Quando não se tem nada a dizer, necessário que se cale. Mas não. Faz muito silêncio dentro de mim e eu me abasteço de ruídos. Tenho poucas crenças, acredito no Deus do filósofo Espinosa que a minha amiga Teresa de Marabá me fez lembrar através de um vídeo recente que me mandou.
Não pode ser verdade que Deus exista e crie coisas que não fazem parte dele. Por que um criador onipotente teria inventado o mal e se isenta de aperfeiçoar a existência? Não faz o menor sentido.
Segundo Espinosa, cada homem engendrou, com base em sua própria inclinação, diferentes maneiras de prestar culto a Deus, para que Deus o contemple mais que os outros e governe toda a natureza em proveito do seu cego desejo e da sua insaciável cobiça.
Esse preconceito transformou-se assim em superstição e criou profundas raízes em nossas mentes, fazendo com que cada um de nós dedicasse o máximo esforço para compreender e explicar as causas finais de todas as coisas. E nós não somos capazes de entender esse mistério todo e aí aceitamos essa ideia pronta desse Deus onipotente, onipresente e onisciente, que tem todo poder, todo conhecimento e esta em todo lado.
Mas Deus, meus amigos, não age por capricho, não realiza milagres. Se ele existir, e há os que creem, ele é só uma força que libera a energia e a liberdade e o arbítrio para que ajamos segundo o nosso código de ética.
O fato é que todo homem nasce ateu. Deus não surge espontaneamente na boca das crianças. É portanto, o entorno, ou seja, os nossos tataravós, bisavós, avós, pais, família e a comunidade, e em boa parte do mundo – cristão – que determina as convicções religiosas dos pequenos, num período de vida em que eles (nós) tendem a acreditar em tudo o que ouvem dos adultos.
O pensador ateu Daniel Sottomaior, criador da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (ATEA) publicou uma espécie de mantra extraoficial dos ateus:
“Obrigado, Senhor, porque me deu de comer hoje, apesar de ter esquecido as centenas de milhares de crianças que morrem de fome todos os anos, por mais que elas e seus pais tenham orado! Obrigado, Senhor, por atender as minhas preces quando peço para o meu time ganhar embora não atendesse as preces de milhares de pessoas que imploram pela paz diariamente! Obrigado, Senhor, porque salvou a vida de uma pessoa no meio de um desastre com milhares de vítimas fatais”!
Na verdade, o homem vive entre a esperança de ser beneficiado e o medo de ser castigado, pois acredita que Deus interfere no curso da existência por mera vontade. E o triste nisso tudo é que quem acredita que Deus muda o curso de sua natureza em seu proveito, desperdiça o máximo esforço, pois não faz o melhor de si, só ajoelha, reza e espera.
O bom de não se submeter de forma quase fundamentalista à uma religião é que não preciso renunciar à vida na Terra para encontrar Deus de braços abertos no outro mundo. Na verdade, preciso e devo buscar a melhor vida possível, aqui e agora, para salvar-me ainda em vida. E quando digo salvar-me é ser justo, digno, ético, intolerante com a intolerância, humano e generoso.
O problema da religião é que ela dissocia as questões do bem e do mal da questão do bem-estar. Por isso, a religião ignora o sofrimento em certas situações, e em outras, chega a incentivá-lo. Por exemplo, ao se opor aos métodos contraceptivos, o dogma da Igreja Católica causa sofrimento. É coerente com seus dogmas, embora ele leve crianças a nascerem na pobreza extrema e pessoas serem infectadas de AIDS por fazerem sexo sem camisinha. A religião dos muçulmanos fundamentalistas, os Jihads , entendem que podem chegar ao paraíso explodindo pessoas inocentes. Isso não é um arranjo tolerável.
Temos que combater essas coisas por meio da intolerância às pessoas que estão comprometidas com esses valores.
A grande questão é que eu não sou a melhor pessoa para tratar desses temas seculares. Na verdade, eu, em princípio, quando do inicio do texto, a exemplo de Deus, só tinha o verbo. Depois é que me socorreram orações subordinadas adverbiais consecutivas e confirmativas, pronomes oblíquos, predicados, orações adversativas e polissíndetos, hipérbatos, silepses, metáforas, hipérboles e zeugmas, que eu fui separando com virgulas, ponto e virgula, hifens, travessões, dois pontos e ponto final, por conta do isolamento social, que entendo ser extensivo às palavras.
Não me ocorre neste momento da madrugada algo relevante para vos dizer depois desta quinta taça de vinho. Hoje já é uma nova semana, talvez um novo tempo. Talvez consigamos iniciar a deposição do nosso Grão-Vizir e aí tudo poderá melhorar. Até lá eu bebo vinho, trabalho e ouço jazz. Uma ótima semana para vocês.