Por Valdinar Monteiro de Souza
Não, não é a população de todo o Estado que deverá votar no plebiscito para criação dos Estados de Carajás e do Tapajós. Não, não é! Entre o constituinte originário de 1988 e o congressista (ou mesmo constituinte derivado) de 1998, estou e estarei sempre com o primeiro. Jurei solenemente defender a Constituição e as leis, mas – entenda-se – as leis constitucionais, porque lei inconstitucional não é lei. Pode ser tudo, mas lei não é e, não sendo lei, a ninguém obriga. Não pode criar nem modificar ou extinguir direitos e obrigações. Não obriga a fazer ou deixar de fazer (Constituição, artigo 5.º, inciso II).
O legislador constituinte originário de 1988 disse que, para a criação de Estado, deve ser consultada a população diretamente interessada (Constituição Federal, artigo 18, parágrafo 3.º). A mesma expressão – “população diretamente interessada” – empregou para a criação de Município (Constituição Federal, artigo 18, parágrafo 4.º). E o Supremo Tribunal Federal, em ações julgadas em 1992 e em 1994, disse que população diretamente interessada é a população da área que se quer desmembrar e que somente ela deverá ser chamada a votar. Os deputados federais e senadores, por conseguinte, não poderiam jamais, sem antes alterar a Constituição, dizer em 1998, como disseram no artigo 7.º da Lei de Plebiscitos e Referendos, que quem deverá votar é a população das duas áreas: área que se quer desmembrar e área que sofrerá o desmembramento.
Eles disseram, mas não vale, não haverá de prevalecer. O mesmo infortúnio – a saber, o da invalidez – haverá de ter a decisão administrativa do Tribunal Superior Eleitoral tomada em 30 de junho de 2011, na parte que diz que a população de todo o Estado do Pará deverá ser chamada a votar. É inconstitucional essa decisão administrativa do Tribunal Superior Eleitoral, como inconstitucional foram, em 1998, a decisão do Congresso Nacional, que aprovou, e a do presidente da República, que não vetou, a parte da Lei de Plebiscitos e Referendos que diz ser a população de todo o Estado que deverá votar. O Tribunal Superior Eleitoral não deveria ter feito o que fez agora, assim como o Congresso Nacional não deveria ter feito o que fez em 1998. Lei inconstitucional não é lei, porque não está inserta no ordenamento jurídico, uma vez que, para ser inserta no ordenamento jurídico, é imprescindível que a lei seja constitucional. A constitucionalidade da lei ou ato normativo, em sistemas jurídicos como o nosso, é condição “sine qua non” para sua validade.
A decisão do Tribunal Superior Eleitoral, conquanto seja administrativa, tinha, antes de tudo, que ser constitucional, juridicamente válida. Nessa parte, não foi. Mas eu já tinha alertado para isso, nos artigos escritos anteriormente, nas entrevistas dadas à imprensa e nas manifestações orais que fiz em reuniões sobre o assunto. Eu temia que o Tribunal Superior Eleitoral fizesse o que fez, apenas torcia para que ocorresse o contrário (que, infelizmente, não ocorreu). Com a palavra, portanto, o Supremo Tribunal Federal, para defender a Constituição, como seu guardião que é, e fazer prevalecer suas decisões. A esperança do povo diretamente interessado não pode ser aniquilada! “Limitam-me os ditames do direito” (Sófocles, Filoctetes 660).