O caso que chocou a sociedade de Canaã dos Carajás em 2017 ainda não teve um fim. A última audiência de instrução e julgamento do delegado Bruno Fernandes e dos investigadores Cláudio Nascimento e Sérgio Lago aconteceu durante toda a segunda-feira (22) e movimentou a cidade de Canaã. Os réus chegaram algemados ao Fórum de Canaã e um forte esquema de segurança foi montado no auditório do lugar. O julgamento foi aberto e o público compareceu em peso para ver de perto as quase 10 horas de depoimento.
Pela manhã, várias testemunhas de defesa negaram saber de qualquer envolvimento dos três réus com os crimes citados. Todos os depoentes são ou eram funcionários da Delegacia de Polícia local e trabalharam por algum tempo com os acusados. Uma das testemunhas até chegou a afirmar que o investigador Cláudio ofereceu uma motocicleta para ela, mas que o veículo não tinha nada a ver com qualquer crime citado do processo, já que servia para atender negócios particulares do investigador.
Já na parte da tarde, foi a vez de Bruno e dos demais réus falarem pela primeira vez desde que o caso veio à tona. O primeiro a falar foi o delegado. Contra ele, as acusações de ocultação de bens, peculato, associação criminosa e corrupção passiva; Bruno negou veementemente todas as acusações. Parecendo nervoso a princípio, o chefe de Polícia Civil falou por quase três horas e respondeu a todas as perguntas feitas pelo juiz Thiago Vinicius de Melo Quedas, pela promotoria e também pela própria defesa.
Bruno mostrou estar inconformado com as acusações feitas contra ele: “Nunca chegou ao meu conhecimento qualquer irregularidade envolvendo as motocicletas.” Segundo relato da promotoria, o delegado era o chefe de uma associação criminosa que atuava no município. Bruno negou isso e mostrou revolta com alguns policiais militares: “Os PMs estão mentindo, eles nunca apreenderam mais de uma vez a mesma moto. Depois de uma publicação que fiz em minha página do Facebook, os policiais nem me cumprimentavam mais na delegacia. Eles passaram a me odiar, me perseguir e usaram o Ministério Público para me destruir.”
Já Claudio Nascimento, falou por pouco mais de uma hora. O investigador negou as acusações, mas foi questionado pela promotoria a respeito do seu histórico de acusações por mau comportamento na Polícia Civil. De acordo com o IPC, nada jamais havia sido provado contra ele. Sobre as denúncias de que motos eram vendidas por R$ 500,00 na delegacia, ele afirmou que isso jamais aconteceu: “Quem falou isso foi um PM que está me perseguindo.” Sem conseguir conter as lágrimas, Cláudio chorou copiosamente durante o depoimento: “Ninguém sabe o que estamos passando”.
O investigador Sérgio Porto falou por menos tempo que os demais, mas também negou qualquer acusação feita contra ele.
Assim que todos os depoimentos foram ouvidos, o juiz pediu que o auditório fosse esvaziado. Somente os envolvidos no processo permaneceram no local. Após cerca de uma hora, a decisão final saiu: os acusados permanecerão presos até que todas as provas exigidas pela acusação sejam apresentadas. A partir daí, a apuração final será feita e a sentença será anunciada pelo juiz.
Em declaração, o advogado de defesa Francelino Neto, mostrou confiança em uma absolvição: “Fizemos um requerimento defensivo para que os réus fossem colocados em liberdade ou fosse aplicada uma medida cautelar alternativa. No entanto, após manifestação do Ministério Público, o juiz entendeu que, pelo menos por hora, os três deveriam continuar custodiados, mas nada impede que a defesa faça um requerimento junto ao Tribunal. O processo ainda não foi encerrado. Estamos na fase de diligências e o MP achou por bem requerer algumas provas que ainda não estão no processo, já que algumas coisas, como documentos, foram citados e não estão no processo. Nós queremos que esses documentos apareçam, além de duas motocicletas que estão sendo citadas e querem colocar que os acusados são os responsáveis. Agora vamos estudar a decisão que foi proferida pelo juiz e ver qual é o melhor caminho a ser tomado, mas é importante deixar claro que o processo não terminou. Nós não temos sentença e não existe perspectiva de quando teremos.”
Questionado se havia algum tipo de sentimento de derrota pela liberdade negada, o advogado negou: “Na verdade não existe esse sentimento. Estamos muito conscientes do que foi produzido, sabemos o que tem o processo. Na verdade, a defesa não pode ficar preocupada exclusivamente com a liberdade. Não adianta conseguir uma liberdade agora e ter amanhã uma sentença penal condenatória sem provas e sem informações que levem à uma condenação. A defesa está sendo muito cautelosa e tentando mostrar que processualmente não temos nada, já que todas as testemunhas de acusação foram muito contraditórias.”
O promotor Rui Barbosa também comentou a decisão do juiz: “O processo agora vai para as perícias e alegações finais da acusação, da defesa e o juiz dará a decisão depois disso. A liberdade foi negada pelo magistrado e eles vão continuar respondendo o processo detidos. O Ministério Público entende que há provas suficientes para as condenações de quase todos os réus. A defesa, naturalmente, pode ter outros entendimentos, mas ao nosso ver conseguimos comprovar as acusações de quase todos os réus que foram denunciados.”
Novamente algemados, Bruno, Cláudio e Sérgio seguiram ainda na noite desta segunda-feira para Belém, onde permanecerão presos até a apuração final do caso.