Coluna Direto de Brasília #Ed. 268 – Por Val-André Mutran

Uma coletânea do que os parlamentares paraenses produziram durante a semana em Brasília.
Cúpula da Amazônia não consegue avançar em dilemas que COPs discutem há décadas, enquanto o clima planetário apresenta a conta sem respeitar fronteiras

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Política & Governos

Cúpula da Amazônia em 10 notas

Cúpula da Amazônia I
Nos mais de 100 parágrafos e 113 pontos citados na Declaração de Belém, documento resultante de dois dias de reuniões entre oito países-membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), a comunidade internacional viu mais do mesmo. Nada do que difere das Convenções Partes do Clima (COP), patrocinadas pela Organização da Nações Unidas (ONU). Promessas, muitas promessas.

Cúpula da Amazônia — Foto oficial do evento

Cúpula da Amazônia II
Até antigos consensos foram colocados à prova, como o compromisso de repassar recursos a países em desenvolvimento, frequentemente cobrado pelo presidente Lula em seus discursos. O presidente colombiano, Gustavo Petro, criticou o foco do grupo nesse tipo de cobrança. “Pedir que nos deem dinheiro não é suficiente. Essa é uma maneira retórica do Norte dizer que está fazendo algo. Se nós valorizarmos [a Amazônia], ela vale muito mais. Não é com presente do Norte que vamos fazer isso”, disse Petro.

Gustavo Petro e Lula durante a Cúpula da Amazônia — Foto: Cristian Garavito/Presidência da Colômbia via Reuters

Cúpula da Amazônia III
Outro que criticou a atuação de atores estrangeiros na Amazônia foi o presidente da Bolívia, Luiz Alberto Arce. Segundo ele, enquanto os Estados Unidos tentariam influenciar a região por meios militares, a Europa tentaria fazê-lo por meio de organizações não-governamentais. Arce, no entanto, não ofereceu nenhuma evidência disso. Inclusive, falou-se pelos corredores do Centro de Convenções de Belém, que foi justamente os Estados unidos que esvaziaram pela metade o evento, ao pedir que 4 dos 8 convidados, não fossem ao evento, algo também difícil de ser provado.

Ministra do Meio Ambiente Marina Silva, chanceler Mauro Vieira, presidente Lula, governador do Pará Helder Barbalho, ministra dos Povos Indígenas do Brasil, Sônia Guajajara — Foto: Redes sociais

Cúpula da Amazônia IV
Nos dias que antecederam a cúpula, movimentos sociais reunidos na capital paraense fizeram manifestações pedindo o fim da exploração de petróleo na Amazônia e a redução global da utilização de combustíveis fósseis. Elas são apontadas como principais responsáveis pelas emissões de gases do efeito estufa que causam as mudanças climáticas e atalho para os que ambientalistas chamam de ponto de não retorno, quando, o que se fizer, não mais será revertido em termos climáticos e de recuperação das florestas.
Mas, enquanto os movimentos sociais eram incensados, com plenárias setoriais para apresentarem suas propostas, empresários, industriais e comerciantes não foram sequer convidados para participar, nem que fosse como ouvintes. Um deles me disse que o governo deve entender que está tudo bem com o capital na Amazônia. “Mil maravilhas”, ironizou.

Cúpula da Amazônia: encontro ocorre em agosto em 2023 — Foto: Marco Santos/Agência Pará

Cúpula da Amazônia V
Não está, como mostrou um seminário promovido pelos próprios não convidados, em palestras concorridas promovidas pela Associação PanAmazônia, com apoio de Federações de Comércio, Indústria e Serviços, Agricultura e Agropecuária onde foram demonstradas as aventuras de empreender na Amazônia, algo que soa como crime para muitos dos movimentos sociais com carta branca nos eventos oficiais. Algumas apresentaram propostas medievais e descabidas como fora boi, soja e motos da Amazônia, se referindo ao complexo industrial da Zona Franca de Manaus (AM), e a extinção do motor econômico da região: a agropecuária e a agricultura.

Cúpula da Amazônia VI
A Cúpula da Amazônia foi exatamente isso, ONGs e Movimentos Sociais hostilizando empreendedores malvadões da natureza. Sem o que não haveria nada, exceto mato, chuva e calor, como debochadamente disse o jornalista da CNN Wiliam Waack, um notório xenófobo, demitido da Rede Globo justamente por isso e agora recrutado pela “maior do mundo”, na cobertura do evento.

Cúpula da Amazônia VII
Apesar da tentativa do governo brasileiro, em focar a declaração primordialmente no aspecto florestal, a exploração de petróleo na Amazônia acabou incluída no documento final da cúpula.
O tema é delicado para países ricos em reservas de petróleo como o Brasil, Venezuela, Guiana, Suriname e Equador. Do outro lado, praticamente isolada, ficou a Colômbia. Em seu discurso durante a cúpula, Petro voltou a criticar a exploração de petróleo, mantendo a posição do governo que, no início do ano, prometeu não liberar novas licenças de exploração de petróleo no país.

Cúpula da Amazônia VIII
O termo “desmatamento” aparece 13 vezes no documento, mas a meta de que todos os países aderissem à taxa zero até 2030 não aparece em nenhum dos 100 parágrafos.
No lugar desse compromisso, os países prometeram estabelecer uma “Aliança de Combate ao Desmatamento entre os Estados Partes” que contempla metas nacionais menos ambiciosas que a de desmatamento zero até 2030.
Sem consensos cruciais como a produção de petróleo na região e metas palpáveis de desmatamento, a cúpula ficou a dever e fica a impressão que o dever de casa está longe de ficar pronto para ser apresentado na COP 28.

Presidente da próxima edição da COP 28, Sultan Ahmed Al-Jaber. — Foto: Audiovisual/PR

Cúpula da Amazônia IX
A Cúpula da Amazônia tinha um fundamento geral, de acordo com o presidente Lula: “A ideia básica é a gente sair daqui preparado para, de forma unificada, todos os países que têm floresta terem uma posição comum nos Emirados Árabes durante a COP28 e mudar a discussão”, disse .

Líderes empresariais no Seminário promovido pela Associação PanAmazônia, na véspera da Cúpula da Amazônia

Cúpula da Amazônia X
A meta foi assumida por Lula no início do ano. No programa Conversa com o Presidente, da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), Lula disse que gostaria de sair da cúpula com uma política “unificada” sobre meio ambiente durante a COP 28.
A cúpula vinha sendo tratada como uma espécie de ensaio para a diplomacia brasileira para a 28º Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP 28), que será realizada no final do ano, nos Emirados Árabes Unidos. Pelo visto, os diplomatas brasileiros não passaram de ano, ficaram em recuperação e terão de contar com aulas extras para não serem reprovados.

Diálogos da Amazônia
É preciso ouvir a Ciência, proteger os povos e evitar o ponto de não-retorno das florestas. Está foi a mensagem firmada após três dias de programação dos Diálogos Amazônicos, no Hangar Convenções & Feiras da Amazônia, que contou com cerca de 27 mil participantes inscritos entre sexta-feira (4) e domingo (6).
Ocorridos durante três dias antes da Cúpula da Amazônia, os Diálogos da Amazônia foram um compromisso do governo federal de reunir os documentos das plenárias para serem aproveitados na base para a Declaração de Belém, divulgada na terça-feira (8/8).

Confira, a seguir, o resumo das principais propostas da sociedade civil aos presidentes:

Proteção dos territórios

Relatório 1: “A participação e a proteção dos territórios, dos ativistas, da sociedade civil e dos povos das florestas e das águas no desenvolvimento sustentável da Amazônia. Erradicação do trabalho escravo no território”.

-necessidade do reconhecimento das tecnologias sociais nos territórios, como no campo da economia dos usos sustentáveis e práticas tradicionais, deve ser compreendido como estratégico;

– urgência da demarcação e a proteção das Terras Indígenas

– construir processos coletivos de defesa da Amazônia

– promover a formação de promotores indígenas de Direitos Humanos

Saúde e segurança aliment

Relatório 2: “Saúde, soberania e segurança alimentar e nutricional na região amazônica: ações emergenciais e políticas estruturantes”.

– implementar política responsável de produção e distribuição de alimentos, considerando diferenças culturais, étnico/raciais e de gênero;

– avançar na regularização fundiária que garanta os direitos aos territórios das populações indígenas, quilombolas e tradicionais, além dos agricultores familiares;

– pensar políticas públicas que fortaleçam a produção existente, como também o abastecimento de quem tem tido dificuldade de acesso a alimentação;

– enfrentar o racismo ambiental também respeitando as estratégias de produção e organização das mulheres, pela potencialização do acesso a terra e a defesa do território.

Relatório 3: “Como pensar a Amazônia para o futuro a partir da ciência, tecnologia, inovação, pesquisa acadêmica e transição energética”.

– avançar na gestão de uma política integrada do solo que seja sensível à água como um dos fatores essenciais à vida e à produção;

– favorecer a mobilização de recursos voltados à produção de ciência, conhecimento e tecnologia a partir da Amazônia e em diálogo com o conhecimento dos povos que aqui vivem;

– países membros da OTCA devem assumir o compromisso de preservar ao menos 80% da Amazônia até 2025;

– eliminar a mineração ilegal e o uso de mercúrio até 2027

– proibir a mineração de ouro na Amazônia

– fechar os mercados ilegais de mercúrio, ouro e outros produtos

Mudança do clima e agroecologia

Relatório 4: “Mudança do clima, agroecologia e as sociobioeconomias da Amazônia: manejo sustentável e os novos modelos de produção para o desenvolvimento regional”

– declarar emergência climática na Pan-Amazônia e construir um Plano Estratégico Regional de Ação Emergencial para a Amazônia;

– adotar medidas urgentes para a preservação e o equilíbrio da floresta, evitando o ponto de não-retorno e garantir a preservação de pelo menos 80% do bioma até 2025;

– construir um plano de eliminação do desmatamento ilegal, degradação e contaminação até 2025, e de um plano similar para o desmatamento legal até 2027;

– recuperar as florestas degradadas com sistemas agroflorestais, com predominância de espécies amazônicas;

– investir na restauração florestal (biocultural) considerado seus agentes sociais no território;

– promover integração e sinergia entre as unidades de conservação existentes;

– desenvolver acordos de cooperação e ações transfronteiriças de combate às práticas predatórias que contribuem para a expansão dos incêndios, do desmatamento e da contaminação.

Relatório 5: “Os povos indígenas das Amazônias: um novo projeto inclusivo para a região”.

– rejeição da tese do marco temporal e consolidação de salva guardas jurídicas para que novas propostas dessa natureza não possam ser retomadas;

– políticas públicas de saúde e educação escolar intercultural e de qualidade;

– revisão de legislações que contemplem os indígenas que vivem em contextos urbanos, no que tange às políticas educacionais, culturais e de saúde específicas;

– políticas de valorização e fortalecimento das línguas indígenas, com a cooficialização das línguas indígenas;

– criação de universidades indígenas, bem como incorporação de ciência e história indígena nos currículos universitários;

– demarcação de todos os territórios indígenas e titulação dos territórios quilombolas reivindicados até 2025;

Relatório 6: Amazônias Negras: Racismo Ambiental, Povos e Comunidades Tradicionais

– promover economia produtiva para combater a desigualdade e a pobreza entre a população afro que ocupa os países da região amazônica;

– enfrentar, em conjunto com as comunidades afrodescendentes, os desafios de construir diplomacia real e concreta para promover interesses e direitos;

– assumir o enfrentamento ao racismo ambiental como tema central na Cúpula da Amazônia e na Cop 30;

– criar Comitê de Monitoramento da Amazônia Negra para, entre outros pontos, debater encarceramento da juventude negra e incentivar as ações antirracistas em instituições de ensino;

– ampliar políticas de promoção da igualdade racial;

– titular comunidades quilombolas.

Governador Helder Barbalho durante a reunião com Sultan Ahmed Al-Jaber, na sede do Governo, em Belém — Foto: Marco Santos/Ag. Pará

Convite
Governador Helder Barbalho (MDB) foi convidado pelo Sultan Ahmed Al-Jaber, presidente da próxima edição da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP 28), que ocorrerá no final deste ano nos Emirados Árabes Unidos para, desde já, fazer parte do processo de organização da conferência internacional sobre o clima que já está em andamento em Dubai. “Com isso, irão vivenciar a experiência junto conosco em um ganho em tempo real”, disse o presidente da COP 28, uma vez que Helder será o anfitrião da COP 30, em outubro de 2025 em Belém do Pará.

Bancada do Pará

LDO
Deputados e senadores da bancada paraense priorizaram em suas agendas os ajustes para as emendas a serem apresentadas ao Orçamento Geral da União do ano que vem, o primeiro do governo Lula.
O presidente lança nesta sexta-feira (11) o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e chama a atenção a quantidade de obras antigas e abandonadas que serão retomadas.

De volta na semana que vem
Estaremos de volta na próxima semana publicando direto de Brasília, as notícias que afetam a vida de todos os brasileiros, com as reportagens exclusivas aqui no Blog do Zé Dudu.

* Val-André Mutran – É correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
Contato: valandre@agenciacarajas.com.br
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