Previdência Social inclui agressões domésticas nas ações regressivas, em que o instituto pede ressarcimento de valores gastos com benefícios previdenciários. Intenção é fazer com que agressores sintam o crime no bolso
Agora, além de irem parar na cadeia por violência doméstica, os homens que agredirem mulheres poderão ser mais uma vez levados à Justiça e, se condenados, obrigados a devolver à Previdência Social os gastos com auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte. A previdência estendeu para o âmbito doméstico as ações regressivas, nas quais o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) busca o ressarcimento de valores pagos em benefícios previdenciários resultantes de ações de terceiros.
Para marcar o ingresso da Previdência Social na luta contra a violência doméstica foi assinado, ontem, um convênio com a Secretaria de Políticas para as Mulheres e o Instituto Maria da Penha. A parceria visa o desenvolvimento de ações e políticas de proteção à mulher por meio de medidas preventivas e repressivas. “Nós estamos nos redimindo um pouco e tentando resgatar o erro maior, que é a violência praticada contra as mulheres”, disse o ministro Garibaldi Alves.
O procurador-chefe do INSS, Alessandro Stefanutto, defendeu a eficácia das ações regressivas como pedagógicas. O que o INSS espera é que, com mais essa penalidade, os homens agressores pensem 10 vezes antes de bater em uma mulher porque vão passar a sentir o crime também no bolso. Para o presidente do INSS, Mauro Hauschild, não é justo que todos os trabalhadores brasileiros, que contribuem mensalmente para a Previdência Social, arquem também com benefícios que não seriam concedidos se não fossem provocados pelas agressões domésticas.
Em celebração à participação da Previdência Social na luta, o INSS agendou para 7 de agosto — data do aniversário da Lei Maria da Penha — o ajuizamento de três ações regressivas decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher. Duas delas serão propostas na Justiça Federal em Brasília. O INSS tentará condenar o marido de uma segurada que, devido a constantes maus-tratos, está recebendo auxílio-doença. O companheiro tentou matá-la com socos, pontapés, água quente e objetos pontiagudos. A mulher escapou praticamente inválida. A previdência já pagou neste caso, de auxílio-doença, cerca de R$ 41 mil.
Nas outras duas ações, o INSS tentará receber dos agressores pensões por morte. Em uma delas, o agressor, por ciúmes, enforcou a mulher. A pensão é de direito do filho, um bebê de um ano à época do crime. A outra de ressarcimento será movida no Rio Grande do Sul, onde um marido matou a esposa a facadas. Ela era segurada da Previdência Social e deixou o benefício para os dois filhos.
O procurador-chefe do INSS explicou que a autarquia não vai esperar a condenação do réu para entrar com o processo. “Se o réu já foi condenado é mais simples. Mas, para o ajuizamento da ação, já nos servirá de base a denúncia do promotor ou o próprio inquérito aberto pela polícia”, afirmou. De acordo com Alessandro Stefanutto encontra-se em fase de análise cerca de oito mil processos recebidos da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher no Distrito Federal.
Maria da Penha
O INSS está vendo a possibilidade de entrar com uma ação contra o ex-marido da própria Maria da Penha, que dá nome à lei. Ele hoje preside o instituto com seu nome e estava bastante emocionada durante a cerimônia. “Estamos analisando por causa da possibilidade do crime já estar prescrito. Aconteceu há muito tempo”, disse o procurador. O marido de Maria da Penha tentou matá-la duas vezes em 1983. Da primeira vez por arma de fogo e na segunda por eletrocussão e afogamento. As tentativas de homicídio resultaram em lesões irreversíveis à sua saúde. Ela ficou paraplégica e com outras sequelas. Por isso recebe aposentadoria por invalidez do INSS.
As ações regressivas começaram a ser adotadas pelo INSS em 1991. Primeiro o instituto buscou as empresas que descumpriam normas de saúde e segurança no trabalho. No ano passado, o INSS deu início as ações regressivas em casos de acidentes de trânsito provocados por terceiros, considerados graves ou gravíssimos. Agora é a vez da violência doméstica. “Bater em mulher é inadmissível, é crime. Quem insiste nessa conduta tem que ser penalizado e responsabilizado”, declarou a ministra da Secretaria de Políticas par as Mulheres, Eleonora Menicucci.
Mais rigor
A Lei Maria da Penha completa seis anos no dia 7. Sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a legislação homenageia Maria da Penha Maia Fernandes, agredida fisicamente e psicologicamente pelo marido durante seis anos de casamento. O texto aumentou o rigor da punição da pessoa que cometer crimes contra o companheiro, independentemente do sexo, mas o objetivo principal é proteger os direitos da mulher. Em fevereiro deste ano, o Supremo Tribunal Federal reforçou o rigor da lei, entendendo que a abertura da ação criminal não está condicionada a decisão da vítima — o que permite que a queixa possa ser prestada por qualquer pessoa e não seja retirada.
Decisão já vale para o trânsito
O Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) já cobra do motorista infrator os custos que são gastos com pagamento de benefício previdenciário. A instituição pede o ressarcimento por aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente para as vítimas e, em caso de morte, pensão para familiares. Anualmente, os acidentes de trânsito geram uma despesa de R$ 8 bilhões aos cofres do INSS. Os principais alvos dessas ações são motoristas que tenham causado acidentes graves enquanto dirigiam embriagados, em alta velocidade ou em participação em racha. Em setembro do ano passado, quando a medida foi anunciada, o presidente do órgão, Mauro Luciano Hauschild, disse que essa transferência de responsabilização era uma tendência. Segundo ele, empresas que, por inobservância da lei, expõem empregados a riscos, acarretando mortes e lesões também estão sendo cobradas.
Fonte: Correio Braziliense