Brasília – Em longa sessão conjunta na segunda-feira (27), realizada em três etapas, deputados e senadores derrubaram vetos presidenciais que vão elevar despesas públicas e até ampliar a reforma eleitoral concluída na última semana. Foram mantidos alguns vetos do presidente Jair Bolsonaro, mas impuseram mais rejeições. O resultado final é que os congressistas desde já, terão responsabilidades se a crise econômica ficar ainda mais aguda.
A votação mais aguardada pelos próprios parlamentares era a que se iniciou no Senado para discutir a derrubada do veto integral de Bolsonaro a um projeto de lei que cria a federação partidária e amplia a reforma eleitoral. O presidente da sessão do Congresso, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), chegou a comentar que foi a sessão com o maior quórum entre os vetos votados na Casa.
Em linhas gerais, a federação partidária prevê que duas ou mais legendas se unam durante o período eleitoral e mantenham a parceria por no mínimo quatro anos. Com isso, as siglas parceiras passam a ser tratadas como uma só. Precisam, por exemplo, estar juntas na disputa presidencial, em todas as candidaturas estaduais e também nas atuações na Câmara dos Deputados e no Senado, ou seja, a orientação da liderança do bloco sobre como os partidos devem votar uma matéria têm que ser seguida por todos os partidos que porventura sejam membros da federação. O modelo é comum nos parlamentos do bloco europeu.
Sem as coligações em eleições proporcionais, rejeitada na última semana pelo Senado, a federação partidária se tornou a esperança sobretudo dos partidos pequenos em viabilizar sua sobrevivência. A derrubada do veto que cria a federação partidária foi aprovada por 45 a 25 votos no Senado e 353 a 110 votos na Câmara. Bolsonaro havia vetado sob a justificativa de que as novas regras inaugurariam um formato com características semelhantes das coligações partidárias, mas a justificativa não convenceu os congressistas que defenderam seus próprios interesses políticos.
Outros vetos serão votados na quinta-feira (30). A exemplo dos trechos rejeitados por Bolsonaro à lei que estabelece a quebra temporária de patentes de vacinas e insumos em períodos de emergência de saúde nacional ou internacional. Se derrubados, obrigarão o proprietário da patente a efetuar a transferência de conhecimento e a fornecer os insumos de medicamentos e vacinas.
Outros vetos derrubados pelo Congresso
Outros vetos foram derrubados pelo Congresso na sessão conjunta da segunda. Um dos mais polêmicos é o que restabelece a proibição de despejos e desocupações por ações decorrentes do não pagamento de aluguéis de imóveis urbanos comerciais, de até R$ 1,2 mil, e residenciais, de até R$ 600.
Outro veto de Bolsonaro rejeitado mantém a antecipação de pagamentos de contribuições fixas estabelecidas nos contratos de outorga em contratos de concessões aeroportuárias. Bolsonaro havia vetado um trecho de uma Medida Provisória (MP) que permitia esse pagamento antecipado à União feito com a aplicação de desconto usado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
O dispositivo foi incluído pelo Congresso a pedido do próprio governo, que voltou atrás. De acordo com o governo, a proposta contraria “interesse público pois reduziria as receitas da União nos exercícios seguintes — devido à redução do valor presente líquido das outorgas — e a previsibilidade das receitas, o que impactaria não apenas a programação financeira anual.”
O Senado manteve decisão da Câmara e rejeitou o veto do presidente Jair Bolsonaro a trecho vetado que integrava a MP que prorrogou medidas para ajuda ao setor aéreo na pandemia (MP 1024/2020). Com a rejeição, o texto será incorporado à Lei 14.034, de 2021, que trata do assunto. A matéria irá à promulgação.
Outros vetos derrubados permitirão incentivos para que os clubes de futebol se transformem em empresas na forma de Sociedade Anônima do Futebol (SAF) e, dessa forma, passem a receber recursos financeiros de pessoas físicas, empresas e fundos de investimento.
Entre eles está o restabelecimento do Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF) para os clubes-empresas. O veto derrubado prevê a alíquota única de 5% englobando as contribuições ao INSS, ao IRPJ, ao PIS/Pasep, à CSLL e à Cofins. O governo havia vetado sob a alegação de que viola a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LOA).
Outros vetos derrubados elevam os gastos públicos
Outros vetos que elevam as despesas públicas foram aprovados pelo Congresso. Um deles impedia a inclusão de 84 municípios de Minas Gerais e Espírito Santo na abrangência da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Bolsonaro alegou que a iniciativa criaria aumento de despesas e queda de receitas ao ampliar a Sudene sem apresentar estimativa de impacto orçamentário ou compatibilidade com teto de gastos. Municípios na área do órgão recebem benefícios tributários.
Outro veto de Bolsonaro impedia a destinação de recursos às escolas e redes de educação básica para a contratação de serviço de acesso à internet e compra de equipamentos eletrônicos. Bolsonaro vetou o repasse direto às escolas, alegando que isso fere LRF, mas foi derrubado pelo Congresso.
Um terceiro veto de Bolsonaro impedia pelo menos 70% de repasses previstos em parcerias federais com o terceiro setor, ou seja, Organizações Não-Governamentais (ONGs) e entidades filantrópicas. O governo alegou que a matéria criaria despesa obrigatória sem apresentar a estimativa do impacto orçamentário e financeiro, mas também foi derrubado.
Um quarto veto vai aumentar benefícios fiscais das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs), com redução de alíquotas de PIS/Pasep e Cofins de serviços vinculados à industrialização de mercadorias exportadas. Bolsonaro vetou sob alegação de risco de desequilíbrio nas contas públicas, particularmente em razão do impacto orçamentário e financeiro.
Outro veto derrubado vai conceder renúncia fiscal a plataformas de streaming e os isentar de pagar a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine). Por orientação do Ministério da Economia, Bolsonaro rejeitou a redação anteriormente aprovada no Congresso.
Vetos de Bolsonaro mantidos pelo Congresso
Alguns vetos foram mantidos por acordo entre governo e lideranças partidárias. Um deles manteve a impossibilidade de empresas e pessoas físicas deduzirem do Imposto de Renda valores investidos na contratação de leitos para uso do Sistema Único de Saúde (SUS).
O veto foi feito por Bolsonaro ao sancionar, em abril, o Programa Pró-Leitos, que prevê incentivos a empresas que usarem recursos próprios na contratação de leitos clínicos e de terapia intensiva da rede privada de saúde para uso do SUS. Outro veto mantido evita o aumento do prazo de isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na compra de automóveis por pessoas com deficiência.
Outro veto isenta o governo de regulamentar em 180 dias o pagamento proporcional de pedágios em rodovias pela quilometragem percorrida. Outro veto mantido impede a prorrogação do prazo para a apresentação da declaração do Imposto de Renda (IR) deste ano.
Outro veto mantido diz respeito à lei que amplia de quatro para 10 anos o prazo registro de terras devolutas em fronteira e que determinava que a administração pública resolvesse questionamentos administrativos relativos a pequenas e médias propriedades localizados em faixas de fronteira em até 180 dias.
Outra manutenção de veto dispõe sobre a medidas para facilitar a abertura de empresas e alteravam atribuições do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Vetos que foram mantidos, mas tiveram trechos derrubados
Alguns vetos foram derrubados, mas tiveram trechos mantidos no acordo entre lideranças partidárias e o governo. Um deles reduz alíquotas do Condecine, a despeito da isenção tributária que será concedida a plataformas de streaming.
Outros trechos mantidos por acordo não serão reincorporados à Lei do Clube-Empresa. O Congresso manteve o veto presidencial à exigência de que fundos de investimentos informem às Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) os nomes dos cotistas que sejam titulares de cotas correspondentes a 10% ou mais do patrimônio.
Também foi mantido o veto à exigência de que as SAFs prestem informações sobre a sua composição acionária, com indicação do nome, da quantidade de ações e do percentual detido por cada acionista. Outro veto mantido impede que as SAFs emitam, além da debênture prevista, qualquer outro título com a regulação dos clubes pela CVM.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.