Brasília – O primeiro debate do segundo turno das eleições na TV, com duração de uma hora e quarenta minutos, no domingo (16), marcou um novo formato considerado inovador, apresentado pela primeira vez ao telespectador através de um projeto idealizado pela Rede Bandeirantes coordenado pelo jornalista Fernando Mitre.
Em quatro blocos, Bolsonaro (PL) e Lula (PT) trocaram acusações e discutiram sobre: educação, privatização, programas sociais, economia e Amazônia, os temas foram tratados superficialmente, entretanto, os destaques foram a discussão sobre vacinas e corrupção. Ambos candidatos negaram a intenção de realizar mudanças na composição do Supremo Tribunal Federal. Ao final, o confronto foi considerado equilibrado com pequena vantagem para Jair Bolsonaro que soube administrar melhor o tempo. O debate gerou um recorde nacional de uma live jornalística no YouTube mundial.
Tecnicamente, a organizações do debate ficou a cargo da TV Bandeirantes, que liderou um pool de outros veículos, com a participação da TV Cultura, portal UOL e jornal Folha de S.Paulo e transmitido também pela CNN Brasil.
Logo na abertura do primeiro bloco, o petista veio com tudo para cima do oponente. Responsabilizou o atual governo por ter atrasado a compra de vacinas durante a pandemia de Covid-19. Já Bolsonaro acusou o petista de corrupção na Petrobras e cobrou quem seria o nome de seu possível ministro da economia. Lula não respondeu e não citou ninguém que comporá a sua equipe ministerial, se limitando a dizer que vai aumentar o número de ministérios, como o dos povos originários, que será dado aos índios.
Os candidatos também trataram de mudanças no Supremo Tribunal Federal (STF) e de crime organizado. Houve interação entre eles no palco e, em alguns momentos, contato físico entre ambos.
A pandemia foi o principal tema do primeiro bloco. Os candidatos podiam fazer perguntas um ao outro e administravam o próprio tempo, de 15 minutos para cada um. Lula perguntou sobre o assunto e afirmou que Bolsonaro “atrasou” a compra de vacinas. O petista acusou Bolsonaro de “carregar 400 mil mortes nas costas”.
“É uma vergonha, na verdade, você carregar nas costas 600 mil mortes que poderiam ter sido evitadas se tivesse comprado vacina no tempo certo. A ciência fala isso todo dia. O senhor recebeu proposta de compra de vacina muito cedo e não quis comprar porque não acreditava”, disse o ex-presidente.
Ele ainda citou declarações de Bolsonaro durante a pandemia, como quando o presidente disse que a Covid-19 era uma “gripezinha”.
O atual presidente defendeu a sua condução no enfrentamento ao coronavírus afirmando que “todos que quiseram tomar vacina tomaram”.
“Foi um dos países que mais vacinou no mundo”, disse, mencionando, em seguida, que o governo disponibilizou mais de 500 milhões de doses à população.
“Menos de um mês depois da primeira dose aplicada no mundo, o Brasil começou a aplicar [a vacina]”, defendeu Bolsonaro. O presidente ainda lembrou que o governo brasileiro “decretou estado de emergência”, porém, não conseguiu evitar a realização do Carnaval em 2020, fato que acelerou a propagação do novo coronavírus.
Por sua vez, Bolsonaro foi duro ao relatar o escandaloso caso do Consórcio de governadores do Nordeste, cujos estados em sua maioria são governados por apoiadores do ex-presidente Lula, que assinou contrato de compra de respiradores com uma empresa que comercializa maconha e seus subprodutos e que não entregou nenhum equipamento do contrato.
Corrupção
Em diversos momentos do debate, Bolsonaro acusou os governos petistas de corrupção e afirmou que o Petrolão foi “o maior esquema de corrupção da história da humanidade”.O candidato do PL disse que o governo Lula começou a construção de refinarias e não terminou, “jogando bilhões pelo ralo”, e que o endividamento da Petrobras equivale a 60 vezes o custo da transposição do [rio] São Francisco.“Esses ladrões devolveram R$ 30 bilhões, fora o que não foi achado”, disse Bolsonaro.Em resposta, Lula afirmou que, “se houve corrupção na Petrobras, não precisava ter quebrado as empresas como quebraram”.“Não tenho nenhum problema de explicar o Petrolão”, disse Lula, que não conseguiu responder sobre o escândalo do seu governo. O petista omitiu que foi ele que loteou a diretoria da Petrobras para partidos políticos em busca de dinheiro e apoio no Congresso. Para se defender, criticou Bolsonaro por ter imposto sigilo de 100 anos em informações do seu governo.
Orçamento secreto
Lula questionou o orçamento secreto, em meio à relação entre Poderes e governabilidade, Lula afirmou querer confrontar as emendas do relator.“Eu vou tentar criar o orçamento participativo, que foi uma coisa que nós criamos nos estados brasileiros”, disse.O petista afirmou ainda que pretende utilizar a internet para aprimorar o orçamento participativo. “Nós vamos pegar o orçamento e mandar para o povo dar opinião.”Bolsonaro negou que tenha comprado o Centrão com o orçamento secreto, afirmando que vetou a medida.Ele disse que 13 deputados do PT direcionaram recursos via emendas do relator e falou que isso “não tem nada a ver com o orçamento secreto”.Pontuou, ainda, que as emendas do relator foram criadas por Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados, e que, se o orçamento estivesse em suas mãos, faria melhor proveito.
STF
Os candidatos falaram ainda sobre propostas em tramitação no Congresso para mudar as regras da composição do STF. O ex-presidente Lula disse não ser prudente nem democrático um presidente “querer ter os ministros da Suprema Corte como amigos”.Segundo ele, os ministros não devem ser indicados para beneficiar o presidente e, sim, pelo currículo.“Eu estou convencido de que tentar mexer na Suprema Corte para colocar amigo, para colocar companheiro, para colocar partidário é um atraso, é um retrocesso que a República brasileira já conhece muito bem. E eu sou contra”, disse.Bolsonaro disse que, da parte dele, está feito o compromisso de “não ter nenhuma proposta” de aumentar o número de ministros.“No momento, o PT tem sete ministros indicados. Eu tenho dois. Se eu for reeleito, indico mais dois”, disse.O presidente afirmou que Lula só é candidato “por causa de um ministro” do STF, em referência à decisão do ministro Edson Fachin de anular as condenações do petista no âmbito da Lava Jato. Ele citou Dilma Rousseff (PT), que, em suas palavras, tentou criar mais quatro vagas no Supremo.
Crime organizado
Bolsonaro mencionou que o ex-presidente teve mais votos em presídios durante o primeiro turno das eleições presidenciais deste ano — dado que tem sido utilizado na propaganda eleitoral gratuita do presidente.“Nos presídios do Brasil, de cada cinco votos você teve quatro”, disse Bolsonaro, ao acusar Lula de ter “afinidade com bandidos”.Ele ainda pautou a violência contra policiais e afirmou que Lula e o candidato a vice-presidente em sua chapa, Geraldo Alckmin (PSB), à época governador de São Paulo, não quiseram transferir o líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Camacho, o Marcola, de um presídio estadual para um presídio nacional, em 2006.
Presença supresa no studio do debate, o ex-juiz da Lava-Jato, Sergio Moro, twitou que nos três primeiros meses do governo Bolsonaro, sob seu comando como ministro da Justiça, a transferência de Marcola foi feita para uma presídio federal de segurança máxima. Moro escreveu: “fizemos em três meses o que o PT não fez em oito anos”.Lula negou ter relação com o crime organizado e disse que, durante seu governo, construiu cinco prisões de segurança máxima. “Se o Alckmin governador não transferiu é porque tinha razão para não transferir”, respondeu Lula.O ex-presidente também afirmou “saber” que Bolsonaro é quem tem relação com esses grupos, mencionando as milícias e a morte da ex-vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco.
Direito de resposta
Em várias ocasiões mais quentes do debate, os candidatos solicitaram direito de resposta. No entanto, ele foi concedido apenas uma vez, para Lula, após Bolsonaro falar que o petista quer fechar igrejas e manter alianças com líderes de esquerda de outros países.Os organizadores entenderam que o ex-presidente deveria ter um acréscimo de tempo para responder às acusações.Lula reclamou: “Eu deveria ter dois direitos de resposta. Fui atingido com mentiras. Você continua descaradamente mentindo”, disse Lula na resposta. Ele ainda citou a compra de imóveis em dinheiro vivo por familiares do presidente.
Considerações finais
Nas considerações finais, Bolsonaro afirmou que espera ter um “país livre, onde seja respeitada a liberdade de expressão”. Ele ainda defendeu pautas ligadas à segurança pública, geração de empregos e ideologia de gênero.“Não queremos que os nossos filhos, ao irem para a escola, frequentem o mesmo banheiro de não heteros. Essa é a política do lado de lá.”O presidente ainda defendeu uma política de combate às drogas. Segundo ele, “só um pai ou uma mãe sabe o que é ter um filho no mundo das drogas”. “Nós não queremos liberar as drogas”, afirmou.O presidente se posicionou contra a liberação do aborto e defendeu a propriedade privada e a legítima defesa.Ao falar por último, Lula disse querer “governar o país democraticamente” e chamou o adversário de “pequeno ditadorzinho”.“Quem defende a democracia e a liberdade sou eu, muito mais do que ele, que é um pequeno ditadorzinho, que quer ocupar a Suprema Corte”, disse Lula, acrescentando que quer dar prioridade aos problemas sociais do país.O candidato à Presidência também citou os números de fome e miséria no Brasil. “Tem 33 milhões de pessoas passando fome neste país que é o maior produtor de alimentos do mundo. Tem gente na fila do osso no país que é o maior produtor mundial de proteína animal”, citou.
A coordenação de campanha de Lula não confirmou se ele participará do debate agendado pela Rede Globo, enquanto Bolsonaro disse que irá a quantos debates for convidado.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.