Por Val-André Mutran – de Brasília
Nesta quarta-feira (8), em nova reunião em Brasília, o Fórum de Governadores entregou ao presidente Jair Bolsonaro e aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, uma carta com seis demandas que, segundo eles, promovem o desenvolvimento em todas as regiões brasileiras.
O encontro teve a participação de 25 governadores e vice-governadores e cerca de 20 líderes partidários ou de blocos do Congresso – Amazonas e Paraná não enviaram representantes. Os representantes reivindicam a adoção de um plano de equilíbrio fiscal dos estados e do Distrito Federal (Plano Mansueto); compensação por perdas resultantes da desoneração de exportações, previstas na Lei Kandir; e a reestruturação e permanência do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
A carta também pede a securitização dos créditos dos estados e do DF; a distribuição de cessão onerosa (do petróleo) e bônus de assinatura aos estados, Distrito Federal e municípios; além do apoio à aprovação da PEC 51/2019, que aumenta para 26% o repasse do que a União arrecada em renda e proventos (IR) e sobre produtos industrializados (IPI), ao Fundo de Participação dos Estados (FPE). Hoje o repasse é de 21,5%.
Líder do governo no Senado, o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) disse que a situação financeira da União, não só dos estados, “é crítica”. Ele contou que o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, pediu o prazo de uma semana para responder à cada demanda dos governadores.
“Dentro de uma semana o governo decidirá se encaminhará uma proposta específica sobre a cessão onerosa – já que o Tribunal de Contas da União decidiu que esse tema precisa de aval do Congresso – ou se deve aproveitar matérias que já estão tramitando sobre esse tema nas duas Casas,” esclareceu.
Bezerra frisou outros pontos da carta que dependem de atuação do Congresso, como a retomada da autorização para que os governos estaduais contraiam operações de crédito e a votação das propostas que alteram o FPE (PEC 51/2019) e o Fundeb (PEC 33/2019).
Ele previu que a PEC do Fundeb seja votada até o fim do ano, uma vez que a lei prevê a extinção do fundo em 2020. A proposta aumenta gradativamente a contrapartida da União ao fundo e o torna permanente.
O líder do governo também informou que o ministro da Economia, Paulo Guedes, deve finalizar o Plano Mansueto, um socorro aos estados para fortalecer o pacto federativo, até o final de maio.
Diálogo
Ao inaugurar o encontro com os governadores, o presidente Jair Bolsonaro disse que o governo está aberto ao diálogo. Segundo ele, as propostas são muitas e, se houver o acolhimento do Parlamento, elas poderão se transformar em realidade e minorar o sofrimento dos brasileiros.
“Temos problemas comuns, outros não. Temos que ceder num dado momento para ganharmos lá na frente. Se juntos dermos as mãos e focarmos realmente no que interessa para o nosso povo, podemos sair da situação que nos encontramos,” afirmou o presidente, antes de deixar a reunião rumo a um evento no Rio de Janeiro.
Presidente da Câmara, Rodrigo Maia também convocou a um grande acordo para reorganizar as contas públicas de todos os entes da Federação e evitar o colapso. Para ele, a reforma da Previdência por si só não será suficiente para sanar os problemas se os estados continuarem “sofrendo, sangrando e servindo mal à sociedade brasileira”.
Ao sair do encontro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, disse que ficou claro o desejo dos governadores em ajudar na Reforma da Previdência, mas fez uma ressalva: “Governadores, Câmara e Senado querem do governo federal a condição de terem, a partir do movimento de apoiamento à reforma, as condições da distribuição dos recursos arrecadados pela União, já que todos os estados estão dando sua parcela de contribuição”.
A ideia de vincular a pauta dos governadores à aprovação da Reforma da Previdência no Congresso dividiu os senadores presentes no encontro. Major Olímpio (PSL-SP) comentou que a aprovação deverá vir antes do cumprimento das demandas dos estados e do DF. Isso porque as dificuldades orçamentárias e a baixa capacidade de investimento precisariam ser superadas com a Reforma da Previdência, destravando a economia e abrindo um novo cenário orçamentário que atenderia aos estados e DF.
“A mãe de todas as medidas agora é a Reforma da Previdência,” resumiu.
Ele apontou que, de maneira paralela, uma das estratégias do governo para levar mais receita aos estados têm sido os decretos para desburocratizar e impulsionar a economia.
Críticas
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) disse que cabe ao Congresso resolver alguns dos pleitos dos governadores, e isso pode ser rápido. Ele criticou a tentativa de condicionar o cumprimento das demandas dos governadores à aprovação da Reforma da Previdência. Para ele, a manifestação do desejo pessoal do presidente não necessariamente se transforma num fato objetivo.
“A securitização das dívidas depende só do Congresso aprovar a lei que regulamenta esse assunto. A partilha dos recursos decorrente dos novos bônus de assinatura também passa pelo Congresso, inclusive a ideia de que os recursos sejam usados para reduzir o déficit da Previdência, liberando o fluxo de caixa dos estados”.
Por outro lado, Rogério foi cauteloso ao comentar a PEC 51/2019, que aumenta o repasse da União ao FPE e disse não acreditar que seja uma agenda fácil.
“A necessidade do país é maior do que a vontade do presidente e da agenda que ele definiu como a que vai salvar o país. Sabemos que o que vai salvar o país é o crescimento econômico e medidas de estímulo à economia, que nós não estamos vendo ainda, a não ser uma proposta de Reforma da Previdência”.
Governadores apresentam demandas
O Governador do Pará, Helder Barbalho, disse que foi apresentado um documento com demandas comuns dos estados; temas considerados estratégicos, importantes e estruturais. “Agora vamos aguardar que o Governo Federal possa se manifestar. Inclusive, registrando que essas pautas foram tratadas com a presidência do Congresso Nacional, para que todos possam trabalhar de maneira conjunta e debater com suas bancadas que representam os estados,” explicou.
Gladson Cameli, governador do Acre, disse que para melhorar o pacto federativo será preciso aprovar antes a Reforma da Previdência. “Não tem jeito; é uma condição. E vamos ser sinceros: quem vier com outro discurso é porque quer postergar a situação. Mas não dá para esperar mais,” avisou.
O governador afirmou que, em janeiro, o déficit previdenciário do Acre foi de R$ 40 milhões. Se não forem aprovadas as reformas, segundo ele, só será possível governar até o fim do mês de junho. A partir daí, será preciso decretar estado de calamidade financeira.
Carta
A carta dos governadores foi entregue ao presidente Bolsonaro pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha. Ele destacou que os governadores estão unidos em volta de uma proposta de reformas, apesar do grupo ser formado por “diversas representações partidárias e ideológicas”.
“Eu posso garantir que os 27 governadores estão ombreados com o presidente, com a Câmara e o Senado, na aprovação das propostas colocadas,” disse.
Ibaneis comentou que os estados têm interesses diferentes. Disse que houve um esforço para tirar pontos de divergência do debate e que o grupo manteve o foco na tentativa de reformas, como a da Previdência, mesmo com discordâncias sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e em questões ligadas à Educação.
O governador do DF, contudo, foi claro ao afirmar que, mesmo com as reformas em andamento no Congresso, os governadores não podem ficar à espera de liberações que dependem do Executivo.
“A grande maioria dos governadores estão com projetos paralisados dentro dos ministérios. Pedimos que os ministros recebam os governadores e deem encaminhamento aos pedidos, em sua grande maioria já com aprovação pela Caixa Econômica Federal. Muitos deles são projetos de infraestrutura que estão parados dentro dos ministérios,” explicou.
Novo pacto federativo
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (MDB-AP), explicou que “o encontro foi muito importante para pacificar e unir o Brasil em torno desta causa”.
“O presidente Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, estarem presentes nesse encontro com governadores é um gesto claro de apoiamento do governo central aos estados e da compreensão das dificuldades que eles estão vivendo. Lógico e evidente, o Presidente da República pediu para os governadores o apoiamento na votação da reforma da Previdência. Ele precisa para dar o start em todos os outros projetos e até mesmo no pleito dos governadores de ter uma arrecadação. Então, para equilibrar as contas, precisamos da reforma,” ressaltou.
Alcolumbre adiantou que vai propor para o Presidente da República que a reforma venha acompanhada de uma nova forma de distribuição dos recursos da União, um desejo dos governadores.
“A gente tem que confiar também que é possível fazer uma legislação que possa redistribuir a arrecadação do governo. Então o motivo desse encontro é apresentar para o presidente [Bolsonaro] o desejo e o anseio dos governadores em ajudar na reforma, mas os governadores, a Câmara e o Senado querem do governo federal a condição de terem, a partir do movimento de apoiamento, as condições da distribuição dos recursos arrecadados pela União, já que todos os estados estão dando sua parcela de contribuição”.
Pauta do encontro
Davi Alcolumbre informou que, além da Reforma da Previdência, estavam em discussão o novo pacto federativo, a redistribuição dos recursos da União, o Plano Mansueto (de equilíbrio financeiro dos estados), a cessão onerosa, a securitização e outras pautas importantes que estão sendo analisadas tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados.
Estes também são alguns dos pontos apresentados pelos governadores em uma carta de reivindicações entregue aos chefes dos Poderes Executivo e Legislativo no encontro.
“O ponto principal da nossa reunião é compreender qual será o papel que os governadores, as governadoras e o Parlamento brasileiro cumprirão nessa longa travessia de reconstruir a sociedade brasileira, reconstruindo a legislação e priorizando a redistribuição dos recursos para as cidades e estados no nosso país,” afirmou o presidente do Senado.
Impacto da Reforma da Previdência
Alcolumbre alertou sobre o risco de o país entrar em colapso se perder por completo a capacidade de investimento, o que, segundo ele, acontecerá sem a aprovação da reforma da Previdência.
“Se não tivermos capacidade de investimento, como fazer a redistribuição? Vamos redistribuir o quê, se o Estado tem R$ 50 bilhões hoje para investir? Se não tivermos [mais recursos disponíveis] daqui a quatro ou cinco anos, não teremos nada mais para investir, vamos entrar no colapso total”. O presidente do Senado afirmou que esse valor para investimentos é muito pequeno para um país do tamanho do Brasil.
“São 5.500 municípios, todos ávidos, querendo recursos para pavimentação, para construção de hospitais, de escolas. Hoje a despesa do Estado está praticamente consumindo todo o recurso que o Estado Brasileiro possa ter para investimento. Então, se a gente quer efetivamente redistribuir arrecadação, a gente primeiro precisa ter arrecadação, precisa ter caixa, equilibrar as contas. Por isso a importância da reforma, mas que ela esteja como foco principal de um processo de reequilíbrio das contas do Estado,” destacou.
Confira na íntegra a carta divulgada pelos governadores ao Executivo Federal e ao Congresso, com os seis principais pontos de reivindicação discutidos no encontro desta quarta-feira:
Carta do Fórum de Governadores aos chefes do Executivo e Legislativo
Os governadores dos estados e do Distrito Federal, considerando a necessidade de assegurar a estabilidade financeira dos entes federados, visando à promoção do desenvolvimento social em todas as regiões do Brasil, decidem:
* Reivindicar a implementação imediata pelo governo federal de um plano abrangente e sustentável que restabeleça o equilíbrio fiscal dos estados e do Distrito Federal, a exemplo do já aventado Plano Mansueto;
* Reiterar a importância fundamental de assegurar aos estados e ao Distrito Federal a devida compensação pelas perdas na arrecadação tributária decorrentes da desoneração de exportações, matéria regulamentada na “Lei Kandir”;
* Defender a manutenção do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb, permanente e dotado de status constitucional que atenda às reais necessidades da população brasileira no tocante à educação;
* Pleitear a regularização adequada da “securitização” de créditos dos estados e do Distrito Federal, visando ao fortalecimento das finanças desses entes federados;
* Requerer a garantia de repasses federais dos recursos provenientes de cessão onerosa/bônus de assinatura aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios;
* Apoiar o avanço urgente da Proposta de Emenda à Constituição nº 51/2019 que “altera o art. 159 da Constituição para aumentar para 26% a parcela do produto da arrecadação dos impostos sobre a renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados destinada ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal e dá outras providências.