Brasília – Três cientistas políticos preveem uma alta reeleição dos atuais deputados federais e a redução de partidos representados na Câmara dos Deputados. A redução pode cair dos atuais 23 partidos para 15. Num outro viés, a estratégia dos partidos nas eleições para deputado federal em 2022 ficou mais complicada.
Segundo o cientista político da Fundação Getúlio Vargas, Jairo Nicolau, em entrevista ao Painel Eletrônico da Rádio Câmara, o lançamento de vários candidatos “peso-pesados” para deputado federal como ex-ministros e até ex-candidatos a presidente, terá um grande impacto após a abertura das urnas em 2 de outubro.
Se, por um lado, a ideia é garantir o cumprimento de uma das condições da cláusula de barreira, a de obter 2% dos votos válidos em nove unidades da federação; por outro isso pode dificultar a vida do partido na distribuição das sobras de vagas.
Cumprir a cláusula de barreira significa que o partido continuará recebendo recursos públicos e terá tempo para propaganda no rádio e na TV. Ele também cumpre a cláusula se conseguir eleger 11 deputados em pelo menos nove estados.
Outra mudança que será aplicada pela primeira vez na arena federal é o fim das coligações que permitiam que partidos se unissem nas eleições para somarem seus votos para efeito de distribuição de vagas. Nestas eleições, só quem se juntou em federações terá esse benefício. Mas a federação terá que se manter mesmo após as eleições.
Vários deputados federais eleitos pelo Pará para uma cadeira na Câmara dos Deputados, se beneficiavam com o instituto da coligação, agora extinto. Por exemplo. Um candidato de um partido com votação média histórica no estado, como PP, PDT e PTB, conseguiam eleger cada, pelo menos um deputado federal, mas com a nova regra, o funil vai deixar pelo menos um desses partidos sem representação.
Tudo isso, segundo Jairo Nicolau, favorece uma estratégia de acumular votos: “Você precisa juntar os votos só do seu partido, então você precisa de nomes fortes. Todas as legendas fizeram isso no estado do Rio de Janeiro, por exemplo. Imagino que isso tenha acontecido em outros lugares. Só em São Paulo tem o José Serra, a Marina Silva, o Boulos, todos para deputado federal”. Ocorre que as mudanças nas regras das sobras eleitorais terão impactos diferentes sobre os partidos que têm puxadores de votos.
Após a votação, é calculado o quociente eleitoral, que é a divisão do total de votos válidos — sem brancos e nulos — pelo total de vagas. Se um partido tem duas vezes o quociente eleitoral, ele tem duas vagas; mas é necessário que os dois mais votados tenham pelo menos 10% do quociente eleitoral cada um.
As vagas que sobrarem nesta primeira fase serão colocadas em uma segunda distribuição, na qual, para participar, o partido terá que ter pelo menos 80% do quociente eleitoral. Já os candidatos terão que ter 20%. É o que exemplifica Jairo Nicolau: “Aqui no Rio o quociente eleitoral é 160 mil votos. Se um candidato tem abaixo de 10% disso, que é 16 mil votos, ele não pode ser deputado, ele está inabilitado. Isso na primeira rodada. E na segunda, ele tem que ter no mínimo 20% para ser apto. É mais do que a primeira, curiosamente. É a nova regra”. No Pará, nas últimas eleições gerais, o número de corte foi de 230 mil votos, muito superior ao do estado do Rio de Janeiro.
O resultado disso é que os partidos que têm puxadores de votos correm o risco de perder cadeiras: “Isso aconteceu em 2018 em São Paulo com o PSL. O Eduardo Bolsonaro teve uma votação de mais de 2 milhões de votos, mas o partido tinha uma chapa fraca. Então eles perderam seis deputados federais. Seis pessoas não chegaram aos 10%. Agora, isso apertou um pouco mais porque tem essa regrinha dos 20% nas sobras. Vai ficar mais difícil”.
Para o cientista político, uma estratégia que beneficiasse candidatos com potencial poderia ter efeitos melhores. Além disso, as regras são pouco conhecidas: “Pouca gente conhece. A gente só quer saber da eleição presidencial, lamentavelmente. Essa regrinha pode ter efeitos danosos para alguns partidos que estão dando pouco espaço para candidatos intermediários; que têm potencial, mas não têm recursos”.
Jairo Nicolau afirma que a motivação para o voto entre 2018 e 2022 mudou. Por conta disso, ele acredita que a renovação da Câmara dos Deputados poderá ser feita com nomes antigos. Ou seja, além dos políticos “peso-pesados”, a volta daqueles que já foram deputados, por exemplo.
No Pará, políticos com nomes conhecidos dos eleitores têm chances reais de eleição, como os ex-deputados federais Giovanni Queiroz (PDT) e Ana Júlia (novamente no PT), mas dependerão de seus próprios votos e não ”turbinados” pelos votos de candidatos menos votados das coligações. “Os mais conhecidos eram beneficiados”, explica Nicolau.
Cenário diferente
Dois pesquisadores que acompanham as eleições acreditam que a renovação da Câmara dos Deputados não será alta neste ano. Já as mudanças nas regras eleitorais podem reduzir os partidos com representação na Câmara, dos atuais 23 para cerca de 15.
O consultor político Antônio Augusto de Queiroz afirmou que a reeleição será alta porque 88% dos 513 deputados atuais, ou 446 parlamentares, são candidatos: “O parlamentar não concorre à reeleição se ele não tiver muita certeza de que tem grande chance de retornar, em primeiro lugar. O índice de reaproveitamento dos candidatos à reeleição é superior a 65%. Portanto, dá para antecipar que pelo menos 290 vão se eleger desses que são candidatos e isso já será um recorde de reeleição”, disse.
Queiroz avalia que os atuais deputados têm a vantagem de geralmente receberem mais recursos dos partidos, além de terem a oportunidade de fazer emendas orçamentárias ligadas aos seus locais de votação.
Já o cientista político Cristiano Noronha, prevê um perfil de “centro-direita” para a Câmara e a redução do número de partidos, em razão da cláusula de desempenho. Essa cláusula fixa quantidades mínimas de votação para que um partido tenha acesso aos recursos do Fundos Partidário e ao horário de propaganda em rádio e TV.
Portanto, após as eleições, alguns partidos podem querer se fundir a outros para manter os benefícios, como acredita Noronha. “Para o futuro presidente da República, seja lá quem for, de certa forma, isso tende a facilitar a governabilidade, já que deve ter menos fragmentação partidária”, acrescentou.
Partidos e candidatos têm cláusula de desempenho na eleição para a Câmara
As eleições deste ano inauguram modelo de federação partidária; veja como funciona.
Em relação ao tamanho dos partidos, as bancadas vão depender de novas regras também para a destinação das sobras de votos. Existe um total fixo de votos para a eleição de deputados, dependendo do estado. O que sobra vai para os outros do mesmo partido ou federação; mas somente para aqueles que têm uma quantidade mínima de votos, como explica o consultor político Antônio Queiroz: “Pode se repetir um fenômeno que ocorreu com o PSL na eleição passada em que, em São Paulo, por exemplo, quatro vagas que esse partido tinha direito, ele não preencheu porque não tinha candidato com 10% do quociente que era a exigência de então.”
Uma maneira de suavizar as regras é a criação das federações partidárias. Segundo Antônio Queiroz, se PCdoB, PT e PV não tivessem se tornado uma federação, eles teriam hoje menos 15 cadeiras com a mesma quantidade de votos.
Ao eleitor, o cientista político Cristiano Noronha aconselha que busque ativamente informações sobre os candidatos: “O eleitor tem quase que fazer um trabalho de garimpo para procurar as informações, aquilo que é verdade e aquilo que tem informação distorcida. Mas o fato é que, havendo um pouco de interesse, havendo um pouco de trabalho, o eleitor também pode se informar minimamente sobre aquele candidato que ele pretende votar.”
Segundo Noronha, a campanha no rádio e na TV tem o seu papel porque permite que os candidatos falem para um grupo maior do que aqueles que já os seguem em redes sociais.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.