Em ano eleitoral, votações no Congresso terão ritmo lento

Trabalho nas Comissões e avanço das pautas mais importantes serão prejudicados
Sessão conjunta do Congresso Nacional analisa vetos presidenciais

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Brasília – Com os esforços voltados para os seus próprios interesses políticos em ano de eleições gerais, a atividade parlamentar no Congresso Nacional será reduzida ao essencial, no que é conhecido como “recesso branco”, uma espécie de faz de conta que se trabalha. O contribuinte não se iluda, votações andarão a passo de tartaruga, projetos fundamentais comos as reformas administrativa e tributária não terão ritmo e não se deve esperar quase nada do trabalho nas comissões temporárias e permanentes no Parlamento em 2022.

Na retomada dos trabalhos, que na Câmara dos Deputados está prevista para ser presencial apenas após o Carnaval, o Senado seguirá no mesmo ritmo — devagar, quase parando e de forma semipresencial a partir de 1º de fevereiro.

O ano legislativo aguarda a votação imediata, em sessão conjunta, de 36 vetos presidenciais pendentes desde o ano passado. Ainda não há data prevista para deputados e senadores analisarem os vetos, mas essa é a pauta prioritária.

Para rejeitar um veto é necessária a maioria absoluta de votos (ou seja, pelo menos 257 votos de deputados e 41 de senadores) e as sessões conjuntas se dão em duas etapas. Pela manhã votam os deputados. No período da tarde, é a vez dos senadores.

O veto mais recente a ser apreciado é o 10/22, que retirou 14 dispositivos do Projeto de Lei 4.199/2020, transformado na Lei 14.301/2022, que criou o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar). O projeto foi aprovado pela Câmara em dezembro do ano passado.

Esse programa libera, de forma progressiva, o uso de navios estrangeiros na navegação de cabotagem do Brasil, sem a obrigação de contratar a construção de embarcações em estaleiros brasileiros. Entre os itens vetados por Bolsonaro estão a recriação do Reporto (benefício tributário ao setor) e o limite mínimo para a quantidade de trabalhadores brasileiros nas embarcações.

De acordo com a justificativa apresentada pela Presidência da República, a recriação do Reporto incorre em vício de inconstitucionalidade e em contrariedade ao interesse público, pois implicaria renúncia de receitas sem a “apresentação da estimativa do impacto orçamentário e financeiro e das medidas compensatórias”.

Outro item vetado determinava uma quantidade mínima de trabalhadores brasileiros nos navios afretados. O dispositivo estabelecia que a tripulação dessas embarcações deveria ser composta de, no mínimo, 2/3 de brasileiros, numa espécie de reserva de mão-de-obra claramente inconstitucional.

Adoção

Já o veto mais antigo de Bolsonaro aguardando votação dos parlamentares é o VET 14/21, veto total ao Projeto de Lei 8219/2014. De autoria do então senador Antonio Carlos Valadares, o projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados em dezembro de 2019.O texto altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para prever tentativas de reinserção familiar da criança ou do adolescente antes da decisão definitiva de adoção. De acordo com o projeto, a adoção só deve ser concretizada depois de esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa e “as tentativas de reinserção”.Na mensagem de veto, Bolsonaro afirma que, embora meritória, a tentativa de reinserção da criança ou do adolescente na família biológica poderia aumentar o prazo para a adoção. “As tentativas de reinserção familiar da criança ou do adolescente podem se tornar intermináveis, revitimizando os adotandos a cada tentativa de retorno à família de origem, a qual pode comprometer as chances de serem adotados em definitivo”, justificou o presidente.

Tratamento do câncer

Outro item que deve ser votado em breve pelo Congresso é o veto total (VET 41/21) ao projeto que trata do acesso a tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral por usuários de planos de saúde (PL 6.330/2019). O texto foi aprovado pela Câmara em julho do ano passado.De autoria do senador Reguffe (Podemos-DF), o projeto poderia beneficiar mais de 50 mil pacientes com tratamento em casa, sem necessidade de internação hospitalar.Segundo a mensagem de veto encaminhada ao Congresso, o projeto “comprometeria a sustentabilidade do mercado”, “criaria discrepâncias” e “privilegiaria pacientes acometidos por doenças oncológicas que requeiram a utilização de antineoplásicos orais”. Ainda de acordo com o Executivo, “o alto custo dos antineoplásicos orais” poderia comprometer a “sustentabilidade do mercado de planos privados de assistência à saúde”.

Lúpus e epilepsia

Senadores e deputados também terão de apreciar o veto total (VET 33/21) ao projeto, do senador Paulo Paim (PT-RS), que prevê a inclusão do lúpus e da epilepsia na lista de doenças com benefícios da Previdência Social (PL 7.797/2010). A redação final do projeto foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara em maio do ano passado.

Quebra de patentes

Também foi vetado, mas parcialmente, o Projeto de Lei 12/2021, que permite ao governo federal quebrar a patente para produzir medicamentos e vacinas nos casos de emergência nacional ou internacional em saúde. O texto foi aprovado pela Câmara em julho do ano passado.

Mesmo com veto parcial o PL foi transformado na Lei 14.200/2021e já está em vigor.Agora os parlamentares precisam analisar os cinco dispositivos vetados pelo presidente Bolsonaro (VET 48/21), que determinam a quebra temporária de patentes de vacinas e insumos em períodos de emergência ou estado de calamidade pública.

Absorventes higiênicos

Objeto de muito polêmica e utilizado como “cavalo de batalha” política de partidos da oposição,está na pauta o veto presidencial à distribuição gratuita de absorventes higiênicos para estudantes dos ensinos fundamental e médio, mulheres em situação de vulnerabilidade e mulheres detidas (VET 59/21). A oposição encenou a crucificação de Bolsonaro, que vetou parte do Projeto de Lei 4.968/2019, da deputada Marília Arraes (PT-PE), aprovado pela Câmara em agosto do ano passado. Muita gritaria para quase nada, uma vez que o PL já foi transformado na Lei 14.214/2021.No veto,o governo alega que “os absorventes higiênicos não se enquadram nos insumos padronizados pelo SUS, portanto não se encontram na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais, além disso, ao estipular as beneficiárias específicas, a medida não se adequaria ao princípio da universalidade, da integralidade e da equidade no acesso à saúde do SUS que tem caráter de atendimento universal”.Os defensores da derrubada do veto ressaltam a gravidade do problema da chamada “pobreza menstrual”, a falta de acesso a absorventes, considerados itens básicos de higiene.

Eletrobras

O Congresso não pode mais “empurrar com a barriga” a decisão sobre o veto parcial (VET 36/21) ao projeto de lei de conversão que modificou a Medida Provisória de privatização da Eletrobras (MP 1.031/2021). O texto foi aprovado pela Câmara em maio do ano passado e transformado na Lei 14.182/2021.Bolsonaro vetou diversos artigos, como a possibilidade de empregados demitidos após a privatização adquirirem ações da empresa com desconto. Para ele, vendas de ações dessa forma tipificam conduta ilegal de distorção de práticas de mercado.Também foi vetada a permissão para que funcionários demitidos da Eletrobras até um ano após a privatização sejam realocados em outras empresas públicas. Nesse caso, Bolsonaro alegou que práticas desse tipo violam a Constituição em relação ao acesso a emprego público por concurso.

Renegociação de dívidas

Outra pendência é o veto total (VET 8/22) ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 46/2021, de autoria do senador Jorginho Mello (PL-SC). O projeto, aprovado em dezembro pela Câmara dos Deputados, institui um programa de renegociação de dívidas para micros, pequenas empresas e micro empreendedores individuais.Na mensagem de veto, o governo alega vício de inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, pois o benefício fiscal implicaria em renúncia de receita, violando a Lei de Responsabilidade Fiscal. Na justificativa enviada ao parlamento, a mensagem do Veto se refere também a vedação imposta pela Lei Eleitoral, que em seu parágrafo 10, artigo 73, veda expressamente a distribuição de benefícios pela administração pública em ano de eleições. A medida tem caráter de evitar que o presidente em exercício se utilize da máquina estatal para angariar votos para uma possível reeleição.Batizado com a sigla Relp, o Programa de Reescalonamento do Pagamento de Débitos no Âmbito do Simples Nacional concederia descontos sobre juros, multas e encargos proporcionalmente à queda de faturamento em plena pandemia de Covid-19, no período de março a dezembro de 2020, em comparação com o período de março a dezembro de 2019. Empresas inativas no período também poderiam participar.

Transporte de passageiros

O VET 7/22 também aguarda votação. Ele foi aposto ao Projeto de Lei 3.819/2020, do senador Marcos Rogério (DEM-RO), aprovado pela Câmara em dezembro e transformado na Lei 14.298/2022, que tornou mais rigorosos os critérios para transporte rodoviário de passageiros.A lei trata apenas de autorizações, por meio das quais o poder público transfere por delegação a execução de um serviço público para terceiros, sem que haja necessidade de licitação, como no caso das permissões. A norma não fixa limite para o número de autorizações.O presidente Bolsonaro vetou dispositivo que cancelaria a cobrança anual de R$ 1,8 mil como taxa de fiscalização da prestação de serviços e de exploração de infraestrutura para cada unidade de ônibus registrado pela empresa detentora de autorização ou de permissão outorgada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Bolsonaro alega que o dispositivo incorre em vício de inconstitucionalidade e contraria o interesse público por representar impacto fiscal negativo.

Confira os outros vetos pendentes de votação

• Programa emergencial de retomada do setor de eventos durante a crise sanitária da covid-19 (VET 19/21, aposto ao PL 5.638/2020);

• Marco legal das startups, com benefícios tributários para investidor pessoa física e condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte ao mercado de capitais (VET 25/21, aposto ao PLP 146/2019);

• Propaganda partidária gratuita (VET 2/22, aposto ao PL 4.572/2019);

• Criação da Procuradoria Regional da República da 6ª Região (VET 1/22, aposto ao PL 6.537/2019);• Tornar crime a disseminação de notícias falsas capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral (VET 46/21, aposto ao PL 2.462/1991);

• Gestão de cargos do Executivo (VET 50/21, aposto à MP 1.042/2021);

• Mudanças no quantitativo de candidaturas (VET 55/21, aposto ao PL 783/2021);• Alterações da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021 (VET 56/21, aposto ao PLN 12/2021);

• Mudanças nas cobranças de IPI dos municípios (VET 58/21, aposto ao PL 1.559/2019);• Batiza a BR-153 de ex-presidente João Goulart à BR-153 (VET 60/21, aposto ao PL 4261/2012);

• Alterações no Fundo Garantidor de Infraestrutura (VET 61/21, aposto à MP 1.052/2021);• Política Nacional de Dados e Informações relacionadas à Violência contra as Mulheres (VET 62/21, aposto ao PL 5.000/2016);

• Isenção de IPI na compra de carro por pessoa com deficiência e taxista (VET 73/2021, aposto ao PL 5.149/2020);• Alteração no limite de proteção de margens de rios e lagos em área urbana (VET 72/21, aposto ao PL 2.510/2019);

• Anistia infrações e anula multas por atraso na entrega da Guia de Recolhimento do FGTS (VET 71/21, aposto ao PL 7.512/2014);• Programas Auxílio Brasil e Alimenta Brasil (VET 70/21, aposto à MP 1.061/2021);

• Alteração na Lei do Fundeb (VET 69/21, aposto ao PL 3.418/2021);

• Crédito suplementar em favor do Serpro, Dataprev dentre outros (VET 68/21, aposto ao PLN 40/2021);

• Marco legal das ferrovias (VET 67/21, aposto ao PL 3.754/2021);

• Imunidade tributária de entidades beneficentes (VET 66/21, aposto ao PLP 134/2019);• Incentivos à indústria da reciclagem (VET 65/21, aposto ao PL 7.535/2017) e finalmente o veto ao• Estatuto da Pessoa com Câncer (VET 63/21, aposto ao PL 1.605/2019).

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.