Brasília – Em meio a crise com o Senado sobre qual rito será adotado para a tramitação e votação e Medidas Provisórias (MPs), a Câmara dos Deputados começa a discutir nesta segunda (27) um conjunto de 13 medidas provisórias editadas ainda durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). De acordo com o anúncio feito por Lira na última semana, as discussões e votações destas propostas serão realizadas até quinta-feira (30).
Já as MPs enviadas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda são alvo de disputa entre as duas casas, por conta da discussão sobre o rito das discussões. Enquanto que deputados defendem a manutenção do atual modelo de tramitação, com a análise das medidas começando e sendo relatado pela Câmara, o Senado pretende retomar o formato de comissões mistas, suspenso durante a pandemia da Covid-19, mas que é o procedimento previsto na Constituição Federal e no Regimento Interno do Congresso Nacional.
A crise entre Lira e Pacheco ganhou um novo tom na última sexta (24), quando o presidente da Câmara pediu uma sessão plenária do Congresso para discutir o modelo de tramitação, um dia após o Senado decretar a volta do rito previsto na Constituição, conforme publicado na última edição da Coluna Direto de Brasília (Edição 248).
A discussão entre os dois presidentes respinga diretamente no governo Lula, que depende da relação no Congresso para aprovar projetos de interesse e garantir a governabilidade. Para o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), da base governista, o governo vai entrar em campo para resolver a crise envolvendo Lira e Pacheco.
“Temos conversado com o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), com o líder do governo José Guimarães (PT-CE), para que se construa uma solução de acordo. Espero que a gente avance neste diálogo nesta semana. Mesmo que se tenha que retornar [o rito das] comissões mistas, que seja algo dialogado e que se tenha uma solução de transição para aquelas MPs que já foram editadas”, disse o socialista em entrevista a um canal de TV a Cabo na manhã desta segunda (27).
Entre as medidas provisórias que podem ter a tramitação afetada estão algumas consideradas importantes pelo governo, como as que implantaram programas sociais que podem acabar perdendo efeito. Na última semana, Lira disse, em um pronunciamento, que o governo pode perder votações se não apoia-lo na manutenção do atual rito de tramitação.
Confira a relação de todas as Medidas Provisórias pendentes de votação há pelo menos dois meses.
O que diz Arthur Lira
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse que o impasse sobre o rito para a análise das MPs permanece. Segundo Lira, os líderes partidários da Câmara não concordam com a proposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, de voltar a criar comissões mistas (de deputados e senadores) para analisar as MPs antes que elas sejam enviadas para o Plenário da Câmara e depois para o Plenário do Senado.
Lira destacou que não se trata de uma decisão unilateral e ele nega querer gerar crise institucional. Conforme o presidente, a posição é quase unânime entre os líderes partidários na Câmara – os líderes do Psol e do PL discordariam apenas de parte do encaminhamento –, e inclusive os líderes do governo e do PT defendem o rito atual.
Desde 2020, a partir do Ato Conjunto 1/2020, as MPs são analisadas diretamente no Plenário – primeiro na Câmara (90 dias), depois no Senado (30) –, permitidas as emendas. Esse ato, adotado em razão das medidas emergenciais na pandemia de Covid-19 e ainda em vigor, eliminou a fase de comissões mistas.
“Não tem como nós retroagirmos [em relação a mudanças trazidas pela pandemia], como no caso da votação pelo sistema Infoleg. Hoje, os deputados dão presença no Plenário fisicamente e votam pelo celular. Uma votação que demorava uma hora e meia hoje demora 15 minutos, não tem como retroagir”, afirmou.
Em nota à imprensa, o presidente da Câmara defendeu o modelo atual de análise das MPs por ser mais “célere, dinâmico e eficiente”. Confira a íntegra da nota.
O que diz Rodrigo Pacheco
O presidente do Senado e também do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, anunciou em Plenário, na última quinta-feira (23), que decidiu acatar a questão de ordem apresentada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), líder do bloco da Maioria, e oficializou o retorno do funcionamento das comissões mistas para análise prévia das medidas provisórias (MPs). Pacheco disse que sua decisão, como presidente do Congresso, será proferida por escrito e encaminhada aos senadores e deputados, declarando assim a prejudicialidade do ato conjunto, da Câmara e do Senado, que suspendeu a partir de março de 2020 o funcionamento das comissões mistas em razão da pandemia de covid-19.
Pacheco esclareceu que a decisão veio após a unanimidade dos líderes partidários manifestarem, em reunião ocorrida antes da sessão plenária, apoio ao retorno das comissões mistas, reforçando o pedido para que o rito de tramitação das matérias atenda ao que é determinado pela Constituição. O presidente do Congresso ressaltou que permitir a apreciação constitucional das MPs, seja rejeitando ou aprovando, é uma obrigação de todos os parlamentares. A decisão, observa, diminui o poder hoje concentrado nas Mesas das duas casas legislativas.
“Temos um compromisso com o Brasil; não é um compromisso com o governo necessariamente, é um compromisso com o Brasil de que medidas provisórias sejam apreciadas sob o rito previsto na Constituição Federal, com a instituição e a instalação imediata das comissões mistas, que serão compostas por deputados federais e senadores, naturalmente permitindo um debate concentrado num colegiado de menor número para cada medida provisória, que é a razão de ser das comissões mistas, e de uma forma muito democrática, respeitando-se, inclusive, a proporcionalidade na indicação desses membros das comissões mistas, e, com isso, retirando o poder concentrado da presidência do Senado e da presidência da Câmara dos Deputados na condução de medidas provisórias”, declarou Pacheco.
Ele lembrou que, desde o início de fevereiro, a Mesa do Senado decidiu pelo retorno do rito normal das MPs, com o funcionamento das comissões mistas, revogando o ato das duas Casas (Ato nº 1, de 2020) que permitia a exceção, em razão da pandemia de covid-19. Pacheco disse que, em deferência à Câmara dos Deputados, preferiu aguardar que a Comissão Diretora da Câmara tomasse a mesma decisão, já que era um ato conjunto. Pacheco asseverou que “os fundamentos fáticos que o sustentam [o Ato nº 1] não mais existem na realidade”. Isso porque o estado de calamidade pública decorrente da pandemia foi encerrado no final de 2022 e que o modelo tradicional de apreciação de MPs deveria ser retomado nos mesmos moldes de antes da crise sanitária.
“Encerrada a pandemia, felizmente, não havendo mais o estado de emergência, revogado inclusive pelo Poder Executivo, havia a necessidade, obviamente, da retomada da ordem constitucional e do cumprimento da Constituição no rito das medidas provisórias, isso com uma obviedade muito grande”, esclareceu ao lembrar que a excepcionalidade do rito foi respaldada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) somente para o período pandêmico.
Ainda de acordo com Pacheco, todas as medidas provisórias encaminhadas pelo governo anterior e que ainda estão tramitando no Congresso Nacional serão analisadas sob as regras do rito excepcional. Já as MPs encaminhadas pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverão tramitar de acordo com o rito normal, passando pela análise nas comissões mistas e que as indicações deverão ser feitas pelos líderes partidários de cada Casa.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
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