Com 17 mesas de negociações, governo quer encerrar greves do funcionalismo público

Apesar dos 27 acordos assinados, algumas categorias não aceitaram propostas
Servidores do Meio Ambiente fazem ato em frente ao STJ (Foto: Ascema Nacional)

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Com a plena retomada dos trabalhos no Congresso Nacional a partir desta segunda-feira (12), e faltando menos de um mês para o envio pelo Executivo do Projeto de Lei Orçamentária 2025 ao Parlamento, 17 mesas de negociação de reajuste salarial de várias categorias do serviço público federal ainda seguem sem solução.

O governo e os servidores tentam chegar à reta final de negociações salariais. Apesar de quase 30 acordos fechados, sindicatos que representam os servidores em greve, dizem que a estratégia do governo reforça desigualdades. O Executivo, por sua vez, afirma que o saldo geral das negociações é positivo.

Além dos 27 acordos que já foram assinados, o Ministério da Gestão e da Inovação (MGI) tem pela frente um grupo de carreiras que já recebeu a proposta final e, portanto, considera que não há espaço para avançar.

O caso mais emblemático é o do Meio Ambiente. No último dia 23 de julho, os servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Ministério do Meio Ambiente chegaram a levar uma contraproposta ao governo, cujo impacto financeiro foi considerado muito alto.

Na última semana não houve avanço nas negociações. A última reunião, em resposta a contraproposta dos servidores, ocorreu na tarde de sexta-feira (2), quando o MGI fez um último movimento para tentar pôr fim à greve dos servidores, que teve início em 1º de julho. A proposta, no entanto, segue aquém das expectativas dos representantes da Associação Nacional dos Servidores de Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema Nacional), que já deram início a um novo processo de consultas aos sindicatos nos estados ao longo dos próximos dias.

Em situação semelhante, na espera por uma resposta das entidades de classe, o governo contabiliza outras cinco negociações.

“A gente tem algumas mesas que já estão com a proposta final, e essas a gente já vai começar a sinalizar para que possam dar o retorno. Por quê? Porque nós temos um outro conjunto de entidades que vamos apresentar a proposta final, provavelmente nesta semana. São muitos diálogos,” explicou a secretária-adjunta da Secretaria de Relações do Trabalho do MGI, Meri Lucas.

Esse segundo segmento de carreiras prossegue em tratativas, e o desfecho das conversas, embora esteja previsto para o dia 16 de agosto, pode se arrastar até o fim do mês.

Neste momento, por exemplo, os negociadores do MGI estão em franco diálogo com as agências reguladoras e com o segmento de finanças e controle, que programou greve entre quarta e quinta-feira da próxima semana.

No Tesouro Nacional e na Controladoria-Geral da União (CGU), também está em curso um processo de entrega de cargos. Até o final da semana passada, mais de 100 cargos haviam sido entregues no Tesouro, enquanto em Brasília e unidades da CGU em nove estados há uma movimentação maciça. Mesmo que haja acordo, o governo sofre um revés administrativo, uma vez que novas nomeações dos cargos colocados à disposição não se dão de uma hora para outra.

O conjunto de mais de 40 negociações deve resultar em um único projeto de lei, que não precisa chegar ao Congresso em agosto. No entanto, o Projeto de Lei Orçamentária, que será encaminhado até o próximo dia 31 de agosto, precisa descrever o impacto orçamentário dos acordos.

Apenas os sete acordos que foram submetidos ao Congresso, no final de 2023, têm impacto estimado de R$ 3,5 bilhões, entre 2025 e 2026.

Apesar de acordos, o clima é de frustração nas entidades

Embora o MGI já tenha firmado 27 acordos com diferentes carreiras, há um clima de frustração em muitas entidades de classe, especialmente dos servidores de menor remuneração.

Há duas semanas, a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), que representa a maior parte do funcionalismo, divulgou texto em que chama de “desastrosa” a estratégia do governo para negociar reajustes e reestruturações de carreira por meio das mesas específicas e temporárias.

“Essa política está promovendo um aprofundamento do problema que o próprio governo Lula se comprometeu a combater: as graves distorções salariais no Executivo Federal. Esse tratamento diferenciado, inclusive dentro do mesmo órgão, aprofunda e consolida uma política salarial equivocada e elitista que discrimina e estratifica os servidores federais,” afirma a entidade.

A nota foi publicada depois que o MGI decidiu negociar de forma separada com dois grupos de servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) –  um deles, formado por oficiais de inteligência e agentes de inteligência, teve reajuste maior do que o grupo de informação e apoio, gerando descontentamento com a adoção de dois pesos e uma medida.

Além disso, o Condsef avalia que o governo distorce a premissa de reduzir as desigualdades entre as carreiras, ao oferecer percentuais de reajuste de 9%, a partir de janeiro de 2025, e 5%, a partir de abril de 2026, para as maiores em número de pessoas, enquanto apontou para recomposição média de 23% nos demais segmentos.

O secretário-geral da entidade, Sergio Ronaldo, alerta que o Executivo se colocou em uma situação inusitada, onde fecha acordos, concede reajustes e deixa os servidores insatisfeitos, ao não seguir o plano de reduzir as desigualdades.

“O governo falou uma coisa, mas está fazendo outra. O que aconteceu, na prática, foi o contrário do que se prometeu. Além disso, apesar das falas do presidente Lula sobre greve, o governo entrou na Justiça, com multas altíssimas, nos casos do Ibama e do INSS [Instituto Nacional do Seguro Social]. Na verdade, quem chegou primeiro conseguiu o que queria. O restante fica com o que dá ou nada,” protestou Sergio Ronaldo.

Nessa mesma tônica, representantes das carreiras típicas de Estado identificam tratamento diferenciado à Receita Federal, que conquistou, no começo do ano, o bônus de eficiência.

Uma avaliação corrente aponta que a atuação do Ministério da Fazenda, em favor dos auditores da Receita, desconfigurou os planos do MGI antes mesmo do início das tratativas com as demais carreiras. Nessa análise, feita por dirigentes de entidades de classe, algumas negociações teriam encaminhamento melhor, caso o acordo da Receita não fosse comparativamente mais vantajoso.

Governo afirma que o saldo das negociações é positivo

A secretária-adjunta de Relações do Trabalho do MGI, Meri Lucas, reconhece que as carreiras se miram entre si. Porém, assinala que o saldo geral tem sido positivo, com um processo marcado pelo diálogo e por reestruturações de carreira, com reajustes superiores à inflação.

“Nós temos tratamentos diferentes, a depender de cada situação da carreira, mas eu acredito que o saldo geral da negociação está sendo bastante positivo. Tanto que as entidades assinaram os acordos. E não assinaram um acordo em que foi tudo ou nada. Não é só o reajuste remuneratório, mas é um conjunto de coisas que foram somadas, com as reestruturações de diversas carreiras,” afirma a secretária do MGI.

Meri Lucas pontua também que o conjunto de acordos permitiu padronizações que até agora não existiam na administração federal. “Acho que a gente conseguiu caminhar para a padronização, agora com 20 níveis em todas as carreiras, do inicial até o topo da carreira. Obviamente, vamos respeitar os critérios de progressão e promoção, mas que os critérios de progressão e promoção possam ser aferidos de 12 em 12 meses,” complementa.

Em 2023, o governo concedeu reajuste linear de 9% para todo o funcionalismo federal. Neste ano, o Executivo também reajustou o auxílio-alimentação de R$ 658 para R$ 1 mil, além do aumento de 51,1% na assistência à saúde suplementar e na assistência pré-escolar. Na semana passada, foi concedido também um reajuste aos cargos comissionados do Executivo.

Por Val-André Mutran – de Brasília

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