Preparadas para proteger a população, mulheres policiais também são vítimas de feminicídio no País. E como proceder em meio a essa situação? Esse foi um dos questionamentos levantados na roda de conversa que abriu nesta sexta-feira, 8, o II Encontro das Policiais Militares do Pará, que irá até este sábado, 9, em Belém. A abertura oficial do evento coube ao comandante geral da PM, coronel Dilson Jr., que destacou e elogiou o papel das mulheres para um auditório completamente lotado.
À frente da roda de conversa, a promotora de Justiça Leane Barros Fiúza de Melo; a advogada Luanna Tomaz, membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil/Seção Pará; e a delegada de Polícia Civil, Monike Brasil Silveira, que por duas horas explanaram sobre as causas e as características do feminicídio, o papel do estado e da sociedade no combate a esse tipo de violência, a legislação e o que deve e pode ser feito para diminuir ou pelo menos estancar os números cada vez mais crescentes de mulheres assassinadas simplesmente porque são mulheres.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Pará (Segup), em 2018 foram registrados 58 casos de feminicídio no estado contra 45 no ano anterior. Um crescimento de quase 20%. Houve ainda as tentativas de feminicídio, que saltaram de 16, no ano de 2017, para 63, em 2018, ano em que uma oficial da PM paraense foi vítima do crime.
“É preciso conversar sobre temas complexos como a violência doméstica, a violência sexual e o feminicídio, que é uma das formas mais graves dessa violência. Por isso, o tema principal do encontro é feminicídio, para alertar as mulheres que, antes de serem policiais militares, são mulheres e, portanto, estão sujeitas aos mesmos fenômenos sociais existentes na natureza e que envolvem outras mulheres”, disse a coronel PM Ivone Mendes, coordenadora do II Encontro.
Compreender bem o feminicídio, suas causas e consequências, é importante também para que as policiais sejam multiplicadoras, acrescentou Ivone Mendes. “Precisamos obter informações, esclarecer e tirar dúvidas sobre o feminicídio, para orientar e ajudar outras mulheres da sociedade paraense”.
Primeira Delegacia de Feminicídio
Ainda neste semestre, o Governo do Estado deverá inaugurar a primeira Delegacia de Feminicídio do Pará. Um passo importante, sem dúvida, mas ainda muito distante do que é preciso, de fato, para combater um crime que tem assustado e alertado as mulheres brasileiras. E por que o número vem crescendo? As mulheres estariam ameaçando os homens?
Luanna Tomaz enfatizou que não acredita em qualquer tipo de patologia masculina para justificar o feminicídio. “Há um universo de coisas que contribui para esse índice, como o crescimento do conservadorismo, que vê o feminismo como fosse algo oposto ao machismo”, avaliou a advogada, referindo-se ao equívoco existente não apenas entre homens, mas também entre mulheres, de que o feminismo é uma forma agressiva delas em quererem ser melhores do que eles, quando o feminismo é a luta por igualdade de gêneros.
E os homens que agridem parecem não aceitar a liberdade feminina. Luanna Tomaz observou que em mais de 80% dos casos as mulheres vítimas de feminicídio são assassinadas dentro da própria casa e de forma cruel. “São crimes de ódio, em que o homem quer acabar com a existência dela”, disse a advogada, acrescentando que geralmente o crime ocorre quando a mulher se separa do marido ou companheiro.
Discordância e consenso
Entre as três mulheres que puxaram a roda de conversa, a delegada Monike Silveira discordou sobre o aumento no número de casos de feminicídio. “Não vejo aumento disparado”, disse ela. Na plateia, a coronel PM Suzy concordou. “A violência não está crescendo a partir de agora. Sempre existiu”, arrematou.
Para ambas as policiais, apenas o feminicídio passou a ganhar maior visibilidade na mídia porque até 2015 esse tipo de crime era visto como passional. Foi preciso mudar o Código Penal, com a aprovação da Lei 13.104/15, que tipifica o feminicídio como homicídio qualificado e o inclui no rol dos crimes hediondos. Por outro lado, a promotora, a advogada e a delegada concordam num ponto: é preciso o governo brasileiro adotar políticas públicas de prevenção e enfrentamento a esse tipo de crime, com o envolvimento deles e delas. Para a promotora Leane Fiúza de Melo, o investimento deve começar na base, que é a educação, orientando desde cedo crianças e adolescentes a entender e a respeitar os gêneros.