Brasília – Ao que tudo indica, será difícil a aprovação do relatório final que propõe a modernização do Código de Mineração (Dec. Lei nº 227/1967) no Grupo de Trabalho (GT) criado pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados para tratar do complexo tema. Numa nova tentativa de votação do texto na manhã desta quinta-feira (16), a matéria não foi analisada mais uma vez e alguns parlamentares ligados ao meio ambiente, preveem que o GT será extinto esse ano sem votar a matéria. O clima é de grande disputa entre os antagonistas.
A relatora do GT, Relatora do Grupo de Trabalho de modernização do Código de Mineração, deputada Greyce Elias (Avante-MG) refutou acusações de que o relatório beneficia grandes mineradoras. O texto tem enfrentado divergências internas na reta final do trabalho.
Em busca de consenso, a relatora, já apresentou duas versões de parecer, enquanto outros parlamentares manifestaram a intenção de formalizar votos em separado já contando com a rejeição do relatório final.
Na reunião da quarta-feira (15), Greyce chegou a pedir mais tempo para aperfeiçoar seu relatório, mas o coordenador do grupo de trabalho, deputado Roman (Patriota-PR), manteve a votação na pauta desta quinta.
“Eu tinha gerado compromisso olho no olho com todos de que votaríamos neste ano. A maioria que está aqui quer que vote, dê o resultado que der. Existem artifícios regimentais que a senhora pode usar e pode não sair (a votação)”.
Líderes partidários (PSB, PT, PV, REDE, PC do B, PSOL e PDT), coordenadores de oito frentes parlamentares ligadas a meio ambiente, direitos humanos e comunidades tradicionais, além de várias entidades da sociedade civil já haviam divulgado uma carta aberta “em defesa de um novo Código de Mineração popular e socioambientamente sustentável”. A carta diz que o relatório final traz medidas que “liberam a atividade minerária de forma automática e sem o devido controle da Agência Nacional de Mineração; conferem primazia à exploração mineral e garimpeira atribuindo a ela prioridade em relação à proteção ambiental, aos direitos territoriais, a outras formas e modalidades de uso do solo e destinação de terras”.
Parte dessas críticas foram reproduzidas pela AMIG, Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil, inclusive quanto à ligação de alguns parlamentares do GT a grandes grupos de mineradores.
Na quarta, Greyce Elias leu uma “nota de repúdio” para rebater as críticas e garantir que as doações para as campanhas eleitorais foram legais e referendadas pela Justiça Eleitoral.
“Causa-nos estranheza que uma instituição como a AMIG venha a dar conotação de irregularidade a uma ação estritamente legal. Dirigentes valeram-se desse mesmo instrumento e fazem parte hoje da diretoria da AMIG. Os municípios mineradores tiveram muitos de seus pleitos incluídos no relatório, como, por exemplo, o de dar anuência na licença ambiental”.
Diante das polêmicas, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) prevê o encerramento do grupo de trabalho neste ano e a retomada dos debates por meio de comissão especial em 2022, com representação regimental de todos os partidos, diferentemente do que ocorreu no GT.
“Devemos votar esse relatório e derrotá-lo. E aí, sim, vamos criar uma comissão especial, no ano que vem, para debater essa questão amplamente porque não houve consenso. O que não pode acontecer é que um relatório aprovado vire substitutivo ou projeto de lei que, de repente, ganhe regime de urgência (no Plenário) em um tema de impacto monumental”.
O que está em jogo?
O atual Código de Mineração está em vigor desde 1967. Nas duas versões de seu relatório, Greyce Elias procurou não tocar em temas muito polêmicos, como mineração em terras indígenas e alterações na CFEM, a contribuição financeira que funciona como royalties pela exploração de recursos minerais.
“Esse grupo tem o objetivo de atualizar a legislação mineral para se adequar às novas práticas realizadas pelo setor, trazendo mais segurança jurídica para os investidores e mais desenvolvimento para o setor, além de melhorar a sustentabilidade das ações minerais do país, beneficiando o empreendedor e a sociedade. A revisão do código que apresentamos aqui apenas pontuou os novos procedimentos para a obtenção do título minerário, com maior agilidade por parte do órgão, colocando prazos, definindo novos ritos por parte da ANM e aumentando a responsabilidade por parte do minerador”.
Em busca de consenso, a relatora disse ter incluído no texto a responsabilidade do minerador por eventuais impactos dos rejeitos e estéreis descartados e o fortalecimento do princípio do poluidor pagador, que estabelece que os custos decorrentes da reparação dos danos ambientais não evitados sejam suportados integralmente pelo condutor da atividade econômica. Também há previsão de “leilão social” exclusivo para permissões de lavra garimpeira (PLG) com foco nas pequenas cooperativas; previsão de indenização trabalhista entre as obrigações do titular de direito minerário extinto; e utilização de direitos minerários como garantia para a obtenção de crédito. Os ajustes, no entanto, não reduziram as críticas ao texto. O deputado Airton Faleiro (PT-PA) foi o primeiro a apresentar formalmente um voto em separado.
“Não há discordância de que temos que alterar o código, que tem muita coisa burocratizada e defasada. Temos divergência sobre o conteúdo do relatório da deputada Greyce. O nosso voto em separado faz uma análise crítica do relatório e indica proposições para a continuidade — ou por meio de uma comissão especial — de construção do projeto de lei”.
O deputado Joaquim Passinho (PSD-PA), sub-relator do GT lamenta que não se consiga um consenso em torno da matéria o que prejudicará os estados mineradores, prevê.
O grupo de trabalho da mineração foi criado em junho, realizou 17 audiências públicas e ouviu cerca de 70 especialistas e representantes das entidades envolvidas.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.