Por Eleuterio Gomes – de Marabá
Em audiência que durou mais de duas horas, na manhã desta quarta-feira (19), na 2ª Vara Federal de Marabá, o juiz Heitor Moura Gomes, tentou conciliar os interesses da mineradora Vale e dos indígenas da etnia Xikrin, mas não teve sucesso. Em uma ação, eles solicitam a paralisação das atividades da Mina do Salobo e indenização financeira por parte da Vale. Na outra, reivindicam a paralisação do Projeto S11D. Pouco antes da audiência, o juiz, abordado por repórteres, disse que tentaria conciliar a situação, de modo que os indígenas não ficassem prejudicados nem os empreendimentos sofressem prejuízo.
Ao final da reunião, Heitor Moura Gomes se comprometeu em proferir decisão em relação ao Salobo e também a resolver a questão do Projeto S11D. Segundo o advogado dos Xikrin, José Diogo de Oliveira Lima, há um ano o juiz havia determinado que a Vale efetuasse um estudo de componente indígena, mas a mineradora nunca mandou realizar tal estudo.
José Diogo afirma que o juiz, num primeiro momento, preferiu não analisar os pedidos de liminares e, em vez disso, reuniu todas as partes, para ouvir o que cada uma tinha a declarar, “depois de todas as partes já terem se manifestado”.
“Inclusive, a Procuradoria Federal de Brasília se mostrou favorável ao deferimento das liminares, mas ele [juiz Heitor Moura Gomes] marcou essa audiência, que ficou um pouco sem nexo e que não resultou em nada. Só em mais conflitos com desgaste entre as comunidades e a mineradora,” disse o advogado.
Em relação ao S11D, José Diogo afirma que um relatório da Universidade Federal do Pará (UFPA) comprova que o Rio Itacaiúnas está poluído. “Inclusive, há uma recomendação médica – recomendação da equipe técnica de que os indígenas da Aldeia O-Odjã se mudem para outro lugar da terra indígena, porque ali está inabitável, impossível de viver em razão da contaminação da água por metais pesados,” informa o advogado.
Ele afirma que o plano de trabalho que a Vale apresentou está muito aquém do termo de referência. “A equipe técnica é parcial, voltada aos interesses da mineradora, o que atrapalha qualquer tipo de diálogo entre as comunidades e a própria mineradora,” avalia.
Nas duas ações, os Xikrin reivindicam a paralisação dos dois projetos e indenização, pelos seguintes motivos:
- Ausência de estudos de componente indígena;
- Ausência de consulta prévia, livre e informada;
- Descumprimento de condicionantes ambientais, desde a licença provisória à licença de operação;
- Danos etnoambientais, tais como: poluição dos recursos hídricos – Rio Itacaiúnas, Igarapé Salobo, Igarapé Mirim e Rio Cinzento –, com metais pesados e sedimentos finos; e existência de drenagens clandestinas, principalmente no empreendimento S11D, aferidos por monitoramento realizado na Terra Indígena;
- Empreendimento Salobo instalado sobre antigas aldeias e cemitérios Xikrin, além de impedir a conexão cultural com outra terra indígena Xikrin (Trincheira Bacajá); e
- Corte de milhares de Castanheiras, utilizadas pelos indígenas à subsistência física e cultural.
Apesar de ter sido requisitada a presença da Polícia Federal para tentar deter qualquer tentativa de tumulto, o comportamento dos indígenas foi pacífico.
Vale se manifesta em nota
Sobre a audiência desta quarta-feira, no final da tarde a mineradora Vale emitiu nota, na qual afirma que “os empreendimentos S11D e Salobo estão regularmente licenciados pelo órgão competente, cumprindo rigorosamente o que determina a legislação ambiental e as condicionantes estabelecidas”. Leia, a seguir, o comunicado na íntegra.
“Foi realizada hoje (18/06), em Marabá, audiência das Ações Civis Públicas propostas pelas Associações Indígenas Xikrin contra a Vale. Ao final, o pedido de paralisação do Salobo foi negado pelo Juiz Federal de Marabá, assim como ocorrido com o S11D. Foi determinada a realização de Estudo do Componente Indígena.
Os empreendimentos S11D e Salobo estão regularmente licenciados pelo órgão competente, cumprindo rigorosamente o que determina a legislação ambiental e as condicionantes estabelecidas no processo de licenciamento, além de estarem distantes, respectivamente, mais de 12 km e 22 km da Terra Indígena Xikrin. Por meio dos empreendimentos, é assegurado ainda o apoio à conservação de mais de 1,2 milhão de hectares de Floresta Amazônica nativa no entorno das operações e da Terra Indígena.
A Vale, desde 2006, faz repasse de valores a comunidade indígena Xikrin, que totalizam, até março de 2019, aproximadamente R$ 150 milhões. Também fornece assistência à saúde aos indígenas.”