Brasília – O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou na noite de segunda-feira (13), por 431 votos a 70, o Projeto de Lei Complementar (PLC 149/19), que prevê ajuda financeira da União a estados, Distrito Federal e municípios para compensar a queda de arrecadação do ICMS e do ISS deste ano em relação ao ano passado.
A matéria foi aprovada na forma do substitutivo do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), representando um impacto financeiro de R$ 80 bilhões aos cofres da União e foi considerada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, uma “irresponsabilidade fiscal”.
Essa diferença de dinheiro deverá ser usada em ações de enfrentamento ao coronavírus e será entregue de maio a outubro.
A sessão começou com os líderes partidários orientando os partidos como deveriam. O deputado federal Eduardo Costa (PTB-PA) encaminhou o voto sim, pela aprovação global dos destaques apresentados. Encaminhamento idêntico da maioria dos partidos.
No substitutivo do relator, o texto foi alterado e criado uma espécie de seguro da receita nominal para estados e municípios. Segundo o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o impacto do projeto pode chegar a R$ 80 bilhões.
Os deputados rejeitaram na sequência todos os destaques, que são propostas de alteração do texto-base. Concluída esta fase, o projeto seguirá para análise pelo Senado Federal.
Guedes reage
A reação do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi imediata, classificando a aprovação do substitutivo como uma “irresponsabilidade fiscal”, assim como o formato de socorro aos estados e municípios que foi votado na Câmara dos Deputados. A discórdia está na maneira como foi estabelecida a transferência de recursos aos estados e municípios durante a crise do novo coronavírus.
“Seria uma irresponsabilidade fiscal e um incentivo perverso dar um cheque em branco para governadores de estados mais ricos, pois não sabemos quanto tempo vai durar essa crise de saúde,” afirmou Guedes.
O texto, apresentado na segunda-feira (13) aos líderes partidários pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), responsável por redigir a proposta, prevê que o governo federal cubra durante seis meses a queda da arrecadação de ICMS e de ISS, principal imposto estadual e municipal, respectivamente, frente ao ano passado.
Os recursos serão entregues de maio a outubro e se referem à diferença de arrecadação, quando houver, entre os meses de abril a setembro dos dois anos. Assim, por exemplo, se em setembro não for verificada queda de arrecadação, não haverá repasse.
A Constituição determina que 25% do ICMS, tributo estadual, sejam entregues aos municípios de seu território, segundo a proporção da arrecadação do tributo na localidade. Por esse motivo, o projeto exige que a União repasse diretamente essa parcela aos municípios, segundo sua participação no rateio do imposto usada em 2019.
Para receberem os recursos, os estados e municípios devem encaminhar ao governo federal o demonstrativo da receita corrente líquida (RCL) apurada no mês anterior, até o dia 15 de cada mês. Se houver atraso, apenas 10% da arrecadação dos tributos em 2019 será repassada até o envio dos dados.
Caso o montante antecipado seja maior que a compensação devida, a diferença será deduzida do repasse do mês seguinte ou, se ocorrer no último mês, descontada dos primeiros repasses dos fundos de participação dos estados (FPE) ou dos municípios (FPM).
A expectativa de queda de arrecadação é da ordem de 30% em relação ao ano passado, algo em torno de R$ 80 bilhões se forem contados os seis meses (maio a outubro).
Segundo o relator, o projeto contém a exata dimensão das necessidades de combate à pandemia. “Quanto mais demoramos em tomar as decisões, mais a população está em risco,” disse Pedro Paulo, cumprimentando os deputados que ajudaram no alcance de um acordo.
Trata-se de um modelo de “seguro imposto”: se cair a receita de governadores e prefeitos, a União fará a recomposição do valor. O Ministério da Economia se opõe a este formato. No entendimento de Guedes e de seus principais auxiliares, o mais adequado é estabelecer um valor fixo.
Para Guedes, da maneira como o texto foi formulado, governadores e prefeitos tenderão a dar descontos de impostos ou descuidarão da arrecadação, já que a conta será totalmente repassada ao governo federal.
Além disso, ainda não é possível calcular a duração exata da crise de saúde e por quanto tempo as medidas de restrição terão de ser mantidas. Por isso, o ministro afirma que o texto dá “incentivo perverso” aos estados mais ricos.
No radar, estão especialmente os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, mais afetados pelo novo coronavírus e que têm participação expressiva na economia do país.
Acordo
Para que o acordo entre a maioria dos parlamentares fosse fechado e o texto aprovado, um dos pontos mais polêmicos foi retirado do relatório do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ). Trata-se do artigo que permitia empréstimos aos estados desde que o endividamento fosse de até 8% da receita corrente líquida.
Este trecho foi muito contestado pela equipe econômica do governo federal. Mesmo após as alterações e as negociações entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, o líder do governo na Câmara, deputado Vítor Hugo (PSL-GO), orientou os deputados governistas a votarem contra o projeto.
“Não há intenção do governo de não ajudar os estados e municípios, pelo contrário. Mas, infelizmente, a forma que foi colocada no substitutivo vai nos impedir de votar junto no mérito,” afirmou o deputado.
Já a oposição reclamou que foi retirado a possibilidade de endividamento dos estados do texto final, mas votou a favor da matéria. “Poderia ser mais, mas é o relatório possível, pactuado; um texto que agrega, pacifica e atende ao país no socorro aos estados”, disse o líder da Minoria na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE).
Descarecterizado
O projeto aprovado pelos deputados foi totalmente descaracterizado. A proposta era batizada de Plano Mansueto, em referência ao secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, e foi totalmente alterado pelo substitutivo apresentado.
O texto original previa, inicialmente, que o auxílio financeiro a estados em crise obrigaria, em contrapartida, que os governadores fizessem ajustes fiscais e limitassem seus gastos permanentes. No entanto, com a pandemia do novo coronavírus, o plano foi totalmente alterado.
Com isso, o texto passou a prever o repasse de verba aos entes federativos sem a necessidade de nenhuma contrapartida. A matéria também autoriza que Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) negociem com estados e municípios a suspensão dos pagamentos devidos por eles. A expectativa é com isso a União deixe de arrecadar cerca de R$ 9,6 bilhões.
Por Val-André Mutran