Governo consegue adiar projeto de anistia a presos no 8 de janeiro

Ficou de fora da Ordem do Dia o PL da Desoneração da Folha de Pagamentos, cujo prazo encerra nesta quarta-feira (11)
Plenário da Câmara dos Deputados, terça-feira (10)

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Com o início da sessão deliberativa do Plenário iniciada às 17h28 de terça-feira (10), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, foi forçada a suspender a sessão de votação da matéria mais polêmica do ano: o projeto que anistia os presos que participaram das invasões às sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.

A sessão abriu com cinco matérias na Mesa, quatro foram aprovadas e uma não foi analisada. Contudo, a pauta analisada continha apenas matérias secundárias, adiando para a sessão desta quarta-feira (11) os temas principais, como exemplo, o Projeto de Lei da Desoneração da Folha de Pagamentos, cujo prazo se encerra hoje.

Mais cedo, na CCJ — principal colegiado da Casa —, os membros aprovaram o substitutivo proposto pelo deputado Rodrigo Valadares (União-SE) ao Projeto de Lei (PL nº 2.858/2022), do ex-deputado Major Victor Hugo (PL-GO), e outros seis apensados, que prevê que serão anistiados todos aqueles que participaram de atos com motivação política ou eleitoral, ou que os apoiaram com doações, apoio logístico, prestação de serviços ou publicações em mídias sociais entre 8 de janeiro de 2023 e a data de vigência da futura lei.

A medida beneficia, por exemplo, o ex-presidente, Jair Bolsonaro (PL), que é investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por incitar os atos em vídeo publicado nas redes sociais. Mas não o anistia pela reunião realizada com embaixadores, no Palácio da Alvorada, para atacar o sistema eletrônico de votação.

O texto também perdoa os crimes praticados pelos extremistas inconformados com o resultado das eleições de 2022 que depredaram os palácios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal e do Planalto: abolição violenta do Estado Democrático de Direto, tentativa de golpe de Estado e danos ao patrimônio público da União.

Princípios jurídicos

“A depredação de patrimônios públicos, além da destruição de diversos patrimônios históricos e culturais como obras de arte, estátuas e monumentos entristecem a todos nós”, afirma Valadares no parecer.“No entanto, as prisões desrespeitaram princípios jurídicos basilares como a presunção de inocência, a individualização das condutas e o direito ao contraditório”, acrescenta o relator.

O que se quer anistiar?

A anistia garante aos envolvidos:• perdão por crimes previstos no Código Penal relacionados às manifestações;• o cancelamento de multas aplicadas pela Justiça;• a manutenção dos direitos políticos;• a revogação de medidas, transitadas em julgado ou não, que limitem a liberdade de expressão dos envolvidos em meios de comunicação social e em redes sociais.As medidas se aplicam a todos que participaram de eventos antes ou depois do 8 de janeiro, desde que mantenham correlação com os fatos.Por fim, o substitutivo define como abuso de autoridade a instauração de procedimento investigatório relacionado aos atos amparados pela anistia.

Adiamento

O adiamento da votação do PL nº 2.858/2022 se deu por falta de tempo. A presidente da CCJ, deputada Carol de Toni (PL-SC), reservou a reunião para analisar unicamente a proposta. Com a sala lotada, a sessão foi marcada por bate-boca entre governistas e integrantes da oposição até que teve de ser encerrada — pois a ordem do dia no plenário da Câmara foi aberta. Quando a sessão em plenário começa a funcionar, não pode haver sessões simultâneas nas comissões.

Durante a reunião, a base governista usou manobras para atrasar a votação, o que acabou dando certo. Deputados governistas apresentaram primeiramente três requerimentos para a análise extraordinária de propostas, ou seja, de última hora. Por não estarem incluídas na pauta antecipadamente, esses dispositivos precisaram ser votados individualmente, o que demandou mais tempo. Também recorreram a um pedido de retirada de pauta e anunciaram obstrução em diversas ocasiões, durante a discussão da matéria.

Na retomada da análise da matéria nesta quarta, os governistas devem pedir vistas em relação à votação da proposta. O pedido é feito quando os deputados querem mais tempo para analisar um texto, mas é sobretudo uma tática para adiar votações, como neste caso. Caso a estratégia seja utilizada, a apreciação do projeto deve ficar só para depois do 1º turno das eleições municipais, em meados de outubro.

O PL da anistia é uma das prioridades da oposição ao governo, que busca se desfazer da imagem de tentativa de golpe no 8 de Janeiro atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro, cujos direitos políticos já foram cassados em julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por abuso de poder político e econômico em razão de uma reunião convocada pelo então presidente Bolsonaro, com diplomatas de países estrangeiros, ocasião em que colocou em dúvida todo o sistema eleitoral do país.

Fim do prazo

Esta semana é a última de esforço concentrado antes das eleições municipais de outubro. Por conta disso, a presidente da CCJ, Caroline de Toni, desengavetou diversos projetos pleiteados pela oposição, como a PEC das decisões monocráticas de ministros do Supremo.

O período para a apreciação dos temas é vantajoso para o PL, que tem a maior bancada da Câmara e ainda não decidiu quem apoiar para a presidência da Câmara em 2025. Com o imbróglio sobre o sucessor de Arthur Lira (PP-AL), a sigla do ex-presidente Bolsonaro utiliza as propostas como condições para decidir o candidato que apoiará.

Antes da sessão de terça-feira (10), os deputados do PP e do PL fizeram uma troca de cadeiras nas vagas de titular e suplente para garantir o quórum e os votos necessários para a aprovação da proposta.

• Pedro Lupion (PP-PR), líder da bancada ruralista e oposição ao governo, passou de suplente a titular;
• Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), líder da Maioria no Congresso e próximo ao governo, passou de titular a suplente;
• Evair de Melo (PP-ES), aliado próximo de Jair Bolsonaro, tornou-se suplente.
• Delegado Fabio Costa (PP-AL) foi indicado como titular;
• Fausto Pinato (PP-SP) deixou a comissão, onde era titular;
• Dr. Remy Soares (PP-MA) saiu da comissão, onde era suplente;
• Allan Garcês (PP-MA) foi indicado como titular;
• Átila Lira (PP-PI) saiu da comissão, onde era suplente;
• Missionária Michele Collins (PP-PE) foi indicada como suplente;
• Neto Carletto (PP-BA) saiu da comissão, onde era titular.

Inicialmente, o texto do PL nº 2.858/2022 não concedia anistia só aos presos de 8 de janeiro, mas a “todos que tenham participado de manifestações em rodovias, frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional” a partir de 30 de outubro de 2022, data em que Lula (PT) venceu o 2º turno das eleições presidenciais contra Jair Bolsonaro (PL).

Entretanto, o relator, Rodrigo Valadares (União-SE), retirou o trecho do projeto. O perdão só valerá agora de 8 de janeiro de 2023 até a data em que a lei entrar em vigor.

Valadares, porém, adicionou uma ressalva para dar o benefício “a todos que participaram de eventos subsequentes ou anteriores” ao dia dos atos extremistas. Logo, o texto não especifica um intervalo de tempo.

Liderados por Bolsonaro e pelo pastor Silas Malafaia, a anistia aos presos nas invasões aos Três Poderes foi uma das principais bandeiras defendidas pela oposição em um ato na Avenida Paulista, em São Paulo, no 7 de Setembro.

Tramitação do PL da anistia

Em 2023, com a presidência da CCJ a cargo do deputado Rui Falcão (PT-SP), a relatoria da proposta ficou sob responsabilidade da deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP).

Na ocasião, a deputada do Psol apresentou um relatório contrário à constitucionalidade do projeto. “Assim, a concessão de anistia nos termos pretendidos pelas proposições sob exame ofende claramente o art. 1º da Constituição, pois certamente não interessa à população a impunidade de criminosos que cometeram todo tipo de atrocidades a pretexto de estarem exercendo o direito à livre manifestação do pensamento, comprometendo a segurança, a locomoção, o trabalho e a integridade física e psicológica dos demais cidadãos brasileiros”, declarou a então relatora.

Em março de 2024, a psolista deixou a CCJ e perdeu a relatoria do texto.

Negociação

Durante a manifestação em São Paulo, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmou que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), só terá o apoio da direita ao seu candidato à sucessão se pautar a proposta no plenário ainda este ano.

Os deputados da oposição anunciaram que vão obstruir as votações na Câmara para pressionar Lira a pautar o projeto da anistia.

O PL, com 92 deputados, é decisivo na escolha do próximo presidente da Casa.

Bolsonaro, que exerce muita influência no partido, ainda não anunciou o nome que apoiará. A tendência do partido era apoiar Elmar Nascimento (União-BA), enquanto este ainda era o favorito de Lira.  Agora, a sigla pende para a construção da candidatura de Hugo Motta (Republicanos-PB).

Entretanto, o líder do PL na Câmara, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), sinalizou que o partido aguardará Lira bater o martelo para definir candidato à Câmara.

“A gente primeiro vai aguardar a palavra final do presidente [da Câmara] Arthur Lira e ouvir o [ex-] presidente Bolsonaro e o presidente [do PL] Valdemar. Acho que esse é o norte”, declarou Altineu.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.