Após reunião com lideranças partidárias, nesta terça-feira (1º), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), comunicou o adiamento, por prazo indeterminado, da votação do arcabouço fiscal – Projeto de Lei Complementar nº 93/2023, oficialmente designado como Regime Fiscal Sustentável –, contrariando a vontade do governo, que tem pressa na aprovação da matéria.
Para a plateia, Lira justificou que é “para dar tempo de o governo reorganizar sua base para a votação”. Entretanto, a manobra está sendo interpretada como pressão para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acelere as nomeações acertadas numa minirreforma ministerial sendo negociada com o PP e o Republicanos desde antes do recesso, que teve início no dia 17 de julho.
As implicações para a agenda legislativa são imediatas. Como o projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024 tem até 31 de agosto para ser votado, o que tecnicamente só pode acontecer após a aprovação do arcabouço, o governo foi pego de calças curtas com a notícia.
Outro ponto delicado é que o governo pode entrar na votação do arcabouço sem garantias de aprovação da matéria como está prevista. Como os senadores modificaram o texto na Câmara, nada impede que os deputados derrubem as modificações.
Uma das emendas sob análise permite a inclusão de cerca de R$ 30 bilhões em gastos já no projeto, que ficariam condicionados ao aumento da inflação no fim do ano. Se for rejeitada, o Executivo terá de propor a LOA com um corte expressivo e fazer acréscimos, caso a inflação cresça. “Se isso acontecer, a doença será maior que o remédio,” disse uma fonte do Blog.
O governo é contra o adiamento, uma vez que o arcabouço fiscal está no topo dos projetos da agenda econômica desenhada pela nova gestão, a cargo do ministro da Fazenda Fernando Haddad. A expectativa era de votá-lo rapidamente. Além disso, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) espera a votação do arcabouço para aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024.
Ao participar do programa “Roda Viva”, da TV Cultura, na noite desta segunda-feira (31), Lira já tinha dado indícios de que pretendia adiar a votação e afirmou que a Câmara aprovaria o projeto “até 31 de agosto”. Para ele, não haveria pressa porque o mercado financeiro já precificou o impacto da medida, e o tempo adicional é necessário para os deputados debaterem as emendas aprovadas pelos senadores à proposta.
O presidente da Câmara não estabeleceu uma data e deve esperar o presidente Lula concluir a reforma, para então colocar o projeto em votação, o que também não tem data definida. Seu partido, o PP, negocia a indicação de um ministro com orçamento robusto e a presidência da Caixa Econômica Federal.
Outra versão ouvida pela Reportagem também faz sentido: “O PP e o Republicanos não querem ficar fazendo sala como aconteceu com União Brasil, na novela que foi criada para nomear o deputado Celso Sabino (União-PA), para ministério do Turismo,” afirmou a fonte.
Com o adiamento, devem ser votados esta semana apenas requerimentos de urgência a projetos e realizada a eleição dos representantes da Câmara para o Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Minirreforma ministerial
Com uma base parlamentar insuficiente para a aprovação de sua agenda, decorridos oito meses, o governo Lula já entendeu que precisa ampliar a base para não sofrer derrotas nas votações das matérias mais importantes em pauta na Ordem do Dia.
Mais experiente, Lula, ao contrário do antecessor Jair Bolsonaro (PL), que permitiu lotear o governo apenas dois anos depois de tomar posse, deu a ordem de acelerar as tratativas.
No cronograma traçado pelo presidente com seus escudeiros no Congresso Nacional, estão previstas reuniões com líderes e dirigentes de partidos para avançar nas trocas na Esplanada dos Ministérios e contemplar as indicações no primeiro escalão do governo. Hoje, Lula tem uma base de apoio frágil e insuficiente no congresso e busca atrair pelo menos duas legendas do chamado Centrão: PP e Republicanos.
Ele também não abre mão de negociações no varejo. Topa manter abastecidos os parlamentares por meio de cargos e emendas, mas gostaria de pulverizar as transações. Até deputados do PL não estão descartados, desde que votem com o governo – embora o risco de serem expulsos seja real, como aconteceu recentemente com o deputado federal Yury do Paredão (PL-CE), após se empolgar em cerimônia de entrega de unidades habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida, no Ceará, e posar para fotos “fazendo o L”.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.