Contas de Jatene são definitivamente rejeitadas por Ministério Público

Após análise da defesa do ex-governador, MPC se convence de irregularidades praticadas pelo tucano em 2018. Relatório ainda será examinado pelo TCE

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Na semana em que a Auditoria Geral do Estado instaura auditoria de caráter especial “para apurar possíveis irregularidades” no processo de obtenção de crédito no valor de R$ 595 milhões pelo ex-governador Simão Jatene (PSDB) perante a Assembleia Legislativa, outra péssima notícia deve tirar o sono do líder tucano: o Ministério Público de Contas do Pará (MPC) manteve a decisão de rejeitar as contas do Governo do Estado relativas ao exercício de 2018 “em razão das irregularidades relacionadas” já em primeiro parecer emitido pelo órgão em maio deste ano.

Assinado pela procuradora-geral de Contas do Pará, Silaine Karine Vendramin, o relatório de 71 páginas será enviado para análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PA). Se as irregularidades forem confirmadas pelos conselheiros, caberá à Alepa decidir o futuro de Simão Jatene, que poderá responder criminalmente na Justiça caso os deputados aprovem as análises e parecer do MPC.

Os autos retornaram ao Ministério Público de Contas para que pudesse ser analisada a defesa do ex-governador ao primeiro parecer do órgão, de rejeição às contas, e também para que o atual governador, Helder Barbalho (MDB), se manifestasse sobre os alertas e as 43 recomendações do tribunal para o efetivo cumprimento das leis, como a de Responsabilidade Fiscal (LRF), e melhoria da gestão pública.

No relatório, Silaine Vendramin é enfática ao se contrapor e derrubar, com base em doutrinas jurídicas e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), cada uma das defesas do ex-governador às irregularidades que ele teria praticado na gestão fiscal e política de pessoal. Já na primeira irregularidade, é mostrado que houve divergência de execução orçamentária de 2018 com a política fiscal fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovada pela Alepa.

Em vez de apresentar um superávit primário de R$ 12,6 milhões ao final de 2018, o governo gerou um déficit primário de R$ 1,432 bilhão, o que significa que gastou muito além daquilo que foi aprovado pelo Legislativo – nada menos que 12.000% de descumprimento –, o que comprometeu “toda a regularidade da gestão fiscal do exercício financeiro de 2018 do Governo do Estado,” assinala a procuradora.

Em sua defesa, Jatene tece considerações acerca das funções do estado na promoção de bens sociais à população, aduz que o estado do Pará ostenta bons indicadores fiscais e que, comparativamente com outros estados, manteve em situação de normalidade os gastos com pessoal.

“O que cabe apontar é que substancial e bilionário déficit primário, ainda que apoiado em possível colchão financeiro de superávits financeiros de exercícios anteriores, deveria ter sido proposto ao parlamento e por ele aprovado na LDO, e não assumido solitária e autoritariamente pelo Executivo no curso da execução orçamentária, ainda mais em último ano de mandato,” destaca Silaine Vendramin.

Reiteradamente, a procuradora frisa em sua análise que o déficit primário, por si só, não constitui em irregularidade pela Lei de Responsabilidade Fiscal. “A irregularidade surge quando o déficit decorre de execução orçamentária em completo descompasso às metas materializadas na LDO pelo parlamento”, explica ela.

Para a procuradora, “não é exagerado dizer que, ao conduzir a execução orçamentária na contramão do determinado pela LDO, o Poder Executivo usurpou do parlamento uma de suas principais prerrogativas, que é a deliberação acerca da política fiscal”. E mais, acrescentou Silaine Vendramin: “O vultoso e bilionário descumprimento da meta não apenas sugere, mas deixa certificado que, em verdade, a programação orçamentária e financeira do Poder Executivo ao longo de todo o ano não mirou em momento algum as metas fiscais definidas com o Parlamento”.

O MPC chama atenção para o Relatório Resumido de Execução Orçamentária produzido pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), em que o Pará apresentou piora destacada em vários índices de medição, como o resultado orçamentário negativo, queda de sua poupança corrente em relação à Receita Corrente Líquida (RCL) e o pior resultado primário do Brasil.

Sobre a defesa de Simão Jatene, a procuradora considerou as alegações “genéricas”, acerca da importância dos gastos empreendidos. “Não foi indicada nem quantificada qualquer frustração inesperada de significativa receita, não foi demonstrada a convergência da programação financeira e do cronograma mensal de desembolso com a meta fiscal, não foi mencionada a existência ou a extensão de possíveis decretos de contingenciamento, não se citou e muito menos se comprovou alguma tentativa tempestiva na alteração da meta de resultado primário perante o parlamento”.

Despesas com pessoal

Sobre a abertura e execução de créditos suplementares decorrentes de superávit financeiro ou excesso de arrecadação em cenário de contingenciamento obrigatório, o relatório do MPC afirma que a irregularidade “salta aos olhos”.

Outra “grave” irregularidade cometida pelo ex-governador, segundo o MPC, foi a edição da Lei 8.802/2018, que concedeu reajuste salarial específico aos servidores do Poder Executivo apesar de o estado estar no chamado limite prudencial com gastos com pessoal, que é de 46,17% pela LRF. E mais grave ainda, na avaliação do Ministério Público de Contas, foi o reajuste ocorrer em pleno ano eleitoral.

“A flagrante ilegalidade está em iniciar os pagamentos do aumento antes mesmo da aprovação da lei,” diz a procuradora, para quem o papel constitucional do Legislativo foi novamente desconsiderado pelo Executivo, que concedeu aumentos além do previsto pela LDO, onerando a folha em 47,16%, o que representou uma despesa de R$ 8,865 milhões com pessoal.

“Considerando apenas o valor líquido com gastos com pessoal, houve acréscimo de R$ 652,3 milhões, muito além da margem referenciada na LDO,” observa Silaine Vendramin. Com isso, os gastos com pessoal cresceram 9,15% líquidos, quando em 2017 esse índice não passou de 1,56% e, em 2016, de 0,6%.

“O Estado do Pará, em 2018, percebeu a deterioração de vários de seus indicadores fiscais, o que não seria por si só um problema acaso não decorresse do cometimento de flagrantes e substanciais ilegalidades em face da Lei de Responsabilidade Fiscal,” diz a procuradora.

Por Hanny Amoras – de Belém

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