Brasília – Com alguns meses de atraso, a Câmara dos Deputados começa a discutir a decisão do início de maio, do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central (Bacen), que aprovaram as regras de funcionamento do Open Banking (Banco Aberto) no país, instituindo a implementação gradual do sistema, que será dividido em quatro fases, com início no dia 30 de novembro de 2020 e término previsto em outubro de 2021.
Em termos gerais, a ideia das autoridades monetárias do país é que o cliente é dono de seus dados bancários e poderá autorizar o seu compartilhamento entre as instituições para que, por meio de aplicativos, possa fazer o gerenciamento desses dados e receber melhores ofertas de crédito, por exemplo. Na Câmara dos Deputados, tramitam alguns projetos que pretendem ampliar essa experiência para outros setores públicos e privados.
Alguns deputados já apresentaram projetos sobre o tema, um deles, do deputado André Figueiredo (PDT-CE), autor do projeto de lei (PL 4960/2019) estabelece aplicações práticas nessa linha. Ele cita o exemplo das operadoras de telefonia: “Os dados de consumo de serviços de telecomunicações, hoje disponibilizados pelas operadoras nas contas telefônicas ou em seu aplicativo, estariam acessíveis para que o usuário pudesse manipulá-los da forma mais adequada e não somente da forma que a operadora quis que ele visualizasse. No caso concreto do open banking, as informações das operações de crédito e de débito de uma conta bancária, por exemplo, precisam necessariamente estar acessíveis para que o usuário as controle por meio de qualquer outra ferramenta e não só as ferramentas de internet e celular que o banco disponibiliza”, disse o parlamentar.
Compartilhamento
No setor bancário, um cliente que tem várias contas poderia fazer suas operações em uma plataforma que congregasse todas elas e não apenas no aplicativo de cada instituição. Outro exemplo é o cliente que apresenta problemas de crédito. Ele poderia ter acesso a ofertas melhores de taxas de juros para um mesmo montante de débito.
No caso do banco aberto, os clientes de bancos deverão sentir as mudanças apenas em meados do ano que vem.
A consultora legislativa da Câmara dos Deputados, Liana Lima, lembra que tanto o projeto de banco aberto quanto a regulamentação mais ampla que vem sendo discutida na Câmara deixam a cargo do dono dos dados a decisão sobre compartilhá-los ou não: “Duas das principais discussões que precisamos acompanhar de perto dizem respeito aos custos de acesso, uma discussão que é bastante cara às fintechs (startups ou empresas que desenvolvem produtos financeiros totalmente digitais); e também à fiscalização a respeito de decisões tomadas no âmbito da autorregulação. Sem dúvida, essa iniciativa do Banco Central revolucionará o sistema financeiro. Cabe à Câmara acompanhar muito de perto essa iniciativa.”
Está prevista para que agora, em novembro, as instituições financeiras devem iniciar apenas o processo de padronização dos dados que serão compartilhados.
Mas o que vai ser o Open Banking?
Este sistema permitirá o compartilhamento de dados dos clientes, desde que haja autorização, e serviços entre instituições financeiras regulamentadas, que estejam participando da iniciativa. O compartilhamento ocorrerá por meio de APIs (forma de integrar sistemas, definindo como vários componentes e o software devem interagir), que permitem a integração dos sistemas com segurança, facilitando o intercâmbio de informações. A principal premissa do Open Banking é que o cliente é o titular dos seus dados pessoais, não os bancos, dando mais poder de decisão aos usuários. Caberá ao consumidor a decisão de autorizar ou não compartilhar seus dados, além de ter mais liberdade para buscar serviços mais adequados ao seu perfil e com custo menor.
O objetivo do Banco Central é aumentar a competitividade no sistema financeiro, estimulando a entrada de mais fintechs que possam oferecer produtos que, hoje, são majoritariamente fornecidos por bancos tradicionais, além de outros novos, incentivando a inovação no setor financeiro.
Participantes e regulação
A participação de grandes e médios bancos será obrigatória, enquanto demais agentes do mercado autorizados a funcionar pelo Bacen, como fintechs, terão entrada optativa. Mas, uma vez no sistema, todos precisarão compartilhar dados e ter registro no repositório de participantes.
O Open Banking terá uma parte regulada, determinada pelo Bacen, com disposições sobre requisitos e responsabilidades para compartilhamento, contratação de terceiros, escopo mínimo de dados e serviços, entre outros. Já a outra parte será autorregulada, na qual os próprios participantes definirão as regras, a maioria relacionada a padrões tecnológicos, procedimentos operacionais, estrutura de governança, ressarcimento entre membros etc.
Open Banking e LGPD
O Banco Central já definiu a escolha da base legal para o compartilhamento de dados: o consentimento – adotando definições da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) – bem como as práticas vedadas, como contrato de adesão e formulário de aceite. O consentimento deve ser livre e limitado a 12 meses, mas poderá ser revogado pelo cliente (titular dos dados) a qualquer momento. Ainda assim, é importante ressaltar que, mesmo encerrando o compartilhamento de informações, as instituições participantes ainda estarão autorizadas a conservá-las para o cumprimento de obrigações legais ou regulatórias.
Proteção dos dados dos clientes
Para garantir a segurança dos dados, cada instituição participante precisará implementar mecanismos de acompanhamento e controle para assegurar o cumprimento de regras específicas de responsabilização, em casos de quebra de confiabilidade, e terá suas políticas de segurança cibernética vigentes analisadas, para conferir se estão adequadas.
O Banco Central também estipulou etapas antes de autorizar o compartilhamento de informações, que seriam: consentimento, autenticação e confirmação pelos clientes. Desta forma, fica mais fácil fazer a identificação do usuário e assegurar se as informações são confiáveis.
As 4 fases de implementação do Open Banking
O CMN e o Bacen estipularam na primeira fase, que as instituições participantes devem disponibilizar informações sobre canais de atendimento e produtos e serviços que oferecem, relacionados com contas de depósito à vista ou poupança, contas de pagamento e operações de crédito. Terceiros poderão consultar as informações e comparar.
A segunda fase consiste no compartilhamento de dados de cadastro e de transações relativas a produtos e serviços divulgados na 1ª fase, que foram feitas por clientes e representantes. Só serão compartilhadas as informações que tiverem a autorização de cada usuário para tal. A princípio, esta fase deve ser finalizada até maio de 2021.
Na terceira fase, será compartilhado o serviço de iniciação de transação de pagamentos entre instituições participantes, com encaminhamento de propostas de operações de crédito. Prevista para acontecer até agosto de 2021.
Já a quarta e última fase, será a expansão dos serviços para incluir dados de transações de operações de câmbio, investimentos, seguros e previdência complementar aberta, que passarão a ser acessados pelos usuários e pelas instituições participantes. A previsão para o fim deste processo é outubro de 2021.
Competitividade
De acordo com o Banco Central, este projeto será muito importante para a competitividade do setor e terá uma abrangência ambiciosa, bem grande, se comparado a outras iniciativas de Open Banking no exterior. Uma das suas principais consequências será o aumento da liberdade e autonomia do consumidor de serviços financeiros, que terá mais poder sobre seus dados, usufruindo de diversos benefícios, como realizar movimentações sem estar preso ao próprio banco.
Segundo o Diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, João Manoel Pinho de Mello, apesar da pandemia do coronavírus, o projeto é prioritário para o Bacen e os trabalhos para sua implementação já estão em curso há algum tempo, o que justificaria os prazos.
Val-André Mutran – É correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.