Brasília – Em audiência pública na Comissão de Meio Ambiente da Câmara, na sexta-feira, (8), membros do colegiado e convidados apontaram um descompasso entre o discurso do governo em fóruns internacionais e as políticas ambientais efetivamente praticadas no Brasil. A reunião ocorre há menos de um mês da abertura da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP-26), em Glasgow. O consenso é que a delegação brasileira leve ao encontro internacional propostas mais ambiciosas para a Convenção do Clima.
A cúpula do clima acontece de 31 de outubro a 12 de novembro e tem como principal objetivo a implementação do chamado Acordo de Paris, que prevê compromissos com a redução na emissão de gases do efeito estufa, um esforço internacional para conter o aquecimento global. Cientistas renomados alertaram em vários relatórios que a “janela para isso” está cada vez maior e o planeta pode atingir um ponto sem volta antes do que era previsto com consequências catastróficas para todo o mundo.
O foco da audiência pública foi a Contribuição Nacionalmente Determinada, conhecida como NDC, instrumento pelo qual cada país oficializa seus compromissos para minimizar as consequências das mudanças climáticas.
Paulino de Carvalho Neto, (Secretário de Assuntos de Soberania Nacional e Cidadania) do Ministério das Relações Exteriores, lembrou a pequena contribuição dos países em desenvolvimento na emissão de gases e classificou a NDC brasileira como ambiciosa.
Com base nos números de 2005, as metas são de reduzir as emissões em 37% até 2025 e em 43% até 2030, além de antecipar, de 2060 para 2050, a chamada “neutralidade climática”. O representante do Itamaraty também chamou a atenção para a demanda por investimentos externos.
“No nosso entendimento, a reunião de Glasgow só será exitosa se nós levarmos em conta as necessidades dos países em desenvolvimento e elas se concentram muito na questão do financiamento climático. Nós precisamos todos, todas as partes da convenção, aumentar o montante e a previsibilidade dos recursos financeiros para alcançar o compromisso que foi assumido pelos países desenvolvidos lá em 2009, de termos no mínimo US$ 100 bilhões para fins de utilização de recursos, seja para a adaptação, seja para a mitigação”, advertiu.
Para os outros debatedores, no entanto, a NDC brasileira deveria ser revista antes da conferência do clima, para ampliar as metas. Um dos pontos ressaltados foi o controle do desmatamento, como salientou Ane Alencar, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.
“O Brasil, ele deveria levar pra COP uma pauta forte de desmatamento. O mundo espera isso do Brasil. E não só combater o desmatamento ilegal, que é fundamental zerar o desmatamento ilegal, mas também a redução do desmatamento legal através de incentivos”, sugeriu.
Rodrigo Sauaia, presidente-executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), deu o exemplo de um objetivo que poderia ser maior: o de que, até 2030, fontes renováveis não hídricas atendam a 23% da demanda de eletricidade do país.
“Por que o Brasil, que já tem hoje 83% da sua energia elétrica proveniente de fontes renováveis quando somamos as hidrelétricas, por que nós não podemos planejar, nos estruturar para uma meta de atingir 100% renováveis ou 100% energia limpa como outras grandes potências mundiais já estão se comprometendo?”, provocou.
Para o deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP), um dos parlamentares que pediu a realização da audiência pública, há uma distância entre o discurso do governo brasileiro em reuniões, como a convocada pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em setembro, e projetos enviados ao Congresso sobre regularização fundiária e licenciamento ambiental. Ele fez um questionamento.
“Se isso não é uma contradição entre o que o presidente falou naquela cúpula, falou na Convenção Geral da Organização das Nações Unidas sobre a disposição do Brasil de promover a preservação ambiental, se isso não vai ferir o discurso do Brasil”.
Outras sugestões da sociedade civil para serem levadas à Conferência do Clima foram a restauração da Mata Atlântica e a inclusão dos Direitos Humanos nas discussões ambientais.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.