Brasília – Decisão estabelecida em liminar deferida pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), durante sessão administrativa da Corte na terça-feira, 14 de dezembro do ano passado, em que atuou como relator, segundo especialistas consultados pela reportagem do Blog do Zé Dudu, pode gerar um efeito oposto e comprometer a viabilidade da formação de federações partidárias. Outras questões envolvendo os partidos também são objeto de discussão e que podem sepultar o instituto, que será aplicado pelo primeira vez no país nessas eleições.
O instituto das federações partidárias foi regulamentado pelo TSE para aplicação nas Eleições Gerais de 2022, uma vez que a união de partidos em federações foi instituída pelo Congresso Nacional na reforma eleitoral de 2021 com o objetivo de permitir às legendas atuarem de forma unificada em todo o país, como um teste para eventual fusão ou incorporação.
Segundo advogados especializados em legislação eleitoral, a avaliação de que o encurtamento do prazo determinado pelo ministro Barroso, sem contar a existência de outros impasses judiciais envolvendo as federações têm que ser resolvido pelo plenário da corte o quanto antes.
O próprio STF deve julgar na semana que vem uma ação que questiona a constitucionalidade das federações partidárias — a tendência é que, nesse mesmo julgamento, também fixe em definitivo o prazo para formalizar essa união temporária de partidos, caso a tese da constitucionalidade das federações seja aprovada.
Efeito contrário e insegurança jurídica
Ocorre que para as Eleições Gerais de 2022, foi estabelecida uma regra transitória, aplicável aos pedidos de formação de federação apresentados até 1º de março desse ano. Conforme essa regra, o relator poderá antecipar o registro da federação logo após o fim do prazo para impugnações, caso verifique o atendimento aos requisitos para deferimento do registro. Essa decisão individual do relator que também é o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, foi referendada pelo Plenário do TSE, assim que foi submetida ao voto dos demais ministros, de modo que a Instrução foi aprovada por unanimidade.
A discussão de uma federação partidária ganhou mais evidência principalmente por causa de uma negociação que está sendo feita no campo da esquerda, entre PT e PSB. Recentemente, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o presidente do PSB, Carlos Siqueira, foram a público anunciar o encaminhamento de um pedido ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de ampliação de prazo para a solicitar a formação da federação. Hoje, o prazo limite para partidos registrarem na Justiça Eleitoral uma federação é 1.º de março. Isso é considerado pouco tempo para que as siglas resolvam impasses regionais entre os partidos no lançamento de candidaturas.
Na prática, a ideia das cúpulas de PT e PSB é ter mais tempo para resolver a disputa em cinco estados entre as legendas. Contudo, dentro desses mesmos partidos e segundo especialistas, existe a avaliação de que o encurtamento do prazo, estabelecido na liminar de Barroso, poderia gerar um efeito oposto e comprometer a federação partidária criando insegurança jurídica no processo.
Personalidade jurídica
Segundo a resolução aprovada em dezembro, dois ou mais partidos com registro no TSE poderão reunir-se em federação, com abrangência nacional, sendo registrados conjuntamente pela Justiça Eleitoral. Para isso, as legendas deverão antes constituir uma associação registrada em cartório de registro civil de pessoas jurídicas, com personalidade jurídica distinta das legendas que a constituem. Nesse registro, as agremiações federadas deverão apresentar, entre outros documentos, a resolução tomada pela maioria absoluta dos votos dos seus órgãos de deliberação para formar uma federação.Está prevista uma fase de impugnação ao registro e, também, a manifestação do Ministério Público Eleitoral (MPE). O pedido será apreciado pelo Plenário do TSE. A participação da federação nas eleições somente é possível se seu registro for deferido até seis meses antes das eleições.
Impasses entre os partidos
A formação das federações é considerado hoje o fato mais relevante nesse início da corrida eleitoral, e que pode dar uma grande vantagem aos partidos que dela fizerem parte.
Os presidentes do PT, PSB, PC do B e PV se encontraram na segunda-feira (31) para mais uma rodada de negociações e continuar as discussões sobre a união das siglas em uma possível federação partidária. Em nota conjunta publicada após a reunião, os dirigentes das legendas afirmaram que seguem trabalhando para construir unidade política em torno de uma Federação de Partidos.
No encontro de segunda, dirigentes e assessores jurídicos dos quatro partidos debateram os aspectos jurídicos e estatutários do projeto, que havia sido iniciado na última quarta-feira (26/01). Segundo as legendas, uma nova reunião será realizada no próximo dia 9, em Brasília, após a realização de consultas e debates internos em cada um dos partidos.
Entretanto, a federação partidária pode ser um instrumento eleitoral fadado ao fracasso em razão do atual clima de insegurança jurídica e política do processo.
Da esquerda à direita, os principais partidos brasileiros conversam sobre a possibilidade de se federalizarem — ou seja, de formarem uma espécie de união de partidos temporária que vai valer não apenas para as eleições, mas para os quatro anos seguintes. Mas o cenário de incertezas ameaça a criação das federações partidárias.
A argumentação da ação que o STF vai julgar sobre a constitucionalidade da formação de federações partidárias, questiona se o instituto seria uma forma de burlar a emenda constitucional de 2017 que proibiu os partidos de se coligarem nas eleições para deputado e vereador. A diferença é que as coligações valiam apenas para as eleições; e a federação vale para quatro anos.
Paralelamente à insegurança jurídica, há a insegurança política em discutir a composição de uma federação partidária. Partidos de esquerda, como PSB e PC do B, temem ser subjugados pelas decisões do PT em caso de adesão ao bloco petista pelos próximos quatro anos. Na direita, apesar de conversas entre PL, Republicanos, Pros e PTB para formar uma federação, algumas lideranças estão mais convencidas de que essa união traria mais ônus do que bônus. “A desconfiança mútua é a tônica”, falou à reportagem uma fonte que prefere o anonimato.
Podemos e Cidadania avançam nas conversas
Enquanto mais incertezas e desconfianças são obstáculos a serem contornados por muitas legendas, a Executiva Nacional do Podemos autorizou a negociação para formar uma federação partidária com o Cidadania — antigo PPS. A decisão foi anunciada na segunda-feira (31) por meio de nota. Segundo o Podemos, o objetivo é “unir a terceira via e fortalecer a construção de um projeto sólido e plural de Brasil” nas eleições de 2022.
“Entendendo a importância da somatória de forças que representem uma alternativa equilibrada ao País, hoje representada no Cidadania pela pré-candidatura do senador Alessandro Vieira, o Podemos entende haver sinergia do projeto liderado por Sergio Moro com este relevante partido e com outras agremiações do centro democrático”, diz a nota.O Cidadania é disputado também pelo PSDB, do governador e pré-candidato à Presidência, João Doria (SP). Na última quinta-feira (27), a Executiva Nacional do PSDB aprovou, por unanimidade, o avanço nas negociações com o partido para a formação de federação partidária. Em nota, os tucanos afirmaram que as aproximações entre os partidos foram “adiantadas pelas lideranças nos estados”. Na federação só é possível um candidato à Presidência. Para o Podemos, a federação com o Cidadania “poderá congregar uma única e forte candidatura à presidência”, e pelo visto, o senador Alessandro Vieira desistiu de sua candidatura em favor de Sergio Moro que está em 3º lugar nas pesquisas, mas ainda muito distante do 2º colocado, o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.