Brasília – Nesta quarta-feira (26), longe dos flashes e dos holofotes — essenciais para alguns parlamentares que só assim conseguem cinco minutos de fama —, o chamado “G7” (7 senadores da oposição) e a minoria de 4 governistas, travarão uma “guerra” silenciosa na reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPI da Covid). Sem oitivas agendadas, ao final do dia, será definido se haverá, ou não, a convocação de governadores e prefeitos nos próximos capítulos dessa novela, que promete elevar a temperatura após o envio de “documento bomba”, da Controladoria-Geral da União (CGU), que constatou irregularidades com recursos federais para Covid em 21 estados.
O cenário não é bom para os gestores estaduais e municipais suspeitos. O caso mais escandaloso, resultou no impeachment do então governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC-RJ).
Os membros do “G7”, composto pelos senadores: Eduardo Braga (MDB-AM), Otto Alencar (PSD-BA), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Humberto Costa (PT-PE), Tasso Jereissati (PSDB-CE) e pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) e do presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM); estão combinados para rejeitar os requerimentos de convocação de governadores investigados por supostos desvios no esquema do “covidão da pandemia”, apresentados pelo senador governista Marcos Rogério (DEM-RO). Confira aqui todos os 142 requerimentos até agora protocolados na cpi.
“O “G7” vai se valer de sua maioria e definir quais requerimentos devem ser votados pelo colegiado nesta quarta”, adiantou Rogério.
Na quinta-feira (27), a CPI prossegue as oitivas e está convocado o presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas.
A cassação de Witzel
Até o momento, o único governador cassado foi o fluminense Wilson Witzel. Os fatos tiveram início quando o chefe do executivo fluminense decidiu mudar a gestão de sete hospitais de campanha previstos para serem instalados no Rio de Janeiro. Antes administrados pelo Instituto de Atenção Básica à Saúde (Iabas), as unidades passam a ser de responsabilidade da Secretaria de Saúde do estado.
O motivo da mudança — alegou o então governador — foi o não funcionamento dos hospitais. O Iabas recebeu mais de R$ 830 milhões para entregar as unidades até o fim de abril de 2020, mas só o hospital do estádio do Maracanã funcionou — mesmo assim, sem a capacidade máxima. Até hoje, as autoridades não sabem ao certo, onde o dinheiro federal para combate à covid-19 no estado do Rio de Janeiro foi parar.
Era apenas o “fio do novelo”, de um esquema criminoso liderado pelo próprio governador, com cumplicidade de sua esposa, que é advogada e mascarou contratos fraudulentos para esconder a roubalheira, desviando recursos federais específicos para o combate à pandemia.
Nos auge da investigações, a Polícia Federal descobriu que sob Witzel, houve superfaturamento até na compra de soro fisiológico para a rede hospitalar fluminense.
O “documento bomba” da CGU
A minoria do governo na CPI, composto pelos senadores: Ciro Nogueira (PP-PI), Eduardo Girão (PODEMOS-CE), Marcos Rogério (DEM-RO) e Jorginho Mello (PL-SC), tem na manga do paletó um “documento bomba” que pode mudar os termos do relatório que o relator Renan Calheiros vai apresentar ao final dos trabalhos do colegiado.
O documento encaminhado pela CGU à CPI revela que o órgão apontou prejuízo potencial ao erário de R$ 164 milhões em 53 operações entre março de 2020 e abril de 2021 envolvendo possíveis irregularidades na utilização de recursos para o combate ao novo coronavírus.
O levantamento considerou recursos públicos federais utilizados “por estados, Distrito Federal, municípios, órgãos públicos e entidades privadas sem fins lucrativos, relacionadas ao enfrentamento da pandemia da Covid-19, com foco em situações de fraude e corrupção”.
Foram identificados 14 tipos de irregularidades em 20 estados e no Distrito Federal. Confira a lista:
Acre
Amazonas
Amapá
Bahia
Ceará
Distrito Federal
Goiás
Maranhão
Minas Gerais
Mato Grosso do Sul
Pará
Paraíba
Pernambuco
Piauí
Rio de Janeiro
Rondônia
Roraima
Rio Grande do Sul
Sergipe
São Paulo
Tocantins
Veja a lista das irregularidades identificadas:
Irregularidades no processo de licitação;
Direcionamento da licitação;
Acerto prévio entre licitantes e/ou agentes públicos;
Vínculos entre entidades licitantes, privadas e/ou agentes públicos;
Dispensa/inexigibilidade irregular de licitações;
Crimes previstos nos artigos 89, 90, 91, 92, 93, 96 e 97 da Lei n° 8.666/93;
Sobrepreço e/ou superfaturamento na aquisição de bens e/ou prestação de serviços;
Utilização de empresa fantasma;
Utilização de pessoa interposta;
Irregularidades nos pagamentos contratuais;
Contratos em duplicidade, em desacordo com o edital e/ou com irregularidades nos aditivos/contratos;
Inexecução contratual e irregularidades na entrega dos bens/prestação de serviços;
Adulteração/falsificação documental;
Empresas sem capacidade técnica e/ou operacional.
De acordo com o documento, “os valores dos recursos envolvidos nas 53 operações alcançaram o montante de R$ 1,6 bilhão” e “o prejuízo efetivo (que de fato constou nas apurações) atingiu quase R$ 39,2 milhões e o prejuízo potencial é de R$ 124,8 milhões (que decorre dos desdobramentos que afetem outros contratos e o aprofundamento da investigação)”.
O documento conclui que “o prejuízo total estimado é da ordem de R$ 164 milhões”. Alguns processos já estão tramitando no Superior Tribunal de Justiça (STJ) devido a prerrogativa de foro a qual os governadores gozam, os processos correm em segredo de justiça.
Por meio de ações coordenadas com a Polícia Federal e o Ministério Público, já foram expedidos 778 mandados de busca e apreensão e 67 mandados de prisão temporária, sendo que 472 pessoas físicas e 291 jurídicas estão sob investigação, esclarece o documento da CGU.
As apurações continuam com o aprofundamento dos trabalhos e eventual apresentação de denúncia dos envolvidos ao Judiciário, a cargo da PF e do MPF no âmbito judicial, conclui o documento.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.