Comissão coloca em consulta pública proposta que regulamenta a produção “do combustível do futuro” no Brasil

O texto fica aberto a consulta até 23 de outubro, e poderá ser votado no dia seguinte
Na foto, em sentido horário, o deputado Bacelar (PV-BA) e o presidente da comissão especial, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP)

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A Comissão Especial da Transição Energética e Produção de Hidrogênio Verde da Câmara dos Deputados promove novo debate na terça-feira (17) sobre a regulamentação do hidrogênio sustentável. A audiência será realizada no plenário 4, a partir das 14h30. Veja aqui, a relação dos convidados para o debate.

O debate foi proposto pelos deputados Bacelar (PV-BA) e Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), respectivamente, relator e presidente da comissão. Na semana passada o ‘’deputado verde’’, apresentou, na terça-feira (10), o relatório preliminar (confira aqui), que propõe a criação do Marco Legal do Hidrogênio de Baixo Carbono. A previsão é que o texto seja votado no próximo dia 24/10 — um dia após o encerramento da consulta pública do texto, que aguarda as contribuições da sociedade.

O documento trata de governança, certificação, taxonomia e incentivos para o setor. Bacelar propõe a instituição do Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixo Carbono (PHBC) visando incluir o produto na matriz energética brasileira, com o aproveitamento racional da infraestrutura existente e o apoio à pesquisa, mesmo o Brasil já sendo detentor de 80% de sua matriz energética obtida de fontes renováveis. Mas, o país que ser o líder mundial e isolado da produção de energia limpa, o que resultará em bilhões, a favor de todos os brasileiros, no resultado da balança comercial.

Fonte de energia e considerado “o combustível do futuro”, o hidrogênio é obtido de múltiplas fontes, tem várias aplicações no setor produtivo e é estratégico nos esforços de redução das emissões de gases poluentes em tempos de mudanças climáticas.

Incentivos

Outra novidade proposta é o Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixo Carbono, batizado de Rehidro. Segundo Bacelar, os incentivos serão proporcionais à quantidade de emissões evitadas, envolve desonerações com despesas de capital (Capex) e operacionais (Opex) e poderão ser usados por empresas e zonas de processamento de exportação (ZPEs).

Ao apresentar o relatório, Bacelar explica que o Rehidro traz cinco pilares de incentivos:

• desoneração de Capex para produtores de hidrogênio e atividades acessórias, inclusive geração de energia elétrica;
• desoneração de Opex para produtoras de hidrogênio;
• desoneração da Cide-Remessas;
• incentivos de Imposto de Renda e Contribuição sobre Lucro Líquido; e
emissão de debêntures incentivadas.

Governança

A governança do setor ficará a cargo da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). As autorizações de produção já existentes serão mantidas. E como o setor é alvo de constante avanço tecnológico, Bacelar sugere a adoção do chamado sandbox.

“Trata-se de um mecanismo que possibilita a flexibilidade regulatória diante de novos arranjos produtivos e inovações que vão surgindo. Para que isso não demande todo um processo altamente burocrático, a gente flexibiliza essas situações no sandbox”, explicou.

Certificação do hidrogênio

Várias ações estão atreladas a instrumentos do Programa Nacional de Hidrogênio (PNH2), que já existe no âmbito do Executivo. O comitê gestor desse programa terá, por exemplo, a competência adicional de definir as diretrizes de certificação do hidrogênio de baixo carbono, com participação de representantes do setor produtivo, da comunidade científica e dos estados.

As certificadoras serão credenciadas pela ANP, que deverá exigir transparência na emissão dos certificados de produção de baixo carbono.

A proposta de Bacelar ainda inclui a produção do hidrogênio na lista de prioridades para outorga do uso da água, como já acontece nos casos de água para consumo humano e para matar a sede (dessedentação) dos animais. Porém, proíbe a outorga em regiões com conflito em torno do uso de água.

Repercussão

O relatório preliminar foi divulgado ao final de uma audiência pública em que especialistas apontaram a relevância de um marco legal para acabar com a insegurança jurídica e o atraso nos investimentos em hidrogênio no Brasil.

A advogada Maria Fernanda Soares, especializada na análise jurídica do tema para a iniciativa privada, elogiou o texto de Bacelar. “A parte dos incentivos soa quase como música para os ouvidos dos investidores. Realmente reuniu tudo o que tem de melhor em termos de incentivos em todos os aspectos”, elogiou.

A diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Agnes da Costa, também apontou avanços para a viabilização da transição energética. “A gente vem falando bastante de hidrogênio nos últimos dois ou três anos e, quando vê uma proposta como essa, endereçando várias preocupações recorrentes, vê-se que a gente está progredindo rapidamente nessa temática”, comentou.

Urgência

O presidente da comissão, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), prepara o próximo passo.  Vai aguardar a sugestão de ajustes no texto até o dia 23 para colocá-lo em votação no dia seguinte.

O tema também é analisado no Senado e faz parte de vários outros projetos de lei da Câmara. O deputado Danilo Forte (União-CE) anunciou a intenção de pedir urgência na análise dessas propostas a fim de que Câmara e Senado concluam a votação do marco legal da produção e uso do hidrogênio de baixo carbono ainda neste ano.

Entenda o que é o combustível do futuro

O hidrogênio como combustível é visto como peça importante para o futuro neutro em carbono com o objetivo de reduzir as emissões de CO² na atmosfera — principal causa das mudanças climáticas sentidas por todos os habitantes do planeta. Mas sua transformação de gás em combustível demanda uma grande quantidade de energia. Portanto, é importante prestar atenção na fonte dessa energia para que o produto final seja o chamado hidrogênio verde. Entenda melhor o processo de produção dos tipos de hidrogênio e as possíveis “cores” do combustível.

O hidrogênio é largamente utilizado no mundo para produzir energia e pode ser obtido de variadas fontes. Costuma-se usar cores para definir essa procedência:

• hidrogênio cinza ou marrom, vindo da queima de combustíveis fósseis, altamente poluentes;
• hidrogênio azul, obtido por técnicas de captura de carbono; e
• hidrogênio verde ou sustentável, gerado por fontes renováveis de energia.

Como é a produção do hidrogênio combustível?

Elemento mais abundante no universo, uma das formas de produzi-lo é por meio de um processo térmico. Neste caso, geralmente, o vapor reage com um combustível do tipo hidrocarboneto, produzindo hidrogênio. Os combustíveis que podem ser usados são vários, e vão do diesel a gás natural e biogás, por exemplo. Neste tipo de geração, há emissões de carbono. Segundo o Escritório de Eficiência Energética e Energia Renovável, 95% de todo o hidrogênio produzido vêm do gás natural.

O que é uma célula de combustível?

Para ser usado para impulsionar motores, o hidrogênio precisa passar por uma célula de combustível. Na célula, o processo é o inverso do que acontece na eletrólise que produz o hidrogênio.Assim como na eletrólise, há dois eletrodos, um positivo e um negativo. Este é alimentado pelo hidrogênio, enquanto o positivo recebe ar. No negativo, uma substância separa as moléculas de hidrogênio em prótons e elétrons. Enquanto os elétrons saem do eletrodo e geram um fluxo de eletricidade, os prótons vão em direção ao eletrodo com ar. Lá, esses prótons se misturam com o oxigênio e, no caminho contrário ao da eletrólise, geram água e calor. É assim que este tipo de combustível gera energia sem combustão e produzindo apenas vapor de água.A células de combustível podem ter vários usos, de transporte a sistema de backup de fornecimento de energia. Entre seus usos estão ainda alimentar prédios e até um submarino ou um supercargueiro transoceoânico, motocicletas, veículos, tratores, ônibus ou trens.

O que é o hidrogênio verde?

O hidrogênio enquanto combustível pode ser de diferentes “cores”. Estas o classificam conforme a fonte de energia usada para produzir o hidrogênio combustível. Há o hidrogênio cinza, produzido a partir de combustíveis fósseis. Quando essa produção vem de gás natural e há captura e armazenamento de carbono, temos o hidrogênio azul.Já o hidrogênio verde é aquele feito a partir da eletrólise. Porém a energia inicial para a realização deste processo precisa vir de fontes renováveis para que o combustível se enquadre nesta categoria. Assim, sua produção se dá sem a emissão de carbono. É por isso especialistas veem este tipo de combustível como chave para um mundo neutro em carbono.Já há quem aponte o hidrogênio verde como uma possível commodity, e o Brasil, como um potencial exportador dela. O Chile, por exemplo, está tentando se tornar uma potência nesta área.

Onde é possível usar hidrogênio?

Embora o uso mais conhecido do hidrogênio provavelmente sejam os carros, há muitos outros possíveis. Células de combustível podem servir de unidades fixas de geração de energia para prédios. Em alguns casos, elas podem fornecer também calor, explica o site Hydrogen Europe.Ainda conforme o site, as células de combustível são vistas como potencial fontes de energia para aeronaves. É possível, por exemplo, usá-las como sistema de gerador de emergência. Além disso, podem servir de unidade auxiliar de energia para o avião como um todo.No mar também há espaço para o hidrogênio como combustível. A ideia é que o hidrogênio forneça a energia para a propulsão da embarcação. Mas este uso ainda está em estágio inicial de testes e desenvolvimento. Contudo, seu uso como fonte de energia a bordo já está mais avançado.Há até um projeto norueguês que pretende criar um navio de cruzeiro movido a hidrogênio. A meta é que ele esteja pronto no final de 2023, embora ainda não haja células para tal escala, segundo o Hydrogen Europe. Também é possível que o hidrogênio alimente veículos de serviço como empilhadeiras e caminhões, além de ônibus e trens.

A comissão

Criada a pedido do deputado Bacelar e instalada no final de maio, a comissão tem por objetivo acompanhar a implementação das medidas que estão sendo adotadas para a transição da energia verde no Brasil.O relator já apresentou seu parecer preliminar na semana passada, em que propõe a criação de um marco legal para o setor. O texto ainda deve sofrer ajustes e será votado no próximo dia 24 de outubro.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.