Diretor-presidente interino da Vale terá desafio de acelerar mineração no Pará

Do ponto de vista econômico, projetos da multinacional são sustentáculo à vida de populações que vivem no complexo minerador de Carajás. Vale participa com até 70% das receitas diretas e indiretas das prefeituras.

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Em meio à turbulência de imagem pela qual tem passado, a mineradora multinacional Vale não tem tido tempo sequer de informar ao mercado o cronograma de seus projetos previstos para o Pará, os quais ela própria anunciou com pompa e circunstância no último trimestre do ano passado, quando tudo parecia ir muito bem. Ninguém sabe dizer, por exemplo, se o cronograma para expansão de Salobo existe e se, também, os demais projetos vão sair do papel num cenário de tantas incertezas que pairam sobre a poderosa companhia. Sob uma névoa de que “nada mudou”, o complexo minerador de Carajás, onde a Vale faz sua fortuna, é o berço de cidades que, hoje, só existem no mapa porque a ex-estatal existe ali.

Nesta segunda-feira (4), embora no Brasil seja feriado de carnaval, o mercado financeiro internacional abriu normalmente e repercutiu o afastamento do diretor-presidente da empresa, Fabio Schvartsman, e a posse do interino Eduardo Bartolomeo. As impressões do mercado sinalizam para o retorno de Schvartsman, cuja gestão foi considerada decisiva para a eficiência de capital que a Vale vinha alcançando. O afastamento dele é considerado temporário por analistas financeiros.

Para além de uma decisão final, a multinacional empossa o novo diretor-presidente após alcançar R$ 73 bilhões de prejuízo desde a tragédia em Brumadinho (MG), em decorrência do rompimento da barragem de rejeitos da mina Córrego do Feijão. A mineradora chegou, inclusive, a adiar a divulgação de seu resultado financeiro, que ocorreria em meados de fevereiro, para o final deste mês.

A atual mudança de comando, embora provisoriamente, pode trazer impactos mais consistentes para a política de negócios da Vale no Pará, especialmente no tocante a projetos anunciados no complexo minerador de Carajás. Todos os empreendimentos da empresa no estado têm desafios, sejam judiciais, sejam ambientais, sejam de produção. O Blog do Zé Dudu fez uma compilação de demandas às quais a Vale precisa dar respostas em sua área de atuação no estado.

Onça Puma (Ourilândia do Norte)

O projeto de níquel Onça Puma é o que mais dá dor de cabeça à Vale no Pará, do ponto de vista jurídico. Volta e meia, o empreendimento é paralisado — como está agora — em razão de queda de braço com comunidades indígenas. Sua paralisação, diga-se de passagem, inibe royalties de mineração às prefeituras de Parauapebas e São Félix do Xingu, em cujos municípios é realizada a lavra do metal, e derruba o recolhimento de taxas e impostos pela Prefeitura de Ourilândia do Norte, que governa no espaço onde a empresa mantém uma usina de beneficiamento.

Serra Leste (Curionópolis)

O projeto de ferro Serra Leste aguarda licença para expansão de capacidade desde 2017, mas nada de sair do papel. Atualmente, Serra Leste tem poder de produção de 6 milhões de toneladas de minério de ferro por ano, e a Vale quer, ao menos, 10 milhões de toneladas. Se o licenciamento não sair, em pouco tempo a economia de Curionópolis — extremamente dependente da Vale — poderá entrar em colapso, sem os royalties e os impostos advindos do empreendimento.

Salobo (Marabá)

O projeto de cobre Salobo tem promessa de passar por uma segunda expansão, o Salobo 3, para que a Vale consiga garantir o ouro do concentrado já negociado com um grupo canadense. Mas a Vale precisa conseguir as licenças ambientais para expandir sua lavra de cobre, o que pode não ser tarefa fácil diante da tragédia de Brumadinho e das toneladas de comentários negativos de que tem sido espécie. Atualmente, Salobo está no olho do furacão — as mais recentes polêmicas reportam até abalos sísmicos nos arredores da mina.

Serra Norte (Parauapebas)

As minas de N4E, N4W e N5, situadas na Serra Norte de Carajás, caminham firme para exaustão. A Vale já está com processo de licenciamento embrionário no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) pedindo autorização para iniciar lavra nos corpos de N1 e N2 porque prevê que em dez anos as atuais reservas exploradas chegam ao fim. Se não conseguir licenciar, o município de Parauapebas pode enfrentar colapso financeiro sem precedentes, uma vez que 70% das receitas atuais (em compensações, impostos e taxas) vêm das operações da Vale.

Serra Sul (Canaã dos Carajás)

A mina de S11D, na Serra Sul de Carajás, é, sem dúvidas, o melhor negócio da Vale e seu custo-benefício chega a ser 70% menor que as operações da Vale em Parauapebas. Isso por si só justifica futuros investimentos para cobrir as perdas do presente, já que a Vale ainda terá de desembolsar muitos bilhões de reais para “superar” a tragédia de Brumadinho, ao menos do ponto de vista judicial. Não é segredo que, por ser o “xodó” da mineradora e sua melhor operação global, S11D deverá ser alvo de expansão de capacidade assim que seu ramp-up (elevação programada de produção) for concluído.

Sossego, Azul e Geladinho (Pebas/Canaã)

A Vale terá de lidar com o encerramento do projeto de cobre Sossego, em Canaã dos Carajás, em 2027, e com a mina de manganês Azul, em Parauapebas, daqui cinco anos. As informações constam do mais recente Relatório Anual da empresa, entregue à Bolsa de Valores de Nova Iorque. As datas podem parecer distantes, mas, em tempos da tão pronunciada palavra “descomissionamento” que emergiu da lama de Brumadinho, o futuro já tem de começar a ser pensado, tanto pela empresa quanto pela sociedade. Além disso, a Vale quer ressuscitar minério de rejeitos na barragem de Geladinho, em Parauapebas, por meio de processo de recuperação. Para tanta coisa, a mineradora multinacional precisará de ter mais que nome e dinheiro, como tem mostrado. A crítica social e a ambiental serão desafios para quem quer que seja o presidente.