Força-tarefa resgata 13 trabalhadores em situação análoga à escravidão em Itupiranga e Nova Ipixuna

Os trabalhadores foram resgatados durante operações realizadas de 12 a 22 deste mês, na região sudeste do Pará. Os flagrantes degradantes foram feitos em três propriedades rurais
Em Nova Ipixuna, foram regatados seis trabalhadores em uma fazenda de criação de gado e extração de argila

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Uma força-tarefa coordenada pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), integrado pelo Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá (MPT), Auditoria Fiscal do Trabalho, Defensoria Pública da União (DPU) e Polícia Federal (PF) flagrou e resgatou 13 trabalhadores que estavam vivendo em regime análogo ao de escravidão em três fazendas localizadas nos municípios de Nova Ipixuna e Itupiranga, no sudeste do Pará.

As operações foram realizadas de 12 a 22 deste mês, visando identificar e resgatar pessoas que poderiam estar trabalhando em condições análogas à escravidão, no sudeste do estado. Sete pessoas foram resgatadas em duas fazendas em Itupiranga e seis em uma fazenda de criação de gado e extração de argila em Nova Ipixuna.

Durante a fiscalização nas fazendas em Itupiranga, a equipe encontrou diversas irregularidades, as mais graves foram em relação às péssimas condições de trabalho e moradia. Em uma delas, cuja atividade era criação de gado leiteiro, dois trabalhadores dormiam no curral.

Em Itupiranga, foram resgatado sete trabalhadores em duas fazendas do mesmo proprietário

Segundo o MPT, o barracão, localizado a cerca de 100 metros da sede propriedade, possuía quatro cômodos nas laterais, com chão de terra batida e paredes de madeira e alvenaria: o primeiro abrigava os porcos; o segundo uma espécie de cozinha improvisada onde também dormia um trabalhador; ao lado um outro compartimento com uma rede para outro empregado; e, o último, era um galinheiro. Nos fundos dos compartimentos havia um chiqueiro e muito lixo.

Ainda segundo o MPT, os empregados eram obrigados a conviver com o forte odor de fezes dos bichos e sob altas temperaturas, já que a estrutura tinha teto baixo feito com telhas de fibrocimento e sem ventilação. Os trabalhadores passaram a dormir no local no início deste ano, e um deles, poucos meses depois, passou a apresentar problemas de pele na região do abdômen.

A segunda fazenda, do mesmo proprietário, localizada na zona rural do município, era voltada para a criação de gado de corte. Nela os fiscais encontraram mais cinco trabalhadores em situação degradante de trabalho e vida, sendo um encarregado e mais quatro que atuavam no roço de juquira, vegetação que nasce em áreas de pasto. No local, a equipe constatou as péssimas condições de higiene das estalagens. A primeira, na sede da propriedade, era de madeira, com chão de terra batida e frestas entre as tábuas, permitindo o ingresso de animais peçonhentos.

Os trabalhadores dormiam em redes adquiridas com seu próprio dinheiro e dividiam espaço com madeiras beneficiadas e materiais para aplicação de agrotóxicos. A água consumida era proveniente de um poço, sem garantia de potabilidade, e as necessidades fisiológicas eram feitas em um barraco improvisado com um buraco no chão.

A cozinha era aberta, com fogão a lenha e não havia local adequado para guardar os alimentos. Eles ficavam espalhados em uma mesa ou em caixotes de madeira.

Em um outro barraco, localizado na mata, próximo à frente de trabalho (área de roço), as condições também eram degradantes. A água utilizada para consumo e preparo das refeições vinha de uma cacimba, de coloração turva, sem nenhuma comprovação de potabilidade. Já a utilizada para banho, lavagem de roupa e louça, era de um córrego que passava por trás do alojamento.

Esse barraco, também de madeira e chão de terra batida, tinha telhas de fibrocimento e áreas externas cobertas com palha e lona, onde dormiam três dos cinco trabalhadores que estavam no local. Os alimentos ficavam guardados em sacos plásticos ou espalhados pelo local, sem qualquer higiene, e não havia recipiente para resfriamento.

Os trabalhadores tinham que “salgar” as carnes para poder conservá-las por mais tempo e ficavam expostas no ambiente sujeitas à contaminação. Não havia banheiro ou qualquer estrutura improvisada.  As necessidades fisiológicas eram feitas diretamente no mato.

Durante o deslocamento entre os barracos, ainda dentro da propriedade, os fiscais encontraram três dos trabalhadores na área fazendo o roço de juquira, prática utilizada para posterior queimada da floresta nativa. Também foi possível observar uma grande área já desmatada por esse método e outras ainda em processo de queima.

Entre as espécies de árvores, protegidas por lei, atingidas pelo fogo estava a castanheira. Também foram encontradas madeira serrada, uma motosserra e correntes para utilização no equipamento, caracterizando o crime ambiental. Em razão da submissão de trabalhadores a condições análogas à de escravo, bem como crime ambiental, o empregador foi conduzido à delegacia e preso em flagrante.

A equipe de fiscalização constatou que os trabalhadores resgatados não tinham Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) assinada ou qualquer outro benefício garantido. Entre eles estava um senhor de 56 anos, que já trabalhava na fazenda há 15 anos. Ele relatou que durante todo esse tempo nunca foi registrado ou teve qualquer tipo de direito previsto em lei, como férias ou 13º salário.

Ele já tinha trabalhado como matador de gado e nos últimos 10 anos atuou como vaqueiro, cuidando dos animais no pasto, fazendo a ordenha de vacas e distribuindo o leite que era vendido para comerciantes do município. O empregador também não fornecia Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para a realização das atividades laborais.

Os trabalhadores encontrados foram retirados imediatamente do local e encaminhados para residências de familiares no município e o que morava no Maranhão foi hospedado em hotel, em Marabá, até a regularização da situação trabalhista, sob responsabilidade financeira do empregador.

Após a constatação das violações, durante audiência, o empregador assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT e a DPU, comprometendo-se a regularizar a situação dos funcionários e a fornecer condições de trabalho e moradia dignas, de acordo com os preceitos legais. Na oportunidade, efetuou o pagamento integral de verbas rescisórias dos trabalhadores resgatados, bem como pagou indenização por dano moral individual para cada um deles.

O fazendeiro também se comprometeu a efetuar o pagamento dos danos morais coletivos. O montante será revertido para instituições sem fins lucrativos e projetos a serem indicados pelo MPT. Em caso de descumprimento, o empregador fica sujeito à cobrança de multas cujos valores são reversíveis ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Na fazenda em Nova Ipixuna, os fiscais encontraram o grupo vivendo em um alojamento improvisado no meio da mata, coberto com lona fixada em árvores e estacas de madeira, nas proximidades da frente de trabalho. O chão era de terra batida, com desníveis e buracos, sem proteção lateral, o que possibilitava o acesso de animais no local.

No espaço, não havia energia elétrica. Durante a noite, a única fonte de luz era uma lamparina improvisada. Eles dormiam em redes e guardavam seus pertences pessoais em mochilas e sacos pendurados nas estacas ou em um varal. O preparo da comida era feito em um fogareiro improvisado e os alimentos eram guardados em uma prateleira de madeira próxima ao teto ou simplesmente jogados no chão.

A água utilizada para consumo, banho e preparo dos alimentos vinha de um pequeno lago formado pela água da chuva, proveniente da extração de barro, que também era utilizado pelos bois no pasto. Após a constatação das violações, durante audiência e esclarecimentos acerca das consequências de eventual ajuizamento de Ação Civil Pública pelo MPT e DPU, a empregadora efetuou o pagamento integral das verbas rescisórias devidas aos empregados, assim como a indenização por dano moral individual, perante os integrantes do Grupo de Fiscalização Móvel.

Ele também assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) se comprometendo a fazer o pagamento de dano moral coletivo, valor que será revertido à instituições sem fins lucrativos sediadas no próprio município.

No caso do proprietário de Itupiranga, ele responderá pelos crimes de redução à condição análoga à de escravo (Art. 149 do Código Penal), além de responder pelo crime de Destruição de Floresta Nativa (Art. 50 da Lei de Crimes Ambientais – Lei n° 9.605/98) com agravante de ter sido cometido contra espécie rara da flora (castanheira) (Art. 53 da Lei 9.605/98).

Segundo a Polícia Federal, no decorrer das diligências constataram-se diversas irregularidades trabalhistas nas propriedades fiscalizadas, tais como condições degradantes oferecidas aos empregados, falta de armazenamento aceitável de comida, falta de água potável, não entrega de equipamentos de proteção individual (EPI) aos funcionários, entre outras. Além disso, em uma das propriedades, foram localizados três adolescentes, com idades entre 14 e 16 anos, desempenhando atividades vedadas pela legislação para essa faixa etária.

De acordo com a PF, o principal objetivo da ação policial foi assegurar o fornecimento de requisitos mínimos para que os funcionários realizem suas atividades de maneira digna, visto que o trabalho análogo à escravidão é um crime de elevado impacto negativo humano e social.

Tina DeBord- com informações da PF e MPT