Brasília – O governo federal continua, reiteradamente, penalizando a população que precisa dos serviços públicos sem que nenhuma providência seja tomada pelos organismos de controle para conter o avanço sobre direitos dos cidadãos. Solapado por altos impostos, alta da inflação que pulveriza o poder de compra do salário e com 16 milhões de brasileiros passando fome, o Estado escravizador conta com a parceria do Congresso Nacional para tornar a vida do brasileiro ainda mais difícil. Não seria exagero a frase: “Tudo ao Estado, nada ao povo”.
Duas medidas em curso nessa semana são desalentadoras, mas ilustram situações que se confirmadas, criarão ainda mais dificuldade para o já penalizado povo brasileiro.
A primeira medida, absolutamente fora da curva e provavelmente inconstitucional foi anunciada no início da semana pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Após a vigência da famigerada bandeira tarifária que penaliza o consumidor como se o mesmo fosse o responsável por condições climáticas adversas que obrigam o sistema nacional de geração e distribuição de energia elétrica a utilizar usinas termelétricas — ocasionando a explosão do preço da tarifa —, na prática, obriga o consumidor a “pagar o que não deve” pela incompetência histórica das empresas que operam no setor e que não fazem os investimentos necessários para estabilizar a oferta energética, muito menos o governo demonstra a mínima competência para criar uma política de geração de energia alternativa que equacione as necessidades de consumo no país.
Com apetite insaciável das empresas do setor e com a conivência da Anael, a agência anunciou na nesta terça-feira (15) a contratação de um empréstimo de até R$ 5,3 bilhões pelo setor elétrico com o objetivo de fazer frente aos custos adicionais decorrentes da crise hídrica enfrentada no ano passado. A pergunta é:
— O que o consumidor tem com isso?
A resposta é desanimadora, porque o financiamento a ser tomado pelas distribuidoras, porém, pode chegar a R$ 10,5 bilhões, caso sejam necessários mais recursos para arcar com custos de um leilão emergencial de energia realizado no ano passado. E quem pagará a conta será o consumidor, mais uma vez, como sempre acontece nesses casos.
A operação foi estruturada com o apoio do governo após a bandeira tarifária de “escassez hídrica”— outro assalto ao consumidor — não ter sido suficiente para pagar integralmente os custos de termelétricas acionadas em 2021, quando as hidrelétricas sofreram com a pior seca em mais de 90 anos.
O financiamento também deverá cobrir custos com importação de energia de outros países e com o bônus dado a consumidores do mercado regulado que reduziram voluntariamente o consumo de energia. Também foram contemplados na conta diferimentos homologados pela Aneel em processos tarifários de 2021 e 2022. Tudo é criado para penalizar o brasileiro.
A proposta aprovada em reunião extraordinária prevê uma operação financeira com valor-teto de R$ 5,3 bilhões e liberação de recursos prevista para a primeira quinzena de abril. O valor aprovado ficou um pouco abaixo dos R$ 5,6 bilhões indicados inicialmente em consulta pública, após revisão de alguns parâmetros.
A Aneel também abriu espaço para que as distribuidoras acessem uma segunda parcela de recursos, de até R$ 5,2 bilhões, para arcar com custos de uma contratação de energia realizada pelo governo num momento crítico da crise hídrica.
Essa segunda canche está pendente de nova avaliação pela agência. A Aneel entende que, no momento, ainda não há clareza sobre quais serão os custos dessa licitação ao mercado cativo para o período de maio a dezembro deste ano.
A cifra total ficou aquém dos R$ 15 bilhões de reais que chegou a ser projetada pelo mercado no fim do ano passado, quando os reservatórios das hidrelétricas estavam em condições piores e o saldo negativo para as distribuidoras era maior.
Impacto tarifário
Segundo a Aneel, a operação evitará uma “sanfona tarifária”, isto é, uma alta muito expressiva num primeiro momento com o repasse dos custos, seguida de uma queda acentuada após a quitação da conta.
Essa é a segunda ajuda financeira aprovada para o setor elétrico em menos de dois anos. Em junho de 2020, as distribuidoras contraíram um financiamento emergencial, da Conta-Covid, para compensar a perda de receita que tiveram com a pandemia de Covid-19 e garantir o fluxo de pagamentos no setor.
A conivência do Congresso com o Governo em desfavor do povo
Como se não fosse pouco, o Congresso Nacional está em vias de aprovar outra penalidade ao povo. Na sessão de terça-feira (15), a Câmara dos Deputados, aprovou o projeto de lei do Senado que disciplina o pagamento de peritos da Justiça pelo Executivo federal em causas contra o INSS, determinando aos autores da ação a antecipação dos valores da perícia se tiverem recursos para tanto. Devido às mudanças no texto (PL 4491/2021), a proposta retorna ao Senado.
Na prática, o projeto determina que quem perder ações de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez deverá pagar os honorários das perícias médicas realizadas pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
O projeto foi aprovado em votação simbólica. Como houve mudanças, volta para o Senado.
É um caso clássico em que os congressistas trabalham contra o povo brasileiro para aliviar o Governo de arcar com os custos que lhe cabem, que são obrigatórios e constitucionais.
O texto, relatado pelo deputado Hiran Gonçalves (PP-RR), muda completamente o projeto aprovado pelo Senado, de autoria do senador Sérgio Petecão (PSD-AC). A proposta original previa que o governo deveria pagar perícias já realizadas e as que ocorressem até 31 de dezembro de 2024. A regra valeria para ações em que o INSS figurasse como parte e que fossem de competência da Justiça Federal.
Numa guinada até agora inexplicável, o texto mudou de ponta a cabeça. Na Câmara, os deputados acrescentaram dispositivos que tratam dos honorários periciais e de requisitos para dar entrada em processos e medidas cautelares em ações envolvendo benefícios por incapacidade.
De acordo com o texto, a parte derrotada deverá pagar a perícia médica judicial realizada em ação que tenha o INSS como parte e que discuta a concessão de benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou auxílios previdenciários por incapacidade laboral — como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. A regra não se aplica a quem tem direito à gratuidade judicial.
Na maior cara de pau, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou ter negociado com o senador Sérgio Petecão que as alterações feitas pelos deputados sejam mantidas. “Ele entendeu que é necessário para o INSS que novas regras sejam estabelecidas, que a gente possa avançar nessa questão da regulação do pagamento e aceitou essas emendas, estão acordadas com ele”, afirmou. Ou seja, o Senado também trabalha contra o povo nesse projeto.
Barros defendeu ainda a proposta aprovada na Câmara. “Não há recursos para pagar a perícia. Nós vamos aprovar o projeto e depois temos que aprovar um PLN [projeto de lei do Congresso] para alocar no INSS os recursos para pagar as perícias do ano passado, as desse ano e as que irão ser feitas até o final do ano”, ressaltou, isentando o governo de uma responsabilidade constitucional que lhe cabe exclusivamente.
É uma imoralidade e essa lei deve ser contestada assim que for aprovada. E a Comissão de Constituição e Justiça nada viu de errado na inconstitucionalidade da matéria.
“A perícia quem deveria pagar era a Justiça Federal. A Justiça Federal cortou o orçamento das perícias e pediu ao governo que temporariamente assumisse esses custos, e o governo assumiu por dois anos os custos das perícias”, ressaltou. Mas, agora, segundo texto modificado na Câmara, quem vai pagar é o trabalhador que contribui ao INSS.
“Agora esse projeto vem prorrogar essa excepcionalidade, porque nós estamos pagando uma despesa que é do Judiciário. O governo perde muito dinheiro porque não são feitas as perícias e os contratos de trabalho ficam suspensos. Nós queremos pagar as perícias, não é obrigação do governo, mas o governo está assumindo o ônus que é da Justiça para que os peritos possam trabalhar e ser remunerados”. O deputado não disse sequer uma palavra sobre o ônus que isso representa ao segurado do INSS, como num joguete de cartas marcadas.
O projeto também altera a lei sobre os planos de benefícios da Previdência Social e inclui um dispositivo sobre disputas judiciais e medidas cautelares relativas a acidentes de trabalho.
Segundo o artigo inserido na lei, quando a ação tiver como base ato da perícia médica federal, a petição inicial deverá conter, além dos requisitos obrigatórios, descrição clara da doença e das limitações que ela impõe, além da indicação da atividade para a qual o autor alega estar incapacitado.
Também deverá incluir possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial contestada e declaração sobre a existência de ação judicial anterior, com esclarecimento dos motivos pelos quais o autor questiona a decisão anterior.
O projeto estabelece os documentos que devem embasar a petição inicial, como comprovante de indeferimento ou não prorrogação do benefício, documento sobre a ocorrência do acidente de trabalho apontado como causa da incapacidade e atestado médico referente à doença alegada como a causa da incapacidade. Os deputados aprovaram um excrecência de lei que aumenta a burocracia a níveis insuportáveis, provavelmente apostando na desistência do segurado pela busca de seu direito. É uma aberração.
O projeto também muda regra sobre a contribuição à Previdência para quem fez aportes até julho de 1994, em uma tentativa de evitar prática que aumentava o valor do benefício — conhecido como “milagre da contribuição única”.
Pelo visto, por essas e outras muito mais, o povo é sempre quem pagará o “pato”, mais uma vez.
As duas medidas se somam a outras que vão direto para a conta do governo e dos congressistas, e em outubro desse ano, eles saberão o peso que isso vai representar.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.