Em Audiência Pública promovida pela Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais (CPOVOS) da Câmara dos Deputados, na terça-feira (2), requerida pelos deputados Airton Faleiro (PT-PA), Dilvanda Faro (PT-PA) e outros, cientistas convidados pediram urgência no combate ao desmatamento e ao fogo para evitar o chamado “ponto de não retorno” na degradação da Floresta Amazônica, que também ouviu representantes do governo e da sociedade civil para atualizar a situação do bioma, palco de sucessivas secas nos últimos anos.
Coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, o climatologista Carlos Nobre descreveu o impacto do desmatamento e do aquecimento global, ambos provocados por ações humanas na Amazônia. “Nós temos em toda a Amazônia quase um milhão de quilômetros quadrados desmatados e 75% disso foi substituído por pastagens. Nos últimos 40 anos, a estação seca está ficando uma semana mais longa por década. Se a estação seca chegar a seis meses, será clima de Cerrado: a floresta vai se autodegradar”, prevê.
A nível global, cientistas de vários países estão chegando a descoberta ainda mais devastadora. Um fenômeno novo, que só agora começa a ser estudado com profundidade, explica parte de fenômenos climáticos globais ainda não totalmente compreendidos, a ponto de desencadear, anomalias climáticas em sucessão ao redor do mundo.
A diretora de ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Ane Alencar, acrescentou que sucessivos incêndios florestais aceleram esse “ponto de não retorno” na maior floresta tropical do mundo. A cientista apresentou dados recentes do MapBiomas que colocam a Amazônia como segundo ecossistema mais devastado pelo fogo no Brasil, só atrás do Cerrado. “Números apontam 42% que de tudo que foi queimado entre 1985 e 2023 ocorreu na Amazônia. A atividade humana tem modificado o padrão de resistência da floresta e hoje a gente vê uma parte da Amazônia cada vez mais fragmentada”.
Ações do governo
O governo apresentou dados positivos de redução do desmatamento, mas admitiu a continuidade da degradação do bioma por incêndios florestais. Secretário da área no Ministério do Meio Ambiente, André Lima lembrou que a taxa de desmatamento amazônico de 9.064 Km² do ano passado foi a menor desde 2019.
De agosto de 2023 a junho deste ano, a redução do desmatamento aumentou para 52,3%, a menor desde 2016. André Lima citou uma lista de ações para evitar o “ponto de não retorno” na Amazônia, como investimentos em bioeconomia em escala e na restauração agroflorestal. “Também engajamento efetivo dos estados e municípios e aprovarmos o projeto de lei de manejo integrado do fogo, ainda antes do recesso parlamentar. Esse projeto vai permitir criar uma instância de coordenação das ações para enfrentamento dos incêndios florestais no Brasil”, completou.
A proposta de Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo previsto no projeto de lei (PL n° 1.1276/2018) foi aprovada pela Câmara em 2021 e aguarda análise do Senado. Entre outras medidas já tomadas pelo governo no bioma, André Lima destacou a retomada do Fundo Amazônia e o Programa União com os Municípios, com previsão de R$ 600 milhões em serviços de regularização ambiental e fundiária e de assistência técnica em 70 cidades prioritárias.
Também anunciou a elaboração de um mecanismo financeiro internacional de apoio à conservação florestal que o Brasil negocia junto ao G20 e que deverá ser oficialmente anunciado durante a COP 30, a Conferência da ONU sobre Mudança do Clima prevista para Belém do Pará, no próximo ano.
Já o superintendente da Fundação Amazônia Sustentável, Virgílio Viana, fez apelos ao Congresso Nacional para aprovar medidas, como a regulamentação do mercado de carbono, e barrar uma série de propostas nocivas ao meio ambiente. “Temos uma encruzilhada pela frente: ou nós escutamos a ciência ou nós enfrentaremos consequências muito mais custosas”. Dentre elas, a ação negacionista e articulada de setores da sociedade que disseminam que não existe aquecimento global na Terra, embora o recente fenômeno ocorrido no estado do Rio Grande do Sul e a seca sem precedentes na Amazônia, digam o contrário.
Um dos proponentes do do debate, o deputado Dorinaldo Malafaia (PDT-AP) reforçou a relevância da discussão do tema na Câmara. “A discussão sobre o ‘ponto de não retorno’ e os extremos climáticos é um fato. Precisamos nos pautar pela ciência, enfrentar o negacionismo científico impregnado nesta Casa e trazer a sociedade civil e as autoridades para termos decisões mais assertivas”.
O deputado acrescentou que o tema também precisa ser debatido nas campanhas eleitorais deste ano, com foco nas ações municipais.
Dados de 2023 e início de 2024
Em 2023, a área desmatada na Amazônia foi de 9.064 km² entre agosto de 2022 e julho de 2023, o que equivale ao tamanho da República de Chipre no Mediterrâneo. Esses números representam uma queda de 21,8% em relação à temporada anterior, quando 11.594 km² foram desmatados entre agosto de 2021 e julho de 2022.
Além disso, os dados de alertas de desmatamento do sistema Deter indicam uma queda ainda mais acentuada nos últimos nove meses, com 2.686 km² registrados de agosto de 2023 a abril de 2024, representando uma redução de 55% em relação ao mesmo período anterior.
Essa diminuição é resultado de medidas de fiscalização e controle ambiental, bem como estratégias voltadas para o combate ao desmatamento. Vale ressaltar que, nos primeiros dois meses de 2024, os estados com maior desmatamento na Amazônia foram Mato Grosso, Roraima e Amazonas, totalizando 152 km² de floresta destruída. EM contraste o Pará conseguiu redução recorde no mesmo período, resultado das ações de comando e controle ordenadas pelo governador Helder Barbalho (MDB). Ele será o anfitrião da COP 30 em novembro de 2025, em Belém do Pará.
Relatório divulgado pelo MapBiomas aponta uma queda significativa de 62,2% no desmatamento no bioma Amazônia. Esses esforços são cruciais para a preservação desse ecossistema vital.
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
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