Brasília – Na reta final do ano legislativo, sessão conjunta do Congresso Nacional impôs, nesta quinta-feira (14), duas duras derrotas ao governo, que após o primeiro ano de governo ainda não conseguiu estabelecer uma base confiável para aprovar a sua agenda. A derrubada dos vetos presidenciais ao Marco Temporal de Terras Indígenas e à prorrogação da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia são exemplos de que há algo que não funciona na articulação política do governo.
Segurança reforçada
Com segurança reforçada, o efetivo da Polícia Legislativa da Câmara e do Senado ampliou o monitoramento do Palácio do Congresso. Não foi permitida a circulação de pessoas sem credenciais pelos corredores. Os adesivos entregues aos visitantes não deram acesso aos Salões Verde (Câmara) e Azul (Senado).
No lado de fora do prédio, a ministra Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, participou da manifestação contra a derrubada dos vetos.
O veto ao Marco Temporal de Terras Indígenas foi derrubado por 374 a 156; também houve uma abstenção. Críticos do texto avaliam que, ao definir uma data para demarcação, indígenas perderiam terrenos aos quais teriam direito. Já os apoiadores dizem que a ideia traria segurança jurídica.
No Pará, no entendimento de deputados e senadores que votaram a favor da derrubada do veto, “a situação está sem controle”. São 40 pedidos protocolados em andamento no governo para a criação de novas reservas indígenas.
Desoneração da Folha de Pagamentos de 17 Setores da Economia
O veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei que prorroga até 2027 a desoneração da folha de pagamento dos 17 setores da economia que mais empregam no país também foi derrubado, em votações separadas de senadores e deputados.
No Senado, foram 60 votos pela derrubada do veto e 13 pela manutenção. Na Câmara, foram 378 votos pela derrubada e 78 pela manutenção.
Entidades empresariais e sindicatos ressaltam que a desoneração é importante para a geração e manutenção de emprego e renda. O texto foi aprovado pelo Congresso em outubro e vetado em novembro. A desoneração perderia validade em dezembro se não fosse prorrogada.
A proposta substituiu a contribuição previdenciária patronal de empresas de setores que são grandes empregadores, de 20%, por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta.
Essa troca diminui custos com contratações para 17 setores, como têxtil, calçados, construção civil, call center, comunicação, fabricação de veículos, tecnologia e transportes. Os segmentos são responsáveis por gerar cerca de 9 milhões de empregos formais.
Havia um questionamento sobre a constitucionalidade do projeto. “É constitucional”, ressaltaram vários congressistas durante a discussão do veto. Pareceres da Câmara e do Senado já atestaram o mesmo, assim como o Supremo Tribunal Federal (STF), em um voto de 2021 do então ministro Ricardo Lewandowski. O entendimento é de que a desoneração se trata da prorrogação de uma medida já em vigor e não um novo benefício.
Estudo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostra que, de 2018 a 2022, os setores que permaneceram com a folha desonerada tiveram crescimento de empregos de 15,5%, enquanto os que tiveram a folha reonerada cresceram apenas 6,8% no período. Houve também aumento dos salários dos trabalhadores de áreas que contaram com o benefício.
Durante a tramitação do projeto, foi inserida a redução de alíquotas (de 20% para 8%) na contribuição previdenciária para municípios com menos de 156 mil habitantes. A prorrogação da desoneração foi aprovada por ampla maioria. Na Câmara, foram 430 votos a favor e apenas 17 contra. No Senado, a votação foi simbólica.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vinha insistindo para retirar a análise do veto da pauta, com o argumento de que apresentará uma proposta alternativa à desoneração após a aprovação da Reforma Tributária. Os deputados e senadores, porém, afirmam a importância de derrubar o veto agora e discutir uma eventual proposta da Fazenda depois.
Não estava explícito, mas Haddad queria evitar o impacto de R$ 20 bilhões na arrecadação do governo com a medida.
Mais cedo, antes da votação, o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a prorrogação da desoneração e disse que poderia ouvir a proposta do governo com o veto derrubado. Ele reforçou que a medida gera resultado no país e gera empregos.
“Há 17 setores que se programaram, que estão mantendo empregos, que tem muitas pessoas trabalhando e que podem perder seus empregos se não houver essa prorrogação,” disse.
Durante a sessão, o senador Efraim Filho (União-PB), autor do projeto, afirmou que a derrubada do veto é necessária para dar tranquilidade aos trabalhadores.
“Essa derrubada trará segurança jurídica para quem empreende e paz de espírito para quem trabalha. A média salarial já aumentou entre as empresas desoneradas. O projeto do governo será apreciado em momento oportuno,” garantiu.
Por Val-André Mutran – de Brasília