O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional seguem mais incertas, exigindo maior cautela na condução da política monetária.

O Comitê monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 10,50% a.a. e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.

O Comitê, unanimemente, optou por interromper o ciclo de queda de juros, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas demandam maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê se manterá vigilante e relembra, como usual, que eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Gabriel Muricca Galípolo, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.

* No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,30/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2024 e de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento, que passou a ser adotado na 258ª reunião, de arredondar a cotação média da taxa de câmbio observada nos dez dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.