Os ministros da Agricultura, Carlos Fávaro, do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira e o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, vieram a público na tarde desta terça-feira (11), anunciar o cancelamento do leilão para compra de arroz importado, realizado na semana passada (6). Durante o anúncio, o ministro Carlos Fávaro, também anunciou que recebeu e aceitou o pedido de demissão do secretário de Política Agrícola, Neri Geller. Paralelamente, no Congresso Nacional, congressistas reune assinaturas para a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Leilão de Arroz.
Considerado um dos pivôs de indícios de corrupção no processo, o secretário Neri Geller vinha passando por um processo de desgaste após a divulgação de que um ex-assessor, Robson Luiz de Almeida França, sócio em duas empresas com seu filho, Marcelo Piccini Geller, havia intermediado quase metade da venda do arroz importado no leilão promovido pela Conab. A comissão poderia chegar a R$ 5 milhões.
Visivelmente constrangido, Fávaro explicou: ”Hoje pela manhã o secretário Neri Geller me comunicou, e ele fez uma ponderação [que] quando o filho dele estabeleceu a sociedade com essa corretora do Mato Grosso, ele não era secretário e, portanto, não tinha conflito”, afirmou o ministro.
“Essa empresa não está operando, não está participando do leilão, não fez nenhuma operação e isso é fato também. Nenhum fato que gere qualquer tipo de suspeita. Mas que de fato gerou um transtorno e por isso ele colocou hoje de manhã o cargo à disposição. Ele pediu demissão e eu aceitei”, completou.
Reportagem do site especializado The Agribiz mostrou que a Bolsa de Mercadorias de Mato Grosso (BMT) e a Foco Corretora de Grãos, que foram criadas no ano passado pelo ex-assessor do então deputado federal Neri Geller, Robson Luiz de Almeida França, intermediaram a venda de quase metade do arroz importado que foi vendido no leilão da Conab.
Durante o anúncio, as autoridades se limitaram a dizer que as quatro empresas vencedoras do certame não comprovaram capacidade técnica e para evitar possíveis irregularidades, um novo leilão será anunciado, ainda sem data definida ou se haverá mudanças nas regras.
“Vamos revisitar os mecanismos estabelecidos para esses leilões, com apoio da Controladoria-Geral da União e da Advocacia-Geral da União. Pretendemos fazer novo leilão, quem sabe em outros modelos, para que a gente possa ter as garantias de que vamos contratar as empresas que tenham capacidade técnica e financeira. […] Não tem como a gente depositar esse dinheiro público sem ter a garantia de que esses contratos serão honrados”, disse Edegar Pretto, da Conab.
O anúncio do cancelamento do leilão foi decidido logo depois de uma reunião pela manhã, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O encontro não estava previsto na agenda do chefe do Executivo. De acordo com Teixeira, Lula concordou com o cancelamento do leilão. O presidente vinha cobrando uma solução sobre a questão, e fontes falaram reservadamente que Lula ficou furioso quando soube dos problemas envolvendo o certame.
O plano do governo federal era de se adiantar para fazer frente à queda da produção no Rio Grande do Sul, que no final do mês de maio, já havia colhido 70% da safra do cereal deste ano. Maior produtor nacional, em 29 de maio o estado foi atingido por uma catástrofe climática sem precedentes que arruinou lavouras, silos de armazenagem, destruindo também, grande parte de estradas vicinais, rodovias estaduais e federais, da malha rodoviária do estado, ameaçando o escoamento da safra, justificativas plenamente convincentes para a importação do cereal, um dos principais produtos da cesta-básica dos brasileiros.
Antes mesmo do leilão ser realizado, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) ingressou no dia 3 de junho, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), no Supremo Tribunal Federal (STF), cujo objetivo primordial era o de suspender o primeiro leilão público da Conab, marcado para o dia 6 de junho. Na ação, a CNA pediu explicações ao governo sobre a medida.
Desde o anúncio do plano do governo de realizar o leilão, a medida foi alvo de críticas dos produtores gaúchos, que alegaram que conseguiriam entregar o produto das safras e que a importação afetaria a produção nacional.
As quatro empresas que venceram o leilão de arroz do governo federal ainda não se pronunciaram. A maior compradora é dona de uma lojinha de queijos no Centro Comercial de Macapá (Amapá) que tem como atividade principal a venda de leite e laticínios.
Outra é de um empresário de Brasília que disse à Justiça ter pago propina para conseguir um contrato com a Secretaria de Transportes do Distrito Federal (DF). No total, o governo comprou 263,3 mil toneladas de arroz importado, por R$ 1,3 bilhão.
Por Val-André Mutran – de Brasília