Brasília – A Prefeitura de São Félix do Xingu enviou nota ao Blog do Zé Dudu em resposta à Reportagem publicada no dia 28 de julho de 2021, sob o título “MPF recomenda consulta aos indígenas para construção de estrada na Terra Indígena Apyterewa”, em resposta ao Ministério Público Federal (MPF) que havia notificado a Prefeitura de São Félix do Xingu, o governo do Pará, o governo federal e a Fundação Nacional do Índio (Funai) para que nenhum desses entes governamentais podem autorizar ou realizar qualquer obra dentro da Terra Indígena Apyterewa sem consultar previamente o povo Parakanã, a quem pertence o usufruto exclusivo do território. Esse é o entendimento do fiscal da Lei que advertiu as autoridades públicas sobre a legislação que protege os direitos da comunidade indígena. Leia a íntegra da recomendação.
Ocorre que o prefeito de São Félix do Xingu, João Cleber (MDB), esclarece que o processo de desintrusão da área demarcada como Terra Indígena Apyterewa encontra-se suspenso por ordem judicial prolatada nos autos de Mandado de Segurança de nº.0002570-42.2011.4.01.3901, em trâmite perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
As terras são ocupadas por cidadãos carentes e agricultores assentados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em um projeto de assentamento do próprio governo federal, há mais de 30 anos. A extensão da área demarcada é de 773 mil hectares.
Um dos advogados que militaram no caso afirma à Reportagem que segundo os laudos antropológicos da Funai – na época do governo Dilma Rousseff (PT), respaldados pelo então ministro da Justiça José Eduardo Cardozo –, a ordem, desde o primeiro governo, quando o PT conquistou o poder federal, era demarcar o maior número de reservas indígenas, custe o custar.
Nesse caso, o escândalo é evidente, como sublinha trecho da nota enviada ao Blog pela prefeitura de São Félix do Xingu. “O MUNICÍPIO esclarece também que os indígenas atualmente habitantes da área demarcada como terra indígena Apyterewa são indígenas refugiados procedentes da terra indígena Parakanã e chegaram na indigitada área bem depois de os colonos não-índios, sendo que a área inicial da Apyterewa fora adquirida pela FUNAI do conhecido senhor ‘Mucuim’ para abrigar estes indígenas afugentados de suas terras de origem, qual seja a terra indígena Parakanã”.
A ação
A ação, julgada em segundo grau pela relatora do processo, a desembargadora federal Gilda Sigmaringa Seixas, foi impetrada pela Prefeitura de São Félix do Xingu e Associação dos Pequenos Agricultores Rurais do Projeto Paredão (APARPP).
Trata-se de petição apresentada pela APARPP, às fls. 1797/1802, pela qual se requer a renovação da suspensão deferida neste feito à fl. 1746, pelo então Coordenador-Geral do SistCon, Desembargador Federal Cândido Ribeiro, no sentido de obstar pelo prazo de 30 dias “todo e qualquer ato ou ação relativa à desintrusão na TERRA INDIGINA APYTEREWA a fim de viabilizar as tratativas pendentes a um possível acordo entre as partes”.
Analisando o processo, a Reportagem constatou que a requerente informa que está em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal (STF) o Mandado de Segurança n. 26.853, tendo como relator o Ministro Gilmar Mendes, cujo objeto é o Termo de Garantias firmado pelo Governo Federal por intermédio do então Ministro da Justiça, juntamente com o Presidente da FUNAI, o Presidente do Incra e o Secretário Nacional do Programa Terra Legal, onde asseguraram que os colonos só seriam removidos da área após devidamente indenizados e reassentados em terra com moradia já construída, conforme se verifica à fl.74 dos presentes autos eletrônicos.
Acrescenta, à fl. 76, “que nos indigitados autos de MS 26.853 de relatoria do eminente Ministro Gilmar Mendes busca-se a revisão dos limites da demarcação da área expandida como terra indígena, onde a própria FUNAI reconhece a delimitação da área de real ocupação indígena, nos termos do Mapa Oficial da FUNAI anexo (doc. 01), em observância ao art. 231 da Constituição da República”.
De acordo com a desembargadora, em consulta ao sítio eletrônico daquele Excelso Tribunal Federal, “verifico que, conforme noticiado pela associação requerente, na data de 26 de maio do ano de 2020, DJE de 28/05/2020, o Ministro Gilmar Mendes, ao analisar pedido formulado no mencionado mandado de segurança, assim decidiu, verbis: ‘Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Município de São Félix do Xingu e associações de agricultores contra ato Presidente da República (Governo Lula da Silva, por seu ministro da Justiça), consubstanciado na edição do Decreto de 19 de abril de 2007, que homologou o processo de demarcação da terra indígena Apyterewa como reserva para assentamento da comunidade dos índios Parakanã e Araweté’. Em 22.10.2019, neguei seguimento ao writ considerando que as provas pré-constituídas que acompanham os autos demonstram ter sido oportunizada a ampla defesa e o contraditório aos interessados nas terras demarcadas, tendo sido seguido o procedimento do Decreto 1.775, não verificando assim a existência de direito líquido e certo a amparar a pretensão dos impetrantes.
O Município de São Félix do Xingu interpôs agravo regimental em face da referida decisão, o qual foi pautado para o julgamento virtual na sessão que se iniciaria em 24.4.2020. Todavia, em 21.4.2020, o recorrente peticionou (eDOC 44), requerendo a retirada do processo do julgamento virtual e propondo a remessa dos autos ao Núcleo de Conciliação para ser promovida uma tentativa de conciliação entre as partes. Na ocasião, aduziu a existência de Mapa Oficial que revelaria uma predisposição dos entes públicos litigantes neste feito para uma provável conciliação. Em 22.4.2020, retirei o processo de pauta. Tendo em conta que grande parte das ações relativas a conflitos entre agricultores e indígenas decorrem, muitas vezes, da ausência de prévio diálogo sobre a possibilidade de solução amigável, intime-se a União sobre o interesse na tentativa de conciliação proposta pelo Município de São Félix do Xingu”, decidiu a desembargadora.
A União, devidamente intimada da decisão retro, a fim de aguardar a manifestação dos órgãos partes do MS 26.853, requereu a dilação do prazo por mais 30 (trinta) dias para se manifestar acerca da possibilidade de conciliação proposta pelo Município de São Félix do Xingu, pedido este que foi deferido pelo Ministro Relator do mandamus aos 25 de junho do presente ano, conforme se verifica no sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal. Sustenta, por fim, a requerente que “tal conciliação acenada positivamente pela União, por certo gerará uma economia de ordem bilionária aos cofres públicos, pois não mais serão necessários gastos com reassentamentos nem com indenizações para estes milhares de famílias, consoante restou decidido neste feito, onde restou imposto ao INCRA e à FUNAI obrigação de indenizar e reassentar todos os colonos habitantes da área alvo da ampliação da terra indígena em no máximo 60 (sessenta) dias. (fl. 79) Requer a associação, alegando ainda a ‘iminência de o presente feito perder seu objeto em razão conciliação nos autos de MS 26.853 no âmbito do Supremo Tribunal Federal’, que seja renovada a suspensão outrora deferida neste feito à fl. 1746, de todo e qualquer ato ou ação relativa à desintrusão da área demarcada como terra indígena Apyterewa, enquanto perdurar a suspensão neste presente feito atrelada ao desfecho das tratativas amigáveis nos autos de MS 26.853, na Suprema Corte da República”. É breve o relatório. Decido. Diante do exposto e considerando, ainda, que este Núcleo de Conciliação tem como uma de suas finalidades precípuas a solução dos conflitos pela via consensual, SUSPENDO pelo prazo de 30 (trinta) dias todo e qualquer ato ou ação relativa à desintrusão na TERRA INDÍGINA APYTEREWA, devendo, após o mencionado termo, as partes informarem sobre a realização do acordo anunciado nos autos do Mandado de Segurança n. 26.853. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 30 de julho de 2020.
Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas
Coordenadora Geral do Sistema de Conciliação do TRF da 1ª Região SistCon
Respaldado nessa decisão, o prefeito João Cléber pediu a publicidade da seguinte nota:
NOTA À IMPRENSA
“O MUNICÍPIO DE SÃO FELIX DO XINGU – ESTADO DO PARÁ, por intermédio de seu Prefeito vem esclarecer inicialmente que a desintrusão da área demarcada como terra indígena Apyterewa encontra-se suspensa por ordem judicial prolata nos autos de Mandado de Segurança de nº.0002570-42.2011.4.01.3901 em trâmite perante o TRF1.
O MUNICÍPIO esclarece que no referido Mandado de Segurança resta assegurado o direito de os colonos serem indenizados e reassentados pelo Governo Federal previamente à desintrusão, razão pela qual não há que se falar em invasão por parte das famílias dos colonos de boa-fé.
O MUNICÍPIO esclarece ainda que consta anexo Ofício da própria FUNAI datado de 05/04/1993 onde relata que na área já residiam cerca de 4 a 5 mil não-índios, ou seja, mais de uma década antes da demarcação os colonos não-índios já habitavam a área.
O MUNICÍPIO esclarece também que os indígenas atualmente habitantes da área demarcada como terra indígena Apyterewa são indígenas refugiados procedentes da terra indígena Parakanã e chegaram na indigitada área bem depois de os colonos não-índios, sendo que a área inicial da Apyterewa fora adquirida pela FUNAI do conhecido senhor “Mucuim” para abrigar estes indígenas afugentados de suas terras de origem, qual seja a terra indígena Parakanã.
O MUNICÍPIO esclarece que como na área habitam milhares de famílias com milhares de crianças, as quais são seres humanos e necessitam de assistência pública mínima para suas subsistências, o Município entendeu, por questão de humanidade, no mínimo garantir o direito constitucional de ir e vir, consistente na trafegabilidade de suas estradas até que o poder público possa encontrar uma destinação e assistência humana para tais famílias as quais, repita-se, encontram-se na área antes dos seus irmãos indígenas.
O MUNICÍPIO esclarece ainda que a trafegabilidade nas estradas atende também ações de fiscalizações por parte do poder público, encontrando-se inclusive dezenas de viaturas do Exército Brasileiro e viaturas policiais fazendo uso das estradas e que se o Município não garantir a trafegabilidade, restaria impossível tais ações por parte do poder público.
O MUNICÍPIO esclarece por derradeiro que presta assistência indistintamente a todos seus munícipes e não somente a uma classe com privilégio, pois entende que todos são seres humanos em busca de uma vida melhor para suas famílias, sendo que a grande maioria destes colonos que hoje habitam no Município de São Félix do Xingu (PA), aqui estão por terem atendido ao chamado do Governo Federal ainda nas décadas de 70 e 80 com o slogan “Integrar para não entregar”, de modo a fulminar a vulnerabilidade de nossa Amazônia aos escusos interesses estrangeiros. Portanto, Imperioso esclarecer que se a Amazônia ainda pertence à nação brasileira, tal mérito sim deve se recair sobre estes desbravadores que hoje imprensa (sic) os intitula de “invasores”.
O MUNICÍPIO se coloca à inteira disposição da imprensa para eventuais esclarecimentos adicionais, pois aqui é onde vivemos a dura realidade e não lendas literárias ideológicas, sempre pautados pelos Princípios Constitucionais que devem reger à Administração Pública.
São Félix do Xingu (PA), aos 27 de Julho de 2021.”JOÃO CLÉBER DE SOUZA TORRES
Prefeito de São Félix do Xingu
Entenda o caso
A área amarela é a primeira área demarcada pela Funai em 1987, 266.100 mil hectares pela portaria nº3632/87. A área amarela, vermelha e verde, referida pelo laudo antropográfico à delimitação de 980 mil hectares como terras tradicionalmente ocupadas pelos índios Parakanãs. Laudo antropológico publicado no Diário Oficial da União (DOU) do dia 10 de dezembro de 1991.
O referido laudo, foi acatado pelo Ministério da Justiça, em 28 de maio de 1992, foi editada a portaria nº 267/92, reconhecendo os 980 mil hectares como terras tradicionalmente ocupadas pelos índios Pakaranãs. Em 2001, o então ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira Filho, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) editou a portaria nº 1192/01, anulando a portaria nº 267/92 e reduzindo a Terra Indígena para 773 mil hectares e retirando uma área de 207 mil hectares. Sem nenhum novo estudo de laudo antropológico que é esta demarcada de vermelho no mapa acima.
Por Val-André Mutran – de Brasília