CELPA: fragilidades expostas

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Por Claudio J. D. Sales – O Estado de S. Paulo

Recentemente a concessionária de energia elétrica do Pará, Celpa, entrou com pedido de recuperação judicial. Trata-se de um caso emblemático que revela fragilidades que transpõem as fronteiras da concessionária.

A Celpa não é a primeira concessionária em dificuldades nem será a última. O País convive com concessionárias deficitárias há anos, como a CEA, distribuidora do Amapá, e a estatal goiana Celg D. Cogita-se a transferência da gestão de ambas para a Eletrobrás, o que poderia ser considerada uma solução, não fosse a dificuldade que a estatal federal enfrenta para gerir outras cinco distribuidoras que permanecem deficitárias até hoje, apesar de injeções bilionárias de recursos públicos. O prejuízo das distribuidoras da Eletrobrás em 2011 foi de R$ 931 milhões.

Tamanho número de concessionárias em dificuldades demonstra que gerenciar uma concessão de energia não é trivial.

Alguns observadores são rápidos em atribuir todas as dificuldades da Celpa à gestão, negligenciando fatores igualmente relevantes. Quem conhece melhor a situação sabe que os problemas transpõem aspectos de gestão e são fortemente influenciados pela atuação do Estado em questões como perdas de energia e regulação tarifária, por exemplo. Na avaliação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), “os custos gerenciáveis incorridos pela Celpa se mantiveram em linha com o padrão regulatório” (Nota Técnica n.º 60/2011), o que sugere que a crise vivenciada pela concessionária não decorre de descontrole de custos por má gestão.

Um dos maiores problemas com que se defronta a Celpa são as perdas decorrentes de furtos (“gatos”) e fraudes (adulteração de medidores). Segundo estudos da Aneel, é de esperar que as perdas da Celpa sejam mais altas, pois se trata da área de concessão de maior “complexidade socioeconômica” no País. Essa complexidade é explicada pelos altos índices de violência, desordenamento urbano e outros fatores fora da alçada da distribuidora.

Apesar disso, a Celpa tem atuado com vigor para reduzir as perdas. Quando o Grupo Rede assumiu a concessão, em 1998, as suas perdas chegavam a 37%. Com grande investimento conseguiu reduzi-las a 20%, mas nos anos subsequentes sofreu vários reveses. Por exemplo, após implantar um promissor sistema de medição centralizada em 2006-2007, a empresa foi obrigada a suspender o seu uso por causa de novas exigências de certificação, o que resultou na suspensão do faturamento dos consumidores atendidos por esses medidores por dois anos.

Isso para não falar da grave inadimplência (inclusive de alguns agentes do setor público), das restrições regulatórias que restringem o corte de unidades consumidoras inadimplentes e das decisões judiciais que fazem surgir “esqueletos” (passivos ocultos).

Outro agravante foi o Luz Para Todos, programa cheio de méritos, mas que obrigou a Celpa a perseguir um padrão de crescimento que minava a sua própria rentabilidade. Entre 2003 e 2011, a concessionária foi compelida a expandir a sua rede a uma taxa de 13,4% ao ano, enquanto o consumo de energia crescia apenas 5,4%, o que resultou em elevação de investimentos e de custos a taxas superiores à das receitas.

Para piorar, a Aneel vem adotando uma postura punitiva com multas elevadas que, em vez de induzir à melhoria do serviço, debilita a capacidade de resposta da concessionária. O último golpe foi a nova metodologia de revisão tarifária aprovada em dezembro, que irá comprimir ainda mais as margens das distribuidoras. Diante dessa perspectiva, não foi à toa que a empresa teve de recorrer a uma reestruturação financeira.

A situação da Celpa serve como um alerta. Após anos de compressão de margens por meio da regulação tarifária, elevação das penalidades, ações judiciais e elevada complexidade social, as concessionárias de distribuição podem estar caminhando para um cenário-limite. E, se esse cenário se concretizar, perderão todos, a começar pelos consumidores de energia.