Em março, pela primeira vez, a Usina de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, deverá ligar simultaneamente suas 18 turbinas, despachando energia para o centro-sul brasileiro. Dez anos depois de ser licitada, será encerrado mais um capítulo da história da maior e mais polêmica hidrelétrica do país.
Inaugurada oficialmente em novembro passado, desde janeiro 11 máquinas já estão rodando, gerando 6.500 megawatts de energia, metade de sua capacidade instalada. Nas próximas semanas, com toda a sua capacidade, estima-se que poderá atender a cerca de 60 milhões de pessoas ou cerca de 10% da demanda nacional.
Não é pouca coisa. A potência instalada da usina corresponde a 7% de toda a capacidade de geração brasileira, tornando-a um dos pilares do sistema elétrico brasileiro. Será a quarta maior hidrelétrica do mundo.
Para chegar a esse ponto, o empreendimento pagou um preço alto, tanto para os cofres públicos quanto para a própria imagem.
O valor final ficou em R$ 42 bilhões, o dobro do que se previa antes de ela se iniciar. Como toda obra, no Brasil e no exterior, ao longo de dez anos esse valor foi subindo ao sabor da variação do câmbio, da inflação e de aditivos no contrato.
O mais elevado, porém, foi o dano a sua imagem e reputação, que associa o nome da usina a problemas ambientais e corrupção. Essa história começou 45 anos atrás, quando, em 1975, se iniciaram os estudos sobre o potencial hidrológico do Rio Xingu. Ali, ela começou a ser contestada.
Apesar de pareceres técnicos e muita argumentação, os responsáveis pela obra nunca conseguiram vencer essa batalha de comunicação, convencendo que a obra não seria prejudicial ao rio, à fauna e aos indígenas da região.
Da mesma forma, a partir de sua licitação em 2010, a usina agregou acusações de corrupção, tráfico de influência, pagamentos de propina e desvios de verbas.
A partir de agora, finalmente concluída, sob vigilância e desconfiança de ambientalistas nacionais e internacionais e do ministério público, Belo Monte procura virar a página desse capítulo para justificar a que veio.
Com as turbinas rodando, a usina já integra o equilíbrio do fornecimento de energia no país.
Como os reservatórios de hidrelétricas do Sudeste iniciaram janeiro com níveis de armazenamento mais baixos que em 2019, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) conta com a geração das usinas da Região Norte para abastecer boa parte do país.
Belo Monte está gerando energia, por exemplo, enquanto o Lago de Tucuruí, no Pará, se enche de água. Com redes de transmissão mais robustas, ela será um dos garantidores do abastecimento de eletricidade no Brasil, seguindo o plano de expansão do setor elétrico brasileiro.
A megaobra do Pará é uma realidade inescapável para um país continental que precisa de energia e um emblema do dilema energético brasileiro. A última fronteira das hidrelétricas é a Região Amazônica, e as questões ambientais tornam os empreendimentos mais caros, polêmicos e proibitivos. Belo Monte deve ser a última de seu tipo, portanto.
É o que se conclui com o Plano Decenal de Energia 2019-2029, divulgado em fevereiro, que prevê a construção de dez hidrelétricas nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sul do Brasil. A maior delas é a Usina de Tabajara, na Bacia do Rio Ji-Paraná, em Rondônia, cuja potência prevista é de 400 megawatts — 27 vezes menor que Belo Monte.
Para evitar recorrer às usinas nucleares, o plano aposta no crescimento da energia solar, eólica e das térmicas a gás. Nenhum desses novos empreendimentos terá tamanho e história comparáveis a Belo Monte.
Fonte: Época