Um conjunto de fatores negativos ajuda a explicar porque persiste no Brasil uma oferta mínima de voos e o alto custo oferecido àqueles que desejam comprar uma passagem aérea com destino aos estados do Norte e Nordeste do Brasil. O tema foi a pauta da audiência pública promovida nesta terça-feira (3), pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.
O ministro do Turismo, Celso Sabino, disse aos deputados que a grande quantidade de ações judiciais de consumidores contra as empresas aéreas é apenas um dos problemas para a entrada e manutenção de novas empresas no país. A audiência debateu o aumento de 24% das passagens nos últimos quatro anos, que também seria causada pela baixa oferta interna.
O ministro elencou a fragilidade no sistema do turismo nacional quando os destinos são estados da região Norte e Nordeste, as mais pobres do país, contrastando com suas riquezas naturais sem concorrência no mundo.
Sabino citou o exemplo da companhia aérea norte-americana Delta que, segundo ele, tem 2% de suas operações no país; mas responde aqui por mais de 50% das demandas judiciais da empresa. No caso da Latam, também estrangeira, quase todas as ações judiciais são no Brasil, de acordo com o ministro, embora a empresa tenha apenas 35% das suas operações no país.
O ministro também pediu aos parlamentares que não permitam que a reforma tributária aumente a carga das empresas. E solicitou então alguma flexibilização nas normas de defesa do consumidor, além do uso do Fundo Nacional de Aviação Civil para garantir a compra de motores e aviões por parte das empresas aéreas:
“Não quero criticar o CDC (Códifo de defesa do Consumidor), mas eu acho que é um absurdo você ter mais de 50% dessas ações judiciais promovidas por uma entidade que fica em São Paulo. Ela deve ficar monitorando todos os atrasos de voos para buscar fazer disso um mercado, um comércio. Aproveitando da fragilidade dos consumidores que precisam realmente recorrer ao CDC”, criticou.
Jurema Monteiro, presidente da Associação das Empresas Aéreas, acrescentou à lista de Sabino o custo do querosene de aviação. Ela disse que a Petrobras produz 90% do querosene utilizado, mas o custo é o dobro do cobrado nos Estados Unidos. Sobre o aumento de 24% nas passagens, ela afirmou que o setor sofreu com a pandemia e com o aumento de custos em dólar.
De acordo com Adriano Miranda, da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), a tarifa média no primeiro semestre foi de R$ 574,13 com 57% dos assentos vendidos por, no máximo, R$ 500. Segundo ele, isso ocorre porque a maioria das pessoas compra com antecedência a preços mais baixos. Miranda reconheceu, porém, que houve uma redução na oferta de voos do Norte para o restante do país, como alguns deputados afirmaram na audiência.
O deputado Jorge Solla (PT-BA) disse que há muito tempo não consegue comprar passagens para a Bahia por menos de R$ 1.000. E explicou que recorreu à Justiça por causa de cancelamentos de voos acompanhados de mau atendimento:
“Entrei na Justiça três vezes, uma já ganhei e duas estão tramitando. E toda vez que eu tiver um voo cancelado e não tiver o devido tratamento por parte da companhia, eu entrarei na Justiça. O que é o devido tratamento? Não estou pedindo nada demais não. A companhia deveria chamar os passageiros, explicar o que aconteceu. Justificar. Fazer a transferência do passageiro para outro voo, buscar acomodar… Mas não. A última situação que eu tive foi um negócio vexatório”, relatou.
Foram muitas as queixas apresentadas ao longo da audiência. Os deputados Dorinaldo Malafaia e Josenildo, ambos do PDT do Amapá, questionaram os preços das passagens em sua região e o serviço prestado aos passageiros. Malafaia lembrou que as empresas aéreas conseguiram isenção de PIS e Cofins a partir deste ano até 2026 e nada do preço cair.
Rafael Pereira, do Ministério de Portos e Aeroportos, disse que o programa federal para compra de passagens de até R$ 200 ainda deve demorar alguns meses para ser lançado. Segundo ele, a ideia é atender a um público que não viaja de avião normalmente, principalmente aposentados que ganham até R$ 2.640.
O ministro Celso Sabino disse que o ministério e a Anac, estão buscando novas empresas estrangeiras para atuar no Brasil, mais recentemente tiveram reuniões com representantes da Arábia Saudita. O governo também estaria solicitando às empresas que façam promoções que permitam ao turista estrangeiro conhecer dois destinos brasileiros pelo preço de um. Ele ainda anunciou que será realizado o Salão Nacional do Turismo entre 15 e 17 de dezembro em Brasília.
O deputado Keniston Braga (MDB-PA) também reclamou: ‘’A região Norte é uma das que mais sofre com aeronaves sucateadas, voos com horários ruins e preços absurdos. Como representante do povo no Congresso, não concordo com várias ações das companhias aéreas, que estão prejudicando não apenas os paraenses, mas todos os brasileiros”.
“Na audiência pública, com o ministro do Turismo, Celso Sabino, e os técnicos do Ministério de Portos e Aeroportos, ficou claro o atraso para o crescimento econômico e para o desenvolvimento do turismo doméstico causado pelos preços exorbitantes das passagens aéreas. Já é hora de construirmos soluções que garantam um transporte aéreo justo para as companhias e principalmente para o povo!’’, defendeu o deputado paraense.
O autor do requerimento para a realização da audiência, deputado Josenildo (PDT-AP), citou estudo da Anac que registrou, no primeiro trimestre deste ano, o maior preço médio para o período das passagens aéreas em mais de uma década.
‘’A combinação de tarifas mais altas e opções reduzidas de voos limita o acesso ao serviço de transporte aéreo e deixa de fora do mercado um conjunto de consumidores’’, conclui o deputado.
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.