Brasília – O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) assinaram, na última terça-feira (8), durante cerimônia na programação da Cúpula da Amazônia, carta de intenções lançando a Coalizão Verde, com objetivo de implementar o Programa de Acesso ao Crédito para Micro, Pequenas e Médias Empresas e Pequenos Empreendedores (Pró-Amazônia). O presidente da instituição brasileira, Aloizio Mercadante, informou que a parceria uniu 20 bancos públicos de toda a bacia amazônica.
A parceria entre o BID e o BNDES pretende investir US$ 900 milhões, cerca de R$ 4,5 bilhões, via Pró-Amazônia, para negócios considerados sustentáveis ambientalmente na região amazônica, especificamente para micro, pequenas e médias empresas da Amazônia brasileira.
As linhas de crédito fazem parte dos investimentos na região para a COP 30, conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) para o clima, que será realizada em Belém (PA), em 2025. O acordo foi anunciado na capital paraense, no primeiro dia da Cúpula da Amazônia, e contou com a presença da ministra do Planejamento, Simone Tebet. Isso porque é a sua pasta, através da Comissão de Financiamento Externo (Cofiex), que aprovará que esses recursos entrem no Brasil.
Segundo a ministra, a ideia é terminar a análise até o fim de setembro ou começo de outubro. Já Mercadante explicou que usará fundos de garantia do banco que preside para facilitar a liberação do crédito para os empresários. Pelo ritmo da tramitação, a operacionalização do crédito deve começar em 2024, estimou.
Empréstimos
Os empréstimos deverão cumprir políticas ambientais e sociais do BID. A ideia é que os empresários possam usar os recursos para modernizar, expandir e adquirir bens e equipamentos para inovação. O financiamento terá incentivos à adoção de práticas sustentáveis, segundo o órgão internacional.
De acordo com o presidente do BNDES, cerca de R$ 3 bilhões do valor total virão de uma linha de R$ 30 bilhões para estados e municípios, que está para ser lançada pela instituição. O restante virá de linhas tradicionais do banco de fomento ou operadas por ele, como o Fundo Clima e o Fundo Amazônia.
Mercadante explica que o objetivo é proporcionar crédito mais comprometido com a “geração de emprego, renda e alternativas para uma economia sustentável, criativa, de inovação e uma economia que mantenha a floresta em pé”. Ele disse ainda que, para manter a floresta em pé, é preciso gerar pesquisa e produtos que desenvolvam uma bioeconomia.
Antes do crédito começar a ser ofertado, o programa precisa ser aprovado pela Cofiex, ligada ao Executivo, e pelo Senado Federal. A ministra Simone Tebet afirmou esperar que o processo seja rápido e prometeu dar transparência às operações.
“Até final de setembro, no mais tardar no início de outubro, nós teremos o portal da transparência desses projetos. Qualquer cidadão, a imprensa e a sociedade civil vão poder entrar no sistema,” prometeu a ministra. Ela acrescentou que um dos objetivos é acabar com a polarização entre meio ambiente e desenvolvimento. “O que nós queremos e conseguimos garantir é desenvolvimento sustentável,” concluiu.
Presente à cerimônia de assinatura do acordo em Belém, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, destacou que mudar o modelo de desenvolvimento “não é fácil” e defendeu que não se façam investimentos “que destruam os serviços ecossistêmicos”.
“Nós temos que reduzir o desmatamento, não com ação de comando e controle [operações policiais contra o desmatamento], mas com ações de desenvolvimento sustentável. A Amazônia tem lugar para todas as atividades,” afirmou. “Tem lugar para o agronegócio de base sustentável. Tem lugar para o turismo, tem lugar para o extrativismo, tem lugar para os povos indígenas, tem lugar para bioeconomia”.
COP 30
Há pouco mais de um mês, na sede do BNDES no Rio de Janeiro, o governador do Pará, Helder Barbalho, após participar de reunião com Mercadante e técnicos do banco, explicou: “Apresentamos um conjunto de desafios, que passa desde obras estruturantes, voltadas para a mobilidade urbana, para a infraestrutura da cidade e para a agenda do saneamento, a partir da consolidação da concessão da distribuição dos serviços de água e esgoto, que está sendo modelado pelo BNDES”.
Segundo ele, o plano, mais adiante, é “transformar Belém no primeiro case de transporte coletivo com uso de matriz energética renovável, seja um transporte elétrico ou a gás”. O BNDES financiaria, portanto, os investimentos na compra de novos ônibus, menos poluentes, para substituir a frota usada atualmente em Belém.
“Estamos destinando também atenção para fomentar as ações que envolvem serviços e hospitalidade para a cidade,” afirmou Barbalho. Nesse caso, o plano é lançar uma linha de crédito numa parceria entre o banco estatal do Pará e o BNDES, para emprestar para negócios ligados ao turismo. Os financiamentos poderiam custear tanto a construção de novos hotéis quanto modernização e reformas da rede hoteleira existente.
Segundo ele, outro projeto apresentado ao BNDES no escopo dos investimentos com vistas à COP 30 envolve o fornecimento de energia elétrica para os equipamentos públicos administrados pelo governo estadual. A ideia é instalar estrutura para que toda a eletricidade consumida pelo governo seja gerada por energia fotovoltaica.
Bioeconomia
“Menina dos Olhos” de Helder Barbalho, o governador está apostando alto na bioeconomia e já é reconhecido como um dos maiores especialistas do tema no mundo governamental. Sua palestra sobre esse conceito de desenvolvimento econômico, lotou o auditório do Teatro Maria Sylvia Nunes, na Estação das Docas, em Belém, evento complementar à Cúpula da Amazônia.
Consolidar a bioeconomia como nova vocação econômica do Brasil, e até mesmo do planeta, combatendo ilegalidades e investindo em ciência, tecnologia e inovação, a fim de agregar valor ao vasto conhecimento dos povos e protetores da floresta, é o que vai nortear o debate sobre a temática ambiental na visão de Helder Barbalho. O governador do Pará preside o Consórcio da Amazônia Legal (CAL).
A “vitrine” do potencial da Bioeconomia foi destacada pelo governador ao encerrar, na noite da última quinta-feira (10), o encontro internacional “Inovação, Finanças & Natureza”. O evento teve a participação de representantes do Brasil e de outros países, ligados à iniciativa privada, instituições de ensino e pesquisa, e sociedade civil, além de comunidades tradicionais e indígenas.
Barbalho afirmou que as duas principais estratégias – combater ilegalidades ambientais e o desmatamento, e fazer com que haja mais floresta viva do que floresta morta – precisam de investimentos em tecnologia e conhecimento para a construção da sustentabilidade ambiental, econômica e social.
“Esta é uma grande oportunidade para Belém, que está no centro das discussões da Amazônia. Que está no centro daquilo que o planeta enxerga como solução para as urgências climáticas. Nos cabe assumir esse protagonismo e fazer a convocação ao mundo para financiar soluções que possam cuidar das pessoas que moram aqui,” reforçou o governador.
O encontro é um desdobramento dos eventos “Diálogos Amazônicos” e “Cúpula da Amazônia”, realizados na capital paraense entre 4 e 9 de agosto. Segundo ele, a presença de tantos representantes em mais essa agenda confirma a mobilização de tantos entes em torno de uma pauta de interesse mundial.
Mosaico produtivo
“Sem fiscalização e combate à ilegalidade não vai em frente; mas só isso não basta. Temos 6 milhões de áreas antropizadas (modificadas pela ação do homem), o segundo maior rebanho bovino do Brasil, a maior cultura de cacau, açaí, mandioca, pimenta-do-reino e de palmas. E este mesmo estado deve aparecer este ano no balanço minerário brasileiro como a mais importante província minerária do país. Somos um mosaico. Se houver aprofundamento do nosso Plano Estadual de Bioeconomia (PlanBio), que apresentamos ano passado lá no Egito durante a COP 27, teremos bioeconomia e outros. Não queremos excluir,” enfatizou Barbalho.
Ele informou que, no âmbito do PlanBio, foi feito um levantamento que sugere uma movimentação econômica de US$ 120 bilhões de dólares [R$ 588 bilhões de reais] anuais com apenas 43 produtos oriundos da floresta.
“Só no ano de 2022, a exportação desses produtos movimentou cerca de US$ 250 milhões de dólares [R$ 1,225 bilhão de reais]. Queremos ser líder de bioeconomia do Brasil, sendo também o estado da mineração legal e combatendo a ilegal. Ser protagonista na produção alimentar mudando a chave, ficando na produção intensiva sem derrubar árvore para ser produtor de grãos e proteína animal. É preciso mudar o raciocínio e, ao mesmo tempo, haver uma grande convergência de todos os atores envolvidos,” ressaltou o governador, muito aplaudido ao fim da apresentação, com tradução simultânea para o inglês.
Por Val André Mutran – de Brasília