Brasília – A diretora-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), a nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala, declarou em visita inédita a países da América Latina, durante reunião na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), na segunda-feira (18), que “o mundo não sobrevive sem a agricultura brasileira”. A economista e política foi, por duas vezes, ministra das Finanças de seu país.
“(…) Precisamos pensar nos desafios futuros, não só do Brasil, mas do mundo todo,” disse Ngozi, a maior autoridade mundial do comércio, reforçando o potencial produtivo e sustentável do setor agropecuário brasileiro. “Estou animada sobre o que o Brasil tem a dizer sobre a área ambiental e as tecnologias produtivas com potencial de descarbonização”.
A fala vem em um momento de alta global nos preços dos alimentos, provocada pela crise nas cadeias globais em meio à pandemia e agravada pelo conflito no Leste Europeu, onde há importantes produtores de commodities como milho, trigo, gás e fertilizantes. Nesse cenário, Ngozi diz que teme por uma “crise de fome sem precedentes” no mundo.
O fornecimento de alimentos já era considerado desafiador no final de 2021; agora, o cenário é ainda mais preocupante. Com a guerra em campos ucranianos, os impactos mais imediatos têm sido o aumento nos preços de alimentos, energia e fertilizantes, dos quais a Rússia e a Ucrânia são grandes fornecedores para o mercado internacional.
Para ajudar a frear a alta global de preços e evitar o aprofundamento da presente crise alimentar, a diretora-geral da OMC destaca que o Brasil terá papel fundamental na ampliação do mercado mundial de alimentos, e por consequência, na segurança alimentar da humanidade.
O deputado Zé Silva (SD-MG), coordenador da Comissão de Comunicação da FPA, ressaltou o potencial de crescimento do agro no Brasil: “O mundo tem três desafios: o conhecimento, a economia verde e a tecnologia. No século XX, o conhecimento foi passado pela ciência, no século XXI, é a velocidade que vai trazer essa tecnologia. O Brasil, felizmente, terá investimento para que nossos produtores trabalhem menos fisicamente e aumentem a produtividade de seus campos.”
Silva enfatizou que a agropecuária brasileira é sustentável e possui técnicas que asseguram a segurança alimentar. “Em relação às nossas lavouras, quando se trata de utilização de pesticidas por tonelada, o Brasil é o 13º do mundo. Quando se fala de hectare, o Brasil é o 7º”, pontuou. “Mesmo com pouco subsídio, os produtores brasileiros são competitivos, produzindo com menos pesticida e acessando mais de 200 mercados com qualidade e eficiência”.
Deputado pelo estado do Pará e vice-presidente da Região Norte da FPA, Paulo Bengston (PTB-PA) atentou à comitiva da OMC para a realidade do setor na região amazônica. “As pessoas precisam comer, vender seus produtos, e o Brasil tem feito isso de uma maneira fantástica, preservando a Amazônia, que tem mais de 80% de área preservada,” disse.
Bengston chamou atenção para a forma que os demais países enxergam a produção de alimentos brasileira: “Insistimos nisso, pois o mundo nos olha de maneira diferente. E desejamos que o Brasil seja visto como é realmente”.
Já o deputado Nelson Barbudo (PL-MT), vice-presidente da Região Centro-Oeste da FPA, informa a diretora-geral da OMC que a legislação brasileira é rígida em relação à proteção ambiental. “Nosso Código Florestal é o mais severo do planeta; nossos agricultores produzem com responsabilidade. É preciso difundir para o mundo que o Brasil não é o responsável por destruir a natureza,” destacou.
Ngozi reconheceu que as práticas brasileiras são sustentáveis: “Acredito que as notícias precisam ser melhor transmitidas. O tipo de conhecimento de práticas sustentáveis que vocês usam não são as utilizadas no resto do mundo, o que vocês estão mostrando não é visto de forma tão sustentável”.
“Encorajo vocês a falarem disso para que seja repetido para o mundo, que aqui existem boas práticas. O que ouvi hoje é muito interessante, incentivo vocês a continuarem com essa pegada, e serem ambientalmente responsáveis,” finalizou.
O presidente do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), Nilson Leitão, destacou que o Brasil é sem dúvida um país com uma riqueza enorme e tem muito a apresentar para o mundo. “Somos ecologicamente corretos, economicamente viáveis e nosso produtor é o verdadeiro ambientalista”.
O IPA e as entidades do setor agropecuário brasileiro foram convidadas pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE) para uma missão junto à OMC, com o intuito de apresentar dados relacionados à produção de alimentos no Brasil.
Recado ao mercado mundial
No encontro, o diretor-executivo da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), Ibiapaba Netto, apresentou uma carta à diretora-geral da OMC, em nome do IPA, com demandas do setor acerca de temas como: sistemas de diligência devida; reconhecimento da agricultura tropical como modo sustentável de produção; ofertas de insumos; e recomposição do órgão de apelação da OMC.
A carta observa que o comércio internacional tem um papel importante na segurança alimentar global, por meio do abastecimento de alimentos em escala e preços acessíveis para diferentes povos. “Em nome de todas as associações do IPA, entendemos que a OMC tem papel fundamental em diversos modelos de produção no mundo todo,” disse Tatiana Campos, diretora de Relações Internacionais da CitrusBR.
“É necessário que o comércio de alimentos e insumos continue aberto para que a crise não vire global. Precisamos garantir a segurança alimentar e evitar maiores impactos,” ponderou Sueme Mori, diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
Números impressionantes
O Brasil é o quarto maior exportador global de grãos – como arroz, cevada, soja, milho e trigo –, atrás da União Europeia, Estados Unidos e China, e o maior exportador de carne bovina, com o maior rebanho bovino do mundo, segundo a Secretaria de Inteligência e Relações Estratégicas (Sire) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
Pesquisa da entidade também diz que o país responde por 50% do mercado de soja e alcançou, em 2020, o posto de segundo maior exportador de milho do mundo, graças às extraordinárias condições das terras do país, que em algumas regiões consegue a exuberância de colher três safras num único ano.
País com maior área tropical do planeta, o Brasil gera US$ 139 bilhões por ano em suas propriedades rurais. É o quarto maior exportador de produtos agropecuários, com quase US$ 101 bilhões anuais, atrás de União Europeia, Estados Unidos e China. Lidera as exportações de carne bovina (US$ 7,4 bilhões), frango (US$ 7,4 bilhões), suco de laranja (US$ 1,8 bilhão), soja (US$ 28,6 bilhões), açúcar (US$ 7,4 bilhões) e café (US$ 5,6 bilhões).
O representante do Brasil na OMC, o embaixador Alexandre Parola, ressaltou o papel do Brasil no comércio mundial e na segurança alimentar como potência agrícola mundial. “O país colabora para a alimentação de uma em cada 10 pessoas no planeta. O Brasil, com apoio da FPA, renova o compromisso de seguir contribuindo para a segurança alimentar global. Temos uma das legislações ambientais mais desenvolvidas do mundo,” disse.
“Estamos diante de uma crise alimentar de escala global, por razões de guerra. Temos convicção que o Brasil tem os atributos para mostrar suas qualificações nas questões verdes, com programas de recuperação de terras degradadas, redução de metano e medidas que fazem do nosso agro eficiente e sustentável,” frisou o embaixador Sarquis José.
O valor bruto da produção agropecuária brasileira deve alcançar mais de R$ 1,22 trilhão em 2022, de acordo com os dados do mês de março publicados pelo Ministério da Agricultura. Em comparação com o mesmo período do ano passado, o valor representa um aumento de 2%, tornando o Brasil o país mais estratégico, entre as demais nações, no que se refere à segurança alimentar mundial.
Quem é Ngozi Okonjo-Iweala?
Ngozi Okonjo-Iweala é economista e política, assumiu o comando da OMC em março de 2021, tornando-se a primeira mulher a ocupar o cargo de Diretora-Geral da entidade. Antes, foi ministra de finanças da Nigéria (2003-2006 e 2011-2015) e ministra de Relações Exteriores em 2006. Tem uma carreira de 25 anos no Banco Mundial, onde chegou ao posto de número 2 da entidade. É formada em Economia pela Universidade de Harvard e tem doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT).