Brasília – Acendeu a “luz amarela” no painel de acompanhamento político no bunker do Palácio do Alvorada. Não se trata de uma ameaça externa, é interna e atende pelo provável nome de “União Brasil”, que resultará da fusão do Democratas com o Partido Social Liberal que formará a maior legenda do Congresso Nacional e muito dinheiro para bancar a disputa eleitoral de 2022.
Bolsonaro disse a interlocutores que não vê ameaça direta de sua candidatura à reeleição ser ameaçada quanto à possibilidade de o futuro partido lançar um candidato da “terceira via”. A análise do governo é de que a disputa ficará polarizada entre Bolsonaro e o PT; e que o centro não terá força em 2022. Entretanto, governistas acreditam que a nova sigla pode ser uma ameaça nas eleições estaduais — importantes para formar a futura base de sustentação da próxima gestão. Além disso, é possível que o União Brasil afete a relação do Planalto com o Congresso, caso adote uma postura mais independente.
A avaliação feita pelo Planalto é que, sozinhos, DEM e PSL não terão um peso político-partidário significativo em 2022 caso a fusão não ocorra. As duas legendas, atualmente, estão divididas internamente entre os que apoiam Bolsonaro e os que preferem apoiar uma terceira via. Mas, juntos, a análise é de que podem ser um incômodo para o presidente justamente por unir alas contrárias a Bolsonaro.
Membros da articulação política do governo dizem que o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, está atento às negociações de PSL e DEM sobre lançamentos de candidaturas nos estados. Presidente nacional do PP, Nogueira atua como um coordenador eleitoral da candidatura de Bolsonaro e mapeia os potenciais concorrentes.
O chefe da Casa Civil tomou conhecimento de que o ex-governador Geraldo Alckmin, pré-candidato ao governo de São Paulo, mantém conversas com PSL e DEM sobre a possibilidade de se filiar ao futuro partido ao deixar o PSDB — o que ele já indicou que vai fazer. Caso isso se confirme e o tucano não se filie ao PSD — sua outra opção —, seriam reduzidas as chances da montagem de um palanque entre Alckmin e Bolsonaro no segundo turno, como vinha sendo estudado.
“A fusão cria um player a mais com condições de pressionar bastante em vários estados. É um partido que teria um peso grande na hora das negociações. O PSL rachado e o DEM sozinho não pesariam em comparação como pesarão juntos”, diz um interlocutor do Planalto.
Impactos
As cúpulas de DEM e PSL acreditam que o União Brasil poderá ter candidaturas aos governos de 12 estados, incluindo São Paulo. Alckmin procurou caciques dos dois partidos e se reuniu na quarta-feira (29) para discutir e negociar uma possível filiação.
Além da possibilidade de filiar Alckmin e lançá-lo a governador por São Paulo, o futuro partido deve lançar o presidente nacional do DEM, ACM Neto, ao governo da Bahia, e buscar as reeleições de governadores atualmente filiados às duas legendas: Ronaldo Caiado (DEM), em Goiás; Mauro Mendes (DEM), em Mato Grosso; e Marcos Rocha (PSL), em Rondônia.
Em Santa Catarina, o futuro partido tende a lançar ao governo o prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro (DEM) — o atual governador, Carlos Moisés, era do PSL, mas se desfiliou.
No Ceará, a ideia é filiar o deputado Capitão Wagner (Pros) e tê-lo como candidato a governador. Em Pernambuco, a meta é ter o deputado Fernando Coelho (DEM) como candidato ao governo estadual.
Não se sabe ainda a postura do deputado Celso Sabino (ex-PSDB), que agora é o cacique isolado do PSL no Pará, adotará. Se apoiará a reeleição do governador Helder Barbalho ou lançará candidatura própria, atestou um interlocutor do presidente que falou com a reportagem, mas pediu reserva de seu nome.
O deputado Celso Sabino (PSL-PA), que recentemente se filiou à legenda, enfatiza que, por ser um partido que defenderá pautas liberais na economia e conservadoras nos costumes, haverá ocasiões em que o partido votará junto ao Planalto. “Nas pautas que forem congruentes, vamos apoiar o governo qualquer que seja ele. Nas pautas que forem em desacordo com o partido, vamos defender nossas bandeiras”, destaca.
O vice-presidente nacional do PSL, deputado Júnior Bozzella (SP), diz que o futuro partido despertou o interesse de diversas lideranças no país e confirma a expectativa em lançar candidaturas competitivas nos estados.
Mas Bozzella discorda da análise do Planalto de que a sigla não seria uma ameaça na disputa pela Presidência. “Se você tem palanques bem organizados e estruturados nas principais regiões do país, é óbvio que você vai interferir diretamente na eleição nacional. Não tem como isso não acontecer, principalmente quando tem uma fatia do eleitorado que considera e busca alternativa [terceira via]”, pondera Bozzella que não quis especular quais seriam os nomes competitivos de uma provável terceira via.
“Quando a gente achar um nome que seja o catalisador desse sentimento e desejo da sociedade com o partido estruturado, [montar] palanques fortalecidos regionalmente e fidelizar essas candidaturas ao projeto macro, é óbvio que isso vai interferir no projeto nacional e vai ter mais robustez, com possibilidade de eleição em um terço dos estados”, aposta o vice-presidente do PSL.
Relação
O novo partido, que pode ser oficialmente criado em novembro, seria o maior da Câmara dos Deputados, com 81 deputados. Atualmente, DEM e PSL, juntos, têm sete senadores. Esses números eventualmente podem crescer (com o ingresso de novos filiados) ou diminuir (com uma possível debandada de aliados de Bolsonaro). Mas a avaliação é que, ainda que haja variações, o União Brasil será um partido de peso no Congresso.
Nos bastidores, a aposta é de que a nova legenda terá mais independência em relação ao governo nas votações da Câmara e do Senado, especialmente porque o partido tende a ter um projeto próprio para 2022. Apesar da perspectiva de autonomia, Bozzella diz que a relação entre o partido e o governo no Congresso se dará conforme a pauta.
Já o Planalto vai aguardar o posicionamento da legenda a ser criada para tomar sua postura. “Havendo um posicionamento contrário ao governo e que, principalmente, possa vir a criar dificuldades nas votações, o comportamento será um. Caso não, a relação será outra”, resume um interlocutor.
A saída de alguns governistas do futuro partido também vai mexer no comando da liderança dos partidos nas duas Casas. O PSL, por exemplo, é liderado hoje na Câmara pelo deputado Vitor Hugo (PSL-GO), apoiador de Bolsonaro, que não seria mantido na liderança com a fusão. Os atuais vice-líderes são igualmente apoiadores de Bolsonaro; e também perderiam seus postos.
Deputados do DEM dizem que a liderança do União Brasil na Câmara ficará com Elmar Nascimento (DEM-BA), o “representante” de ACM Neto na Casa. A vice-liderança seria composta por quadros igualmente de centro-direita sem vínculo com o bolsonarismo. Bozzella não confirma a informação e diz que essa discussão ainda será feita; e que a definição ficará para 2022.
A fusão abrirá uma janela partidária para que atuais filiados ao DEM e ao PSL que não aceitarem a unificação e queiram deixar o partido, o que pode ocorrer ainda este ano. “Dia 7 ou 8 eu já saio, não fico em comissão nenhuma, abro mão das comissões [em que é membro titular] e saio imediatamente”, diz o deputado Bibo Nunes (PSL-RS), um aguerrido apoiador do presidente Bolsonaro.
Outros aliados de Bolsonaro podem permanecer até março. O objetivo é não perderem seus assentos nas comissões e recursos do fundo eleitoral. Eles deixariam a legenda somente na janela partidária eleitoral de março de 2022.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.