Por Eleutério Gomes – de Marabá
Esteve em Marabá nos últimos dois dias a educadora e escritora mineira Maduca Lopes, que ministrou importante palestra aos conselheiros tutelares do município, onde desfez um grande equívoco em relação à atuação dos Conselhos Tutelares e de seus integrantes. Ela atua há 20 anos com a causa do menor e do adolescente e, ao longo dos últimos 16 anos, estudou detalhadamente o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), após passar quatro anos, como conselheira, atuando em ações equivocadas nunca previstas na lei e totalmente à margem do que preceitua o Estatuto.
Baseada nessas descobertas, de lá para cá Maduca viaja pelo País ministrando palestras, esclarecendo conselheiros tutelares e os orientando a retirar dos ombros atribuições que não são deles e cobrarem a responsabilidade de quem realmente deve cuidar das crianças e dos adolescentes.
“O Estatuto tem 27 anos e, ainda e infelizmente, é desconhecido pela sociedade como um todo e por grande parte das autoridades. E esse desconhecimento tem feito com que a gente sofra com as consequências da não aplicação dele”, disse ela ao Blog.
Cultura equivocada
Ela mesma, segundo relatou aos conselheiros de Marabá, quando entrou no Conselho Tutelar de Pouso Alegre (MG), o fez com visão de educadora e de que o órgão era repressor, que seus integrantes deveriam ir a escolas acabar com a bagunça nas salas de aula, aos bares verificar se meninos estavam ingerindo bebidas alcoólicas, fiscalizar portarias de locais de espetáculos para proibir a entrada de menores, acompanhar menores desacompanhados em hospitais etc.
“O conselho passou a fazer coisas que são responsabilidade dos pais e isso virou uma cultura no País. E hoje, viajando pelo Brasil, eu percebo a dificuldade que é quebrar essa cultura”, afirma Maduca, acrescentando: “O Conselho não pode ser responsável pela criança e pelo adolescente, ele não é babá, ele não é taxista, ele não fiscaliza festa. Pela lei, o Conselho é responsável sim, por fazer com que os direitos previstos no ECA sejam cumpridos”, afirma ela.
E esses direitos são: o direito à educação, ao lazer, à cultura, à saúde, à convivência familiar. “Então, se esses direitos não estão sendo garantidos, o Conselho Tutelar tem de ser chamado para quê? Para lutar por esses direitos”, afirma Maduca, completando: “A gente não pode colocar o Conselho Tutelar como órgão de repressão”.
Visão destorcida
Ela lembra que, ontem, segunda-feira (27), primeiro dia de palestras, perguntou a um adolescente da plateia o que é o Conselho Tutelar e ele respondeu: “É prisão de criança”. “Então é essa a visão que os alunos têm dentro das escolas. Por quê? Se fizer bagunça, vamos chamar o Conselho Tutelar, mas chamar o Conselho para quê? Qual a função do conselho lá? O que vai mudar no contexto da bagunça?”, questiona, respondendo: “Tenho de chamar são os pais desse menino que está cometendo a indisciplina e a escola tem de ser organizar com os profissionais que ela tem para combater a indisciplina, o Conselho não tem essa função”.
Maduca Lopes acrescenta ainda que o trabalho do Conselho Tutelar é: assessorar o Poder Executivo local na elaboração do orçamento das ações voltadas para as crianças e adolescentes, atuar quando a criança tiver seus direitos ameaçados ou violado por ação da família, da sociedade ou do estado, apontar ao município e ao CMDCA as demandas da criança e do adolescente, zelar verdadeiramente pelo cumprimento dos direitos estabelecidos no Estatuto e requisitar serviços, cumprindo com as suas atribuições.
Novo entendimento
Ela lamenta, entretanto, que cada cidade esteja trabalhando de um jeito, com entendimento equivocado, com a sociedade e as autoridades cobrando do Conselho atribuições que não são dele, quando a lei é uma só para todo o País.
“Eu estou aqui tentando trazer esse entendimento para os profissionais que aqui estão, para que eles possam fomentar a rede, para que cada um passe a atuar dentro do seu papel, dentro da sua responsabilidade. É a única forma que eu, que atuo nessa área há mais de 20 anos, vejo de a gente conseguir mudanças efetivas no futuro”, observa.
Ela afirma que é preciso esclarecer, fazer com que o Estatuto entre nas escolas, nas associações de bairro, nas reuniões de professores e nas delegacias de polícia, principalmente, para que seja um documento efetivado e aplicado. “É a única forma de a gente conseguir realmente resultados positivos”, enfatiza, deixando bem claro que o Conselho Tutelar tem de, em todas as situações que envolvam criança ou adolescente, cobrar da família e de cada órgão que compõe a rede de proteção, sua atuação dentro do que lhe é atribuído, e não tentar resolver tudo, o que não é obrigação do órgão, como pensam a sociedade e as autoridades.
Os esclarecimentos foram muito elogiados por todos os conselheiros presentes e pela secretária municipal de Assistência Social, que viu as palestras como muito esclarecedoras. André Silva, membro do CMDCA (Conselho Municipal da Criança e do Adolescente), que trouxe a educadora a Marabá, disse que Maduca Lopes mostrou como realmente a lei deve ser cumprida e como cada um deve cumprir melhor suas atribuições.
Maduca, que já proferiu palestra com o mesmo teor em Parauapebas, seguiu de Marabá para Rio Maria, também no Pará e, de lá, vai para Torres, no Rio Grande do Sul.
2 comentários em “Conselheiro tutelar não é babá, não é taxista nem fiscaliza festa, diz educadora”
Neste ano de eleição será muito importante os municípios investirem em formação para os novos conselheiros
Estive nesse curso, prefeito. Icrivel a ausência de conselheiros nesses dois dias de curso, parabéns ao CMDCA, e ao gestor atual por proporcionar o evento dessa porte. Espero que aconteça mais a que outras pessoas ligadas ao serviço público se interessem em aprender mais e poder aplicar de forma correta o ECA.