O caos tomou conta dos canteiros de obra da maior hidrelétrica do país. Incêndio de ônibus e caminhões, destruição de alojamentos e escritórios, pessoas feridas, roubos e um quebra-quebra geral marcaram o fim de semana na construção de Belo Monte, nas margens do rio Xingu, no Pará. Os atos de vandalismo que resultaram na paralisação de 14 mil funcionários do Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) ocorreram em meio às negociações salariais dos trabalhadores, cuja data-base se dá neste mês. Os autores da confusão, segundo o consórcio, ainda não foram identificados. O Valor apurou que ao menos cinco pessoas foram detidas pela Polícia Civil, em Altamira.
O que se sabe até agora é que um grupo de aproximadamente 30 homens encapuzados entrou em um dos quatro canteiros de obra da usina no sábado e iniciou as ações criminosas. No domingo, foi a vez de um segundo canteiro ser invadido. Ainda não há cálculos sobre os prejuízos. Nesta terça-feira, o CCBM fará uma vistoria nos canteiros para apurar os estragos e checar se há condições de retorno das obras. Em caso positivo, as operações podem ser retomadas parcialmente a partir de amanhã.
Sejam quais forem os motivos que detonaram a baderna, Belo Monte repete os capítulos de violência e vandalismo já vividos pelas hidrelétricas em construção no rio Madeira, em Porto Velho (RO), as usinas de Jirau e Santo Antônio. A Norte Energia, dona de Belo Monte, não se pronunciou sobre o assunto. A responsabilidade pelos trabalhadores e pela obra é do CCBM, contratado para erguer o empreendimento. Por meio de nota, o consórcio classificou os atos como “ação orquestrada” e informou que o assunto está sendo investigado pela polícia.
O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada e Afins (Sintrapav), que representa os trabalhadores na construção da usina, negou qualquer tipo de relação com os atos de vandalismo. Segundo Roginel Gobbo, vice-presidente do Sintrapav no Pará, a confusão atrapalhou as negociações que o sindicato realizava com o CCBM. Até ontem, ainda não estava definida uma nova data para retomada das negociações.
Basicamente, a proposta do Sintrapav é equiparar as condições de salário e benefícios de Belo Monte àquelas oferecidas nas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio. Pelos cálculos do sindicato, isso significa aumentar em 33% o salário que hoje é pago para os trabalhadores da usina do Xingu. “Nas usinas do Madeira, o piso salarial de um ajudante é de R$ 906,12, enquanto Belo Monte paga R$ 684,20 para essa mesma função”, diz Gobbo. “Estamos falando de construtoras que atuam nas mesmas obras. Além disso, boa parte dos trabalhadores de Porto Velho está indo para Altamira, mas é obrigada a aceitar um salário bem menor.”
O CCBM chegou a apresentar uma proposta de 11% de reajuste para quem tem salário até R$ 1,5 mil. Esse percentual cairia conforme o aumento dos salários. O Sintrapav negou a proposta, mas não decretou greve geral. Neste momento, portanto, a paralisação dos trabalhadores deve-se a uma decisão da própria CCBM, por conta da tensão e da insegurança que tomou conta dos canteiros de obra.
Outra reivindicação apresentada pelo Sintrapav diz respeito à “baixada” dos trabalhadores, período dado ao funcionário para que ele possa visitar seus familiares. Pelo acordo atual, cada empregado tem direito a um descanso de nove dias corridos a cada seis meses de trabalho. O sindicato quer que esta licença seja dada a cada três meses. “Essa é a condição que foi garantida nas usinas do Madeira. Não tem por que ser diferente em Belo Monte”, disse Gobbo.
Como ocorreu em Jirau, Belo Monte convive com o impasse de disputais sindicais. O Sintrapav, vinculado à Força Sindical, representa oficialmente os trabalhadores, mas o Conlutas também acompanha a movimentação de perto. Em seu site, o Conlutas informou que a revolta se espalhou em Belo Monte após o anúncio da proposta salarial feita pelo CCBM, de 11% de aumento real. “O Sintrapav, que apoiou a proposta de 11% do consórcio, foi expulso do canteiro juntamente com toda a equipe administrativa do sítio”, informou o Conlutas.
Fonte: Valor Econômico