A partir desta segunda-feira (17), os 513 deputados federais e 81 senadores, entram em “recesso branco”, mesmo contrariando a letra constitucional. Os congressistas só voltam ao trabalho no 1º de agosto. De acordo com a Constituição, o Congresso Nacional só poderá entrar em recesso, previsto para o período de 18 a 31 de julho, se aprovar o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLN nº 4/2023) até o dia 17 de julho, caso contrário, o recesso é suspenso e congressistas têm que continuar o trabalho normalmente no mês de julho, mas não foi o que aconteceu.
A LDO (PLN nº 4/2023) é uma diretriz para a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2014. Também define as prioridades da administração pública federal e estabelece a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.
Instalada em 11 de abril deste ano, a CMO – Comissão Mista do Orçamento (confira a composição) é presidida pela senadora Daniela Ribeiro (PSD-PB) e relatada pelo deputado federal Danilo Forte (União/CE). Da bancada do Pará, apenas a deputada federal Dilvandra Faro (PT-PA), tem assento na CMO, na condição de titular, assim como, o seu marido, senador Beto Faro (PT-PA).
Demissão por justa causa
Se numa empresa privada, o conjunto dos funcionários não entregasse a sua principal tarefa, todos seriam demitidos por justa causa pela direção. Entretanto, a certeza da impunidade dos 594 congressistas os faz agir normalizando uma irregularidade, como se fosse permitido que eventualmente o Congresso faça o recesso do meio do ano sem a votação da matéria. Na prática, basta apenas os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados não marcarem sessões durante o período. Mas, a lei é clara: o recesso é suspenso até que se vote a LDO 2024.
A confusão de não votar a LDO foi criada pelos próprios congressistas, e é fruto de uma sucessão de disputas ocorridas desde o início da 57ª Legislatura. Ocorre que o contribuinte brasileiro não tem como demitir seus políticos, exceto na ocasião das eleições, ficando, portanto, mais essa conta a ser paga, os salários bilionários e regalias inacreditáveis que deputados e senadores usufruem nos cargos mesmo não cumprindo com suas obrigações básicas.
Disputa como desculpa esfarrapada
A queda de braço entre situação e oposição gerou um efeito dominó. O principal motivo é a não-conclusão da aprovação do arcabouço fiscal, que substituirá o teto de gastos como regra de contenção de despesas da União.
A avaliação dos ministros da área econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva é de que sem o novo marco fiscal, não é possível votar a LDO, pois o primeiro definirá as bases para o segundo. O entendimento é reforçado pelo relator da LDO, o deputado Danilo Fortes.
O arcabouço fiscal já foi aprovado pelas duas Casas do Legislativo, mas terá de passar por nova análise pela Câmara, por ter passado por alterações no Senado. No início de agosto, os deputados devem votar a matéria é definir se acatam ou não os pontos inseridos pelos senadores.
A pausa vem após uma semana de esforço concentrado na Câmara, com sessões de segunda (3) a sexta-feira (7), em que os deputados aprovaram a reforma tributária e o projeto que beneficia o governo em votações do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).
Já na semana, que ainda seria de atividade legislativa, a Casa não realizou sessões plenárias, enquanto o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) tira folga em um cruzeiro do cantor Wesley Safadão, nas Bahamas, estabelecendo, com a anuência do colega, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado e do Congresso, a inédita duas semanas “extraoficiais”.
A peça orçamentária do governo Lula (PT) ficará para votação apenas no segundo semestre. De 17 de julho até 1° de agosto, os plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal não votarão mais nenhum projeto relevante.
Nesse período, a maior parte dos congressistas também estará fora de Brasília, mas seguirá recebendo o salário mensal bruto de R$ 41.650.
Impasse da LDO
Um dos pontos do projeto do novo marco fiscal enviado ao Legislativo permite que o orçamento do próximo ano tenha despesas primárias em valor superior ao teto de gastos, condicionadas à aprovação do novo arcabouço fiscal no Congresso Nacional.
De acordo com o texto, as despesas condicionadas à aprovação da nova regra fiscal totalizarão R$ 172 bilhões em 2024. “Essa autorização viabilizará a recomposição e a execução das políticas públicas prioritárias para o país, o funcionamento da máquina e o investimento da União”, detalhou o Ministério do Planejamento e Orçamento.
Um impasse que resultou no atraso da votação da LDO diz respeito sobre possível redução na capacidade de gastos públicos em função de mudanças no texto do novo marco fiscal. A matéria foi aprovada pela Câmara e sofreu mudanças, agora, volta novamente ao exame dos deputados.
O governo busca evitar um corte de cerca de R$ 40 bilhões no orçamento de 2024, o primeiro a ser elaborado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — o orçamento de 2023 foi feito pela gestão anterior, de Jair Bolsonaro (PL).
O relator do texto na Câmara, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), alterou diversos pontos do projeto original enviado pelo Poder Executivo, entre eles o período da inflação que será considerado para corrigir as despesas federais.
O substitutivo de Cajado aprovado pelos deputados passou a considerar a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial do país, em 12 meses até junho, e não mais a projeção para todo o ano.
Como o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) é enviado ao Congresso em agosto de todos os anos, o texto diz que ele conterá a inflação acumulada e apurada de julho do ano anterior a junho do ano de tramitação do projeto.
Segundo a ministra do Planejamento e Gestão, Simone Tebet, a mudança feita pela Câmara pode gerar compressão de espaço fiscal na ordem de R$ 32 bilhões a R$ 40 bilhões. Ou seja, o governo teria de cortar algo em torno desse valor em despesas no orçamento de 2024.
“A única coisa que o Ministério do Planejamento e Orçamento esclareceu para a classe política é que, temporariamente, a ficar o IPCA da forma como veio da Câmara, nós precisaríamos mudar já na LOA (Lei Orçamentária Anual), no orçamento que virá até 31 de agosto, uma compressão de espaço fiscal com despesas de R$ 32 bilhões a R$ 40 bilhões, a depender dos cálculos que forem feitos”, explicou a titular a ministra.
Medidas Provisórias
Ainda no campo de lentidão imposto pelas disputas de forças políticas no Congresso Nacional, há pendência de votação, de nada menos que 14 medidas provisórias enviadas pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional que não foram votadas, e mais uma que chegou na Câmara dos Deputados há quatro dias, a MPV 1180/2023, que abre crédito extraordinário, em favor do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, no valor de R$ 280.000.000,00.
MPs têm prazo de validade de 60 dias, prorrogáveis por mais 120 dias e se não forem votadas perdem a validade.
CPIs
O Legislativo federal terminou o primeiro semestre com seis comissões de inquérito ativas. As reuniões são semanais e mobilizam deputados e senadores, em especial nos colegiados que miram o desgaste do governo. As investigações de cada CPI, no entanto, avançam em ritmo devagar.
Sem um apoio consolidado na Câmara, aliados da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se esforçam para contornar reveses nos colegiados em que a oposição quer expor o Executivo.
A comissão que mais mobiliza congressistas é a que investiga os atos de vandalismo de 8 de Janeiro. Formada por deputados e senadores, a CPI começou atrasada em relação às investigações da Polícia Federal e da Justiça sobre os atos.
Além da comissão mista, há na Câmara quatro comissões de inquérito e no Senado, uma. No caso da Câmara, o regimento da Casa determina um máximo de cinco CPIs em funcionamento ao mesmo tempo.
Na época em que foram instaladas na Câmara, o presidente Arthur Lira (PP-AL) garantiu que os colegiados não atrapalhariam as votações da Casa. As oitivas e depoimentos em cada comissão, no entanto, têm se estendido por horas. A CPI do 8 de Janeiro, por exemplo, foi criada em maio e já teve quase 50 horas somadas de reuniões.
As CPIs são temporárias e têm duração de 120 dias, mas podem ser prorrogadas. Os colegiados têm poderes de investigação e podem ouvir testemunhas, tomar depoimentos de autoridades, requisitar informações de outros órgãos e determinar diligências.
Essas comissões, no entanto, não processam ou julgam pessoas, apenas investigam fatos. Ao final é produzido um relatório dos trabalhos realizados que deve ser enviado ao Ministério Público ou à AGU (Advocacia Geral da União).
Observadores políticos, em opinião antagônica ao do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, são unânimes em afirmar que a quantidade expressiva de CPIs em funcionamento, drenam a capacidade de trabalho do Plenário em votar a pauta.
O governo Lula estuda abrir espaço no governo para a participação de partidos do chamado Centrão, que além do União Brasil, que recebeu o Ministério do Turismo, que será comandado pelo deputado paraense Celso Sabino, deve entregar ao Republicanos e ao Partido Progressista outras pastas do primeiro escalão da administração federal.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.