Brasília – A comissão externa da Câmara dos Deputados sobre queimadas nos biomas brasileiros decidiu ampliar o foco dos trabalhos do colegiado em 2021: além da Amazônia e do Cerrado, será incluído o Pantanal sob olhar atento como centros de atenção especial em 2021. As evidências de mudanças climáticas, eventos extremos e ações humanas danosas ao meio ambiente ampliaram o foco dos parlamentares que, em 2020, se concentraram na devastação do Pantanal. A coordenadora da comissão, deputada Professora Rosa Neide (PT-MT), manifesta preocupação com o crescente e descontrolado desmatamento da Amazônia e do Cerrado, registrados em dados oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
“O INPE vem mostrando o aumento dos focos de calor em toda Amazônia e sabemos que o equilíbrio do clima no mundo depende da área amazônica. Vamos trabalhar muito para que os sinais invertidos emitidos pelo governo federal não continuem gerando polêmica. A Amazônia será sempre a nossa preocupação. E estaremos debruçados sobre o que vai causar, no Pantanal, a continuidade da crise hídrica. Nos debruçaremos também sobre o bioma Cerrado”.
O monitoramento oficial do Instituto, feito pelo sistema de satélite Prodes, mede o desmatamento desde agosto até julho do ano seguinte. Em 2020, houve alta de 34% na devastação amazônica (perda de 10,1 mil km2) e de 13% no Cerrado (7,3 mil km2).
Um dos mais renomados cientistas brasileiros, o climatologista Carlos Nobre concorda com a ampliação de foco da comissão da Câmara. Nobre lembra que, historicamente, a Mata Atlântica é o bioma mais devastado do país, restando apenas cerca de 20% da cobertura vegetal original nas áreas litorâneas do país. Mas, quando se fala da devastação mais contundente nos últimos 50 anos, Cerrado e Amazônia têm destaque negativo, segundo ele.
“Já desmatamos pouco acima de 50% do Cerrado. E 20% da Amazônia foram desmatados completamente. Isso foi muito em função do modelo desenvolvimentista que o governo militar do Brasil adotou no fim dos anos 60 e nos anos 70. Era um modelo que não enxergava qualquer valor na nossa imensa biodiversidade. Era um modelo que via a floresta como obstáculo ao desenvolvimento,” disse o estudioso.
Já em relação a 2020, o Pantanal foi, disparadamente, o bioma brasileiro mais castigado por queimadas e efeitos concretos das mudanças climáticas, sobretudo no segundo semestre. Só em setembro, a maior planície inundável do mundo perdeu 33 mil km² de vegetação, além de danos incontáveis à fauna pantaneira. A Polícia Federal investiga denúncias de incêndios propositais, criminosos. Após ouvir universidades (UFMT e UFMS), órgãos públicos de pesquisa e controle (Embrapa, ANA etc), agricultores e comunidades tradicionais pantaneiras, a comissão da Câmara apresentou um relatório de 300 páginas em busca de soluções.
No âmbito legislativo, a deputada Professora Rosa Neide destaca propostas de proteção ao bioma (PL 9950/2018), à fauna pantaneira (PL 4670/2020) e de auxílio financeiro emergencial à população atingida pelas queimadas (PL 5009/2020).
“Com a votação [desses projetos de lei], com certeza, teremos uma estrutura legal que permitirá melhor aproveitamento do que se tem hoje no Pantanal. O que se quer para o Pantanal é que ele continue lindo e maravilhoso, com as pessoas vivendo lá e economicamente sustentável,” propõe a parlamentar mato-grossense.
O climatologista Carlos Nobre cobra urgência no cumprimento de leis e de fiscalização que ajudem a preservar os biomas brasileiros diante de eventos climáticos cada vez mais intensos e frequentes.
“Temos que reconhecer que as mudanças climáticas tornam o risco de fogo nos biomas brasileiros muito maior do que era no passado. Nós temos que agir com muita rapidez para adaptar o marco legal e exigir muito mais efetividade no cumprimento da lei. Praticamente, todas as queimadas são ilegais. A fiscalização deve ser mais efetiva e eficaz, o que não tem acontecido no Brasil,” alerta.
A comissão externa da Câmara sobre queimadas nos biomas brasileiros iniciou os trabalhos em setembro de 2020, no auge da devastação no Pantanal.
Por Val-André Mutran – de Brasília