Brasília – Duas frentes foram abertas na quarta-feira (29) para mitigar a escalada de altos preços do gás de cozinha (GLP) em todo o país. Nenhuma, no entanto, atacar o problema de frente, e oferece apenas o mais do mesmo: assistencialismo por prazo determinado.
Enquanto a Câmara dos Deputados aprovou na quarta, o Projeto de Lei nº 1.374/2021, que cria o auxílio Gás Social a fim de subsidiar o preço do gás de cozinha para famílias de baixa renda, dependendo ainda de aprovação dos senadores e sanção presidencial para entrar em vigor. A Petrobras anunciou na noite do mesmo dia, que irá destinar R$ 300 milhões para a criação de um programa social de apoio a famílias em situação de vulnerabilidade social, para garantir que tenham acesso a insumos essenciais, com foco no gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha.
Auxílio Gás Social
De autoria do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) e outros deputados do PT, o texto prevê que o valor fixado semestralmente deverá ser, no mínimo, igual à metade da média do preço nacional de referência do botijão de 13 Kg nos últimos seis meses, conforme estabelecido pelo Sistema de Levantamento de Preços (SLP) da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Fontes ouvidas pela reportagem do blog foram unânimes em criticar as duas propostas: “É o mais do mesmo”, disseram.
O substitutivo aprovado, do deputado Christino Aureo (PP-RJ), dá prazo de 60 dias para o Poder Executivo regulamentar os critérios para definir as famílias a serem contempladas, a periodicidade, a operacionalização do benefício e a forma de pagamento, cujas parcelas não podem passar de 60 dias de intervalo. O Executivo deverá ainda adequar a quantidade de beneficiários com o orçamento disponível para o auxílio.
Pelo texto, o Poder Executivo será autorizado a pagar o auxílio diretamente às famílias beneficiadas na modalidade de transferência de renda. Algo como o Bolso Família do Gás.
Zarattini ressalta que o gás de cozinha é o derivado de petróleo mais utilizado diretamente pela população pobre. Ele citou dados da ANP que mostram um aumento de 61% do preço em um período de pouco menos de um ano.
Já o relator da matéria, Christino Aureo, destacou que o aumento da cotação internacional do barril de petróleo e a desvalorização cambial têm levado os preços dos combustíveis fósseis a sucessivas altas desde meados de 2020. “Isso pressiona a renda das famílias mais pobres, tornando praticamente impossível o acesso ao gás de cozinha no valor atual”, disse.
Beneficiários
O auxílio será concedido preferencialmente às mulheres vítimas de violência doméstica beneficiadas por medidas protetivas de urgência. Entre os beneficiários serão incluídos ainda, segundo o regulamento, as famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) ou que tenham entre seus membros quem receba o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Fontes de recursos
O substitutivo define três fontes de recursos para custear o auxílio, com definição na lei orçamentária.
– alíquota específica da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide-combustíveis) a ser aplicada ao gás de cozinha;
– parte da receita com a venda de petróleo devido à União como excedente da produção por meio dos contratos de partilha; e
– parte do valor dos royalties da União devidos nos contratos de exploração do petróleo pelo regime de partilha.
Em 60 dias, o Poder Executivo deverá fixar essa alíquota da Cide para o custeio do auxílio Gás Social. As famílias beneficiárias do programa permanente de transferência de renda do governo federal (Bolsa Família e futuro Auxílio Brasil) que não receberem o Gás Social deverão ser compensadas nessa transferência de renda com o valor da Cide incidente sobre o gás de cozinha.
Quanto aos recursos vindos do petróleo da União e de seus royalties, o texto determina que será usado o aumento de arrecadação verificado no exercício.
Assim, se o auxílio vier a ser pago ainda em 2021, serão usados os recursos arrecadados a mais em relação ao estimado na lei orçamentária deste ano.
Petrobras
A Petrobras anunciou que irá destinar R$ 300 milhões para a criação de um programa social de apoio a famílias em situação de vulnerabilidade social.
A decisão foi anunciada dias depois de o presidente da estatal, Joaquim Silva e Luna, ter afirmado que não haveria qualquer mudança na política de preços da estatal e que não caberia à empresa ações para subsidiar o preço do botijão de gás, um dos itens que mais pressionam os gastos das famílias de baixa renda.
Ele reagiu na segunda-feira (27) a um discurso do presidente Jair Bolsonaro, que atribuiu a alta do preço dos combustíveis e seu impacto na inflação à política de preços praticada pela Petrobras, atrelada ao câmbio e ao preço internacional do petróleo.
Nos últimos dias, essa política foi criticada pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Programa vai até o fim do ano eleitoral
O programa terá duração de 15 meses, informou a Petrobras, o que incluirá o período da campanha para as eleições de outubro de 2022, quando Bolsonaro pretende concorrer à reeleição. Foi apresentado como uma ação de responsabilidade social.
De acordo com a companhia, o programa, que foi aprovado pelo Conselho de Administração, é similar a ações sociais de praticadas por outros agentes de mercado e se justifica pelos efeitos da pandemia de Covid-19.
“Somos uma empresa socialmente responsável e comprometida com a melhoria das condições de vida das famílias, particularmente das mais vulneráveis. A pandemia e todas as suas consequências trouxeram mais dificuldades para as pessoas em situação de pobreza. Tal fato alerta a Petrobras para que reforce seu papel social, contribuindo ainda mais com a sociedade”, destacou o presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, em comunicado.
O modelo do programa está em fase final de estudos, segundo a Petrobras, incluindo a definição do critério de escolha das famílias em situação de vulnerabilidade e da busca de parceiros que possam somar esforços e ampliar o valor a ser investido, com a possibilidade da criação de um fundo que permita que outras empresas venham a aderir ao projeto.
Com duração de 15 meses, o programa ainda estaria vigente na data das eleições presidenciais de 2022. Por isso, o receio é que a medida tenha um viés político que acabe prejudicando a estatal e a economia.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.