Por Evelyn Levy – Valor Econômico
Estamos ainda pouco habituados a pensar o Brasil a médio e longo prazo e o impacto que terão nossas decisões de hoje dentro de algumas décadas. Vários países já têm planos de longo prazo, em que projeções demográficas são relacionadas à evolução das finanças públicas, como a Austrália que tem um “Intergenerational Plan”, que prevê as despesas nos próximos 40 anos e corrige os dados a cada cinco anos.
No Brasil, dada a rigidez das despesas com pessoal no setor público, uma das dimensões que deveríamos considerar é aquela relativa à contratação de servidores públicos. O debate sobre esse assunto, em geral, está, entre nós, centrado em torno de posições que condenam o número – supostamente exagerado – de servidores, versus argumentos em favor de concursos para garantir a meritocracia e sua implícita imparcialidade.
Creio que colocar o debate em torno desses eixos é um equívoco. De fato, o número de servidores não é exagerado: o Brasil tem mantido, há décadas, a média histórica de ter em torno de 11% de sua População Economicamente Ativa (PEA) trabalhando no setor público. Em termos comparativos também a situação não é anômala: entre os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) essa participação varia de 5% a 28%.
Os parâmetros mais adequados então para esse debate deveriam ser quanto pode o país dispender com salários e previdência do setor público? E, nos limites impostos por essa despesa, qual a melhor maneira de realizá-la?
O país gasta hoje cerca de 15% do Produto Interno Bruto (PIB) com a despesa de pessoal do setor público (Medeiros, 20111), o que representa cerca de 43% da despesa pública (Medeiros, 2011) enquanto esse percentual, em termos médios, gira em torno de 24% entre os países da OCDE (OCDE, 20112). Seria importante diminuir essa despesa a médio prazo. Isso não significa necessariamente diminuir os salários. Esses deveriam sempre flutuar em torno dos valores pagos pelo mercado privado para ocupações equivalentes, para garantir a atratividade do setor público. Retornando aos exemplos de países da OCDE, vemos que muitos deles estão estabelecendo “taxas” de substituição para os servidores que se aposentam nos governos centrais. Áustria, Portugal e França estabeleceram admitir um servidor para cada dois que se aposentam; a Itália e a Grécia, um em cada cinco; a Espanha definiu um parâmetro mais rigoroso, um para cada dez que se aposentam (OCDE, 2011).
Atendida a premissa de um “teto” de despesa de pessoal, a questão que resta discutir (e que é raramente lembrada) é qual é o perfil de servidor que o Estado brasileiro irá necessitar daqui em diante? De qual Estado necessitamos para o desenvolvimento do país?
Atualmente a definição de concursos no setor público – para quais cargos deve haver recrutamento – se faz por pressão dos interesses já organizados, sejam eles dos órgãos públicos existentes e/ou dos sindicatos. Os governos – federal, estaduais e municipais – costumam não ter uma visão estratégica dos recursos humanos de que irão necessitar no futuro mais próximo e mais distante. Segundo dados da PNAD (Marconi4, 2010), entre 2002 e 2007, a força de trabalho no setor público cresceu em torno de 20%, principalmente nos Estados e municípios. Cerca de 20% desse total foi incorporado em atividades auxiliares, técnicas e de apoio, que ainda hoje absorvem mais de 30% da força de trabalho.
Os múltiplos desafios que cercam as sociedades contemporâneas, suas economias e meio ambiente, exigem políticas públicas mais complexas e integradas, baseadas em evidências sobre seus impactos. Demandam regulação continuamente aperfeiçoada, para não se tornar um obstáculo, em vez de uma alavanca ao desenvolvimento. Exigem mais, melhores e novos serviços públicos – em virtude do envelhecimento da população, por exemplo – e nesse sentido nosso passivo ainda é muito grande. Quais as prioridades?
Uma resposta genérica a essa questão é: as prioridades são as de contratação de servidores para exercerem as atividades que são exclusivamente estatais. Onde o setor privado e/ou o terceiro setor puderem atuar deveriam ser fortemente considerados, como, aliás, admite a Constituição brasileira. Essa é, não por acaso, a forte tendência dos países como o Reino Unido, os Estados Unidos e outros.
Preconizar a terceirização não significa aceitar condições precárias de trabalho; pelo contrário, esses contratos devem ser judiciosamente acompanhados de modo a garantir a esses empregados seus direitos trabalhistas, protegendo-os de relações oportunistas.
Os recentes casos de relacionamento espúrio entre os governos e as entidades não governamentais também não deveriam impedir esse caminho. O aperfeiçoamento das formas de controle (Modesto, 20103) seria uma resposta muito mais eficaz. A contínua incorporação de servidores que não exercem atividades exclusivas de Estado está comprometendo a despesa de pessoal atual e futura, talvez por mais de quatro décadas, eventualmente impedindo que as ações estratégicas do Estado possam ser executadas.
Medidas contínuas para aumento da transparência do setor público, dando oportunidade ao exercício do controle social e participação; a qualificação permanente dos servidores para o melhor desenvolvimento das competências necessárias; a construção de carreiras mais flexíveis, que não cristalizem grupos de servidores em atividades que poderão se tornar obsoletas, ou em órgãos que poderão ser remodelados para atenderem a novas agendas; a contínua incorporação da tecnologia da informação para o aumento da produtividade, da transversalidade das políticas e da oferta de serviços diretos ao cidadão; e a realização de processos seletivos para a ocupação de cargos comissionados poderiam contribuir igualmente para um aumento considerável do desempenho da administração pública brasileira. Essas ponderações estão longe de indicar soluções. O debate precisa continuar, mas necessita mudar de patamar.
1 comentário em “De qual Estado precisamos para o desenvolvimento?”
A meu ver a questão passa por prioridade. O que é prioridade para nosso país? Quais são os objetivos dos nossos govenrnandes e líderes no médio e no longo prazos? Não há sintonia entre os líderes, não há comunicação responsável entre os partidos para uma discussão dessa natureza, cada qual quer satisfazer a si e aos seus, veja os ministros que sairam deste governo.
No eixo centro-sudeste-sul verifica-se que os investimentos já criaram uma cultura gerencial e de desenvolvimento, pro norte-nordeste-oeste ainda vivemos um “faroeste”… No governo militar se evidenciava um plano de governo para esta região, e hoje? Só hidrelétricas? Só desmatamento? só agronegócio? Não digo que isso seja mal, o problema que tudo vem sem o devido investimento em infraestrutura, sem investimento em tecnologia, sem investimento em educação; sem isso, nossas mentes jovens acabam na droga e no crime…
Não sei se planificar a economia fixando metas para o longo prazo é a alternativa mais viável. O grande problema que percebo é a descontinuidade de quem assume o governo, parece que, o que um faz o outro não continua por que foi o outro que começou.
No meu ponto de vista falta mais atitude, mais liderança e mais coragem, claro, aliada a competência necessária, para o Brasil encontrar seu caminho, cá pra nós, então, estamos atolados na mesmice do me engana qe eu gosto, enquanto nossas riquezas estão se esvaindo.