A polêmica envolvendo o beijo homoafetivo na Feira Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, chegou à Assembleia Legislativa do Pará. Requerimento de repúdio começou a ser debatido hoje (18) pela Casa, sem que fosse votado devido ao esgotamento do tempo para a discussão da proposição.
De autoria do deputado Fábio Freitas (REP), que é pastor evangélico, o requerimento condena o “estímulo sexual precoce infantil” expresso na revista “Vingadores – a Cruzada das Crianças” que está sendo vendido na bienal. O gibi apresenta imagens de dois rapazes trocando carícias e se beijando na boca. Cenas que levaram o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB), a tentar recolher as revistas do evento.
O reboliço foi tão grande que chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao qual coube a decisão final: os gibis permaneceriam em exposição por não contrariar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), usado como um dos argumentos por Crivella para censurar as revistas.
E na Alepa são raras as vezes em que um requerimento provoca divergências porque há uma espécie de acordo entre os parlamentares de não se opor aos pedidos individuais dos colegas. Desta vez, não foi o caso. Durante a discussão sobre o requerimento de repúdio, Fábio Freitas não se encontrava em plenário, mas a proposta encontrou no deputado Martinho Carmona (MDB), que também é pastor evangélico, um dos seus maiores defensores.
Do outro lado, os deputados Carlos Bordalo (PT) e o também medebista Chicão, cujos pronunciamentos apresentaram um ponto em comum: tem crescido o discurso de ódio na sociedade. “Hoje, tudo que é produção científica, literária, está sofrendo um ataque obscurantista”, disse Bordalo. “Não é possível que se esteja a atentar, a proibir de forma truculenta a criatividade humana”, acrescentou ele. “Os representantes da nossa sociedade têm que ter na cabeça que, ao criarem dificuldades de relacionamento, criam dificuldades para uma paz mais sólida”, reforçou Chicão.
Para tentar resolver o impasse, Bordalo sugeriu que o requerimento somente fosse votado com a presença de Fábio Freitas ou votado de forma nominal, para que todos os deputados registrassem abertamente a sua opinião sobre um pedido de repúdio que, se aprovado, passará a ser oficialmente do Legislativo e não de um único parlamentar, conforme ressaltado pelo líder petista.
“Aprovando-se esse requerimento é dizer que (o Legislativo) concorda com a censura”, protestou Carlos Bordalo, ao defender a liberdade de expressão e literária. Para o deputado Chicão, voto de repúdio a autoridades e setores da sociedade “é muito perigoso” até por comprometer o papel do Legislativo.
O medebista contou que também é evangélico e frisou que não questionava o aspecto religioso do requerimento, mas a forma do texto pelo uso da palavra repúdio. “Eu não posso concordar que o Poder Legislativo carimbe atos de repúdio por coisas que estão acontecendo no Rio”, disse Chicão. “Este Poder tem que ter cuidado, clareza do papel que tem de desempenhar”.
Apologia
“Esta Casa é, sim, fórum para debater essas questões”, defendeu Martinho Carmona. “O parlamentar sempre vai expressar a opinião da maioria (da sociedade), mas não da unanimidade”. Contudo, o parlamentar ponderou que a palavra “repúdio” pode ser modificada. “Talvez o termo repúdio seja inaceitável, mas que haja do autor uma posição”, sugeriu ele.
Para Carmona, critérios para exposição na bienal foram descumpridos para fazer o que o medebista vê como apologia à homossexualidade, palavra, aliás, que nenhuma vez foi usada em qualquer um dos pronunciamentos. O deputado destacou os estudos de pesquisadores das universidades de Harvard e Massachusetts Institute of Technology (MIT), divulgados no final de agosto deste ano, que revelaram que não existe o “gene gay” específico para justificar a relação entre pessoas do mesmo sexo.
Ou seja, destacou Carmona, os estudos comprovaram “que liberdade (sexual) é opção pessoal, longe de um comportamento de genética”. Escolhas que o deputado afirmou respeitar. “Acontece que há sempre manipulação para se impor o que se optou. O próprio Deus nos dá liberdade de escolha, mas não dá direito de afrontar”, disse o medebista.
No caso da bienal, argumentou Carmona, a defesa feita foi em favor da família, especialmente das crianças e dos adolescentes que, por estarem em fase de formação, precisam da proteção do Estado. “Deixa a criança chegar na fase adulta e tomar a decisão dela”, assinalou ele. “Temos que debater o assunto com maturidade, sem paixão. O que não é certo é afrontar a família. De forma grotesca, inclusive”, considerou o parlamentar.
Por Hanny Amoras – De Belém